José Paulo Cavalcanti ocupa cadeira que pertenceu a Nélida Piñon na Academia das Ciências de Lisboa
Em entrevista à Folha de Pernambuco, escritor e jurista recifense falou sobre sua relação com a literatura portuguesa
Além de um profundo conhecedor da poesia de Fernando Pessoa, o jurista e escritor José Paulo Cavalcanti é autor de obras de outros literatos portugueses, como Camões, Padre António Vieira e Eça de Queiroz. Essa sua ligação com a literatura portuguesa ganha caráter oficial, agora que detém o título de sócio correspondente da Academia das Ciências de Lisboa (ACL) - instituição semelhante à Academia Brasileira de Letras (ABL).
José Paulo Cavalcanti foi eleito no final de janeiro deste ano, por unanimidade, para ocupar a cadeira que pertencia à escritora brasileira Nélida Piñon, que morreu em dezembro de 2022. A cerimônia de posse do pernambucano ocorreu na última quinta-feira (9), em Lisboa, com portugueses e brasileiros presentes na plateia.
“De alguma forma, é uma homenagem a Pernambuco. Na história da Academia, sou o segundo pernambucano que faz parte dela. O outro é Marcos Vilaça. Outra coisa importante para mim é suceder Nélida Piñon, que foi uma amiga muito querida”, afirma o escritor e jurista, em entrevista à Folha de Pernambuco.
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O livro mais conhecido de José Paulo Cavalcanti é “Fernando Pessoa: uma quase-autobiografia”, vencedor de importantes premiações, como o Prêmio Jabuti e o Prêmio José Ermírio de Moraes. Obra de referência sobre o poeta português, a publicação está em sua sétima edição no Brasil e está à venda em países como Espanha, França, Alemanha, Holanda, Itália, Romênia, Inglaterra, Estados Unidos, Israel e Rússia.
“Acredito que o fato de ter sido traduzido no mundo todo teve um peso na decisão dos acadêmicos”, comenta Cavalcanti, que aponta outro fator que pode ter sido decisivo para a sua eleição. “Tenho muitos amigos em Portugal, inclusive membros da Academia. Só quando escrevi a biografia do Pessoa, viajei para o país 30 vezes. Entrevistei todos os autores que haviam escrito sobre ele e conversei com jornalistas. Isso tudo me leva a ser cada vez mais próximo de Portugal e muito presente nas questões literárias do país”, complementa.
A ACL não é a primeira instituição literária da qual José Paulo faz parte. Em novembro de 2021, o recifense foi eleito para a Academia Brasileira de Letras, ocupando a cadeira de Marco Maciel. Antes disso, ele já fazia parte da Academia Pernambucana de Letras (APL). “Meus amigos estão dizendo que sou tri. Eu respondo que isso não é nada diante do hexa do ‘Timba’ [referindo-se ao Náutico, seu time de coração], que é muito mais importante”, brinca.
Como as sessões quinzenais da academia portuguesa são transmitidas pela internet, José Paulo deve acompanhá-las à distância, de sua casa no Recife. “[Fazer parte da ACL] é essa grande troca de experiências e a oportunidade de conectar Pernambuco com o resto da vida intelectual do Brasil e na Europa”, analisa.
Em seu discurso de posse, José Paulo compartilhou parte do resultado das pesquisas feitas por ele no Arquivo Nacional Torre do Tombo, em Lisboa, ao longo do ano. Sua principal descoberta diz respeito à existência de poesia produzida no Brasil antes de Bento Teixeira (1561-1618), tido pela historiografia oficial, até então, como o autor do primeiro poema escrito no País.
“É um tema que é muito mais relevante para o Brasil do que para Portugal. O poema épico de Teixeira foi publicado em 1601, um ano após a sua morte. Meus estudos na Torre do Tombo mostraram que, antes dele, Bartolomeu Fragoso escreveu poesia no Brasil, entre 1579 e 1592. Ele foi a primeira pessoa condenada pela Inquisição no País, e no seu processo, estão sete sonetos e uma grande ode em 157 quadras e uma quintilha. Não apenas recuperei esse poemas, como os traduzi para um portugues que hoje se possa ler e entender”, explica o escritor, que promete publicar os textos por meio da ABL.

