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Lei obriga, mas só três das vinte rádios do Grande Recife tocam frevo regularmente

Rádio Folha FM dedica momentos ao ritmo todos os dias do ano

Por mais frevo  o ano inteiroPor mais frevo o ano inteiro - Foto: Arte: hugo carvalho fotos de leo motta e inte

 

Erudito e popular, o frevo exige conhecimento complexo sobre uma orquestra inteira para sua composição, mas seu entendimento é simples, “entra na cabeça, depois toma o corpo e acaba no pé”. Apesar de a alegria contagiante no ouvir, é raro escutar o patrimônio tocar nas rádios da cidade. Das cerca de 20 emissoras da Região Metropolitana do Recife, apenas três tocam regularmente o ritmo.
Além da Rádio Universitária (FM 107.9) e da recente Frei Caneca (FM 101.5), a Rádio Folha (FM 96.7) toca frevo desde sua formação em 2004. O Momento do Frevo acontece o dia inteiro. “No Carnaval a gente intensifica a quantidade, mas ele toca o ano todo. É obrigação nossa dar o valor que damos ao frevo. É a responsabilidade, enquanto rádio educativa, de levar qualidade para o ouvinte e estimular o gosto por nossas raízes, entre elas o frevo”, descreve a gerente da rádio, Marise Rodrigues.
A iniciativa tornou-se Lei Municipal em 2013, sob a numeração 17.861. Chamada de Lei do Momento Frevo, ela exige que pelo menos duas músicas do ritmo sejam tocadas diariamente nas emissoras locais pela manhã, de 8h ao meio-dia, e à tarde, das 14h às 18h. Entretanto, com caráter educativo, sem punições ou fiscalização, a regra não costuma ser cumprida.

“É um absurdo. Não deveria existir uma lei que obrigue uma rádio local a tocar música da terra”, opina o paraibano Hugo Martins, que apresenta o programa “O Tema é Frevo”, na emissora universitária, desde sua época AM, há cerca de 50 anos. “Nos anos 1950, tocava-se mais. Depois, com a invasão de músicas estrangeiras, diminuiu de forma drástica. Mesmo sendo um patrimônio universal da humanidade, não se dá valor”, acrescenta. “Mesmo no Carnaval, preferem pagar fortunas para artistas de outros estados ao invés de valorizar o que é daqui”, critica.

Mesmo enquanto rádio experimental a Frei Caneca tocava bastante frevo. No aniversário do gênero, lançaram o primeiro programa “Difusora Revista Cultural”, dedicando uma hora da virada de frevo para debates e entrevistas sobre o assunto. “Fazemos a programação para que a rádio seja a trilha sonora da cidade, reflita a vida nas ruas”, descreve o gerente da Frei, Patrick Torquato.

Além de cultura regional, o gênero pode ajudar a entender a história e relações sociais da cidade. “Não se canta só amor e saudade. Tem muito para estudarmos e entendermos. Ainda falta a gente ouvir, a gente nem assimilou. Frevo é de vanguarda, ele já passou a gente”, defende o músico e compositor pernambucano Juliano Holanda que lançou no último dia 09 o frevo “Morrer em Pernambuco”.

Romper com a sazonalidade do frevo é um tema discutido desde a década de 1950. “Isso tem a ver com quem ouve, com quem faz, com quem trabalha, com a população de uma maneira geral. Essa relação de mercado está muito mais vinculada a questões econômicas, e ao poder, a vontades políticas que não são só do poder público, mas das empresas privadas e de quem quer fazer o melhor”, afirmou a historiadora e assessora especial da Secretaria de Cultura do Recife, Carmem Lélis.

Depoimentos
“Eu não escuto frevo nas rádios. Acho que não passa, mas deveria. O rádio pernambucano deveria tocar música pernambucana e não só na época do carnaval”.
Anderson Machado, analista de sistemas, 34.

“O frevo é muito sazonal, toca nessa época e pronto, não se ouve mais. Sinceramente não faz falta”.
Frederico Machado, professor universitário, 32.

“No corre-corre você nem percebe, mas faz falta. Porque eu gosto. É algo tão bom, algo que eu quero ouvir mais nas rádios”.
Kelly Guerra, contadora, 40

“É como se fosse algo desaparecido, mas faz parte da nossa cultura. É raro tocar em outro mês”.
Matheos Guerra, estudante, 12

“Frevo tem a nossa identidade, um 'frevor' que é só nosso, não é? É um bem nosso, que devemos perpetuar. De fato, quase nenhum rádio toca. Lamentável”.
Raquel Brandão, psicóloga, 65

 

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