Soberba política no comércio exterior
Até onde o exagero ideológico compromete a economia?
Na essência da obra "O Mito de Sísifo", a realidade do absurdo está bem presente. Por essa pegada, nada mais precisa que a filosofia do instigante Albert Camus, autor dessa obra tão apropriada. Nela, enxerga-se o conflito da intenção humana por melhores significados, diante da inércia de um mundo indiferente. Tal como a referência da simbologia condenatória, na qual Sísifo "empurrou a pedra morro acima", o que se extrai daí é uma consciência de afirmação da vida diante do absurdo. Mesmo que pela grandeza de uma realidade capaz de causar estranhezas.
Apego-me a isso para buscar uma lógica de coerência, justo onde os sinais contrários - do ser e agir de modo incoerente - prevaleçam. O fato está no que se aprende com teorias e práticas de comércio exterior, longe de medidas políticas fora do foco econômico. Enfim, meu propósito é mostrar a incoerência das intervenções políticas, no contexto da soberania e da independência de poderes. Tudo isso quando se usa um instrumento econômico, que pode provocar danos à dinâmica das relações comerciais entre parceiros.
Não preciso ir longe. O objeto de análise representa outra "trumpetada". Agora, traduzida pela aplicação de uma tarifa inusitada de 50%, que o governo daquele "outsider" alucinado impôs sobre os importados do Brasil. Claro que a política tarifária, com critérios técnicos e alvos que envolvam um sentido lógico de protecionismo, representa uma escolha e faz parte do jogo comercial praticado pelos países. Nesse sentido, os eventuais exageros podem - e devem - ser mediados por instituição competente (a OMC), requisitada quando prováveis abusos são postos nas negociações.
Não me parece que seja o caso, por mais que se venha, depois dessa clara intenção política, algum aditivo econômico, apenas para minimizar o tal "eu posso", com traço de arrogância autoritária. Fora desse escopo, fazer tal escolha para uma escrachada injunção política é mais um absurdo deste mundo desmesurado. Só mesmo um alopramento exibicionista, vindo da cabeça de quem tudo desrespeita pela empáfia do poder, justifica essa aberração. Afinal, imposição tarifária, como chantagem ideológica, significa fazer chacota com a economia dos países envolvidos, o equilíbrio da diplomacia e os próprios negócios empresariais. Não há o menor sentido promover esse desalinhamento do comércio exterior e daí se queimar milhares de postos de trabalho.
Penso que esse fato esdrúxulo é mesmo coisa de impostor, que por se sentir como um "outsider" da cena política, faz-se crer como donatário de incontestáveis poderes. Gestos de soberba que só favorecem uma escala de fanatismo. A lamentar que isso aconteça com verniz autoritário, que age para intolerar o contraditório. Evidecia-se o pensar de Camus, quando a realidade absurda se espalha pelo mundo.
Pior é constatar uma audiência para incríveis manifestações de insultos à soberania. Algo gerado por uma artimanha de fidelidade, onde só se prospera o absurdo, por atitudes de filhos inescrupulosos, políticos acólitos e governantes oportunistas. Em defesa do indefensável.
Nesse "vale tudo", não há sequer motivos para surpresas, pois o absurdo virou rotina da realidade. Resta a crença na obstinação de Sísifo e na indignação de Camus. Apesar de envolvida num vácuo entre a estupidez das 'trumpetadas" e o fanatismo de brasileiros subservientes, agora vestidos por um "verde e amarelo" desbotado.



