"O Filho de Mil Homens": Daniel Rezende se arrisca em adaptação "quase impossível" de livro
Filme derivado do romance de Valter Hugo Mãe ficou em sexto lugar entre os títulos de língua não-inglesa mais vistos na Netflix
Daniel Rezende, diretor de filmes como “Bingo: O Rei das Manhãs” (2017) e “Turma da Mônica: Laços” (2019), leu “O Filho de Mil Homens” pela primeira vez durante a pandemia. Ao saber que os direitos para uma adaptação cinematográfica do livro de Valter Hugo Mãe já haviam sido adquiridos, o cineasta tratou logo de se oferecer para a direção.
“Para mim, o livro foi um sopro de esperança na humanidade. Fui me encantando pela prosa poética que o autor usa para falar de afeto, empatia e pertencimento, assuntos que eu acho que a gente precisa muito falar nesse momento de um mundo tão barulhento, cheio de informações e, ao mesmo tempo, com tão pouca escuta”, apontou Daniel Rezende, em entrevista à Folha de Pernambuco.
Coincidentemente, o cineasta possuía uma boa relação com a produtora Biônica Filmes, que havia comprado os direitos de produzir o filme junto com a Barry Company, e com a qual ele já havia trabalhado nas adaptações da “Turma da Mônica”. “Eu tinha certeza que esse deveria ser o meu próximo projeto, por mais que fosse um livro quase impossível de adaptar. Tive uma certa imprudência em não pensar nisso. Só sabia que precisava fazer”, relembrou.
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Envolvida na produção também estava a Netflix, que lançou a obra em seu catálogo em novembro. Na última semana, o longa-metragem alcançou o sexto lugar entre os títulos de língua não-inglesa mais vistos na plataforma globalmente. Antes da estreia no streaming, a empresa abriu uma janela de exibição do filme em salas de cinema, algo que ainda não havia acontecido com uma obra nacional.
“O Filho de Mil Homens” conta a história de Crisóstomo, interpretado por Rodrigo Santoro. Ele é um pescador solitário, que alimenta o sonho de se tornar pai. Sua vida muda com a chegada de Camilo (Miguel Martines), um menino órfão. Antonino (Johnny Massaro) e Isaura (Rebeca Jamir), também marcados pela dor, cruzam o caminho dos dois, expandindo a ideia de família para eles.
Apesar de enxergar ousadia também em seus trabalhos anteriores, Daniel Rezende não esconde que o novo longa representa uma espécie de reinvenção em sua direção. “É um tipo de cinema que eu nunca tinha feito, algo muito mais pessoal e autoral, de maneira que, talvez, não seja um filme para todo mundo. Meus outros longas tinham uma pegada um pouco mais pop e esse se arrisca mais, vai na contramão do algoritmo. Além disso, é a primeira vez que eu escrevo um roteiro”, comentou.
Na contramão de outros títulos presentes no catálogo da Netflix, o longa de Rezende não parece preso a fórmulas para engajar o público nas redes sociais. “Esse é um filme que propõe o silêncio e um tempo estendido, flertando com o realismo mágico em um ‘não-lugar’. Mais do que tudo isso, ele fala sobre afeto, que é o que tem surpreendido as pessoas muito positivamente”, disse.
O longa conseguiu emocionar até mesmo o escritor Valter Hugo Mãe. Durante sua participação na 23ª Festa Literária Internacional de Paraty, em agosto, o português chegou a afirmar que o filme superava a obra literária. Em sua adaptação, Daniel manteve a essência do romance, mas teve liberdade para fazer algumas mudanças.
“Acho que o filme é muito fiel ao livro, mas tem sua identidade própria. Não gosto dessa disputa de qual é melhor. São duas coisas diferentes, que podem coexistir e se complementar. Mas é claro que não posso negar que fiquei muito mais feliz ao saber que o filme tocou o criador da história de uma forma tão especial”, confessou.

