'Fevereiros' exalta religiosidade de Maria Bethânia, da Bahia até o Sambódromo, no Rio
O documentário, dirigido por Marcio Debellian, acompanha Bethânia em seu universo religioso de Santo Amaro até o desfile na Mangueira em 2016, ano em que a escola foi campeã homenageando a intérprete baiana
Entre Santo Amaro, no Recôncavo baiano, e o sambódromo do Rio de Janeiro, havia um caminho de orixás, santos, figas e balangadãs levados pelo diretor Marcio Debellian para produção do filme-documentário “Fevereiros”, com estreia nesta quinta (14) nas salas de cinema do Recife.
E a ideia nem era levar o samba da Mangueira ao 18º título do Carnaval carioca daquele ano de 2016, mas parecia inevitável outro resultado, tendo como homenageada “Maria Bethânia: A Menina dos Olhos de Oyá” e todo o sincretismo religioso que cerca uma das vozes mais pungentes de nossa música.
“Parecia uma coisa grande que merecia ser registrada: a homenagem da Mangueira à Bethânia”, afirmou o diretor em entrevista à Folha de Pernambuco. De fato, havia uma imensidão de realidades que precisavam ser contadas, afinal tratavam-se ali de relações históricas entre Carnaval e religião, com um protagonismo de uma filha ilustre de Santo Amaro.
“Ela (Bethânia) carrega uma harmonia religiosa que reflete em sua personalidade. Foi bonito de ver a convivência de tantas invocações nas festas de fevereiro (de Santo Amaro) e foi esse recorte aberto pelo samba da Verde e Rosa que inspirou a produção”, completou Debellian, se referindo aos festejos que começam na cidade natal da intérprete baiana, entre os dias 24 de janeiro e 2 de fevereiro.
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Explorando uma Santo Amaro que celebra Nossa Senhora da Purificação dos tempos de Dona Canô até os dias atuais, o documentário traz, entre os depoimentos, Mabel Velloso e Caetano Veloso, irmãos de Bethânia, percorre as ruas da cidade que se basta por sua religiosidade e chega aos desenhos das primeiras alegorias da Mangueira, até o desfile na avenida com o apogeu do enredo uníssono em homenagem à menina dos olhos de Oyá.
E questões sociais de tolerância e relacionadas ao racismo, também são levantadas no filme, sempre dentro do universo do samba. O carnavalesco Leandro Vieira, à frente da Mangueira em 2016, retrata, por exemplo, a importância de trazer à tona o Brasil dos negros e dos mulatos, assim como coube ao historiador Luís Antonio Simas ressaltar, em sua fala, a (inevitável) apoteose na avenida, porque ali estavam o samba e Bethânia desfilando e, portanto, o povo representado.
“Não se pode falar de samba sem lutas e resistência”, reforça o diretor de “Fevereiros”, que chega às telas do Recife 15 dias depois de seu lançamento nacional, em 31 de janeiro, fato lamentado por Marcio Debellian. “Desculpe Recife. É falta de cinema querendo mostrar filme de arte”.
O longa circulou por festivais de cinema pelo mundo, passando por Canadá, França, Rússia, Suíça e Espanha, emtre outros países, além de ter sido premiado como Melhor Filme no 10º IN-Edit Brasil e de ter recebido menção honrosa do júri na competitiva Ibero-americana no Uruguai.
Agora, nos cinemas de todo o País, como diria o próprio diretor, a ideia é "circular muito" e levar a olhos e ouvidos de todas as raças, a (saudável) impregnação do sincretismo religioso, conduzida com maestria em todo o enredo do filme, sob o protagonismo das meninas dos olhos de Oyá, Maria Bethânia, a filha de Iansã, embora inserida desde infância às novenas da igreja de Santo Amaro.


