"Ser linda, jovem e sexy passa", diz Paolla Oliveira
Atriz reflete sobre a luta que é se libertar da expectativa alheia, bancar as próprias escolhas e conta como Heleninha, de "Vale udo", mudou sua vida
Heleninha Roitman chacoalhou as emoções de Paolla Oliveira. A intensidade com que desbrava a própria vulnerabilidade para acessar a frequência frágil da alcoolista da novela “Vale tudo”, da TV Globo, tem deixado a atriz de 43 anos à flor da pele. O choro é livre e irrompeu duas vezes durante sua participação no ‘Conversa vai conversa vem’, videocast do O Globo, no ar no YouTube e no Spotify.
Mas não é só (só?) isso. Heleninha provocou virada de chave em sua intérprete sobre que atriz (e mulher) deseja ser. Não à toa, ela deixou o posto de Rainha de Bateria da Grande Rio para focar na carreira. Paolla também está focada em descobrir quem matou Odete Roitman. Organiza até um bolão entre o elenco. Sobre os próximos passos de sua personagem, diz que “shippa” o futuro romance de Heleninha e Renato.
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Na entrevista completa, a atriz revê a trajetória que a transformou de menina tímida que não respondia chamada na escola na estrela de novela das 8 e em voz importante na defesa de corpos diversos e escolha pela não-maternidade. Leia um trecho abaixo:
Como foi encontrar em você a vulnerabilidade de que Heleninha precisava?
Foi lindo. Falou sobre o meu artístico. Me redescobri. Quando me perguntavam sobre as mocinhas que eu fazia, a primeira coisa que eu falava era: “Ela é uma mulher muito forte, não é boba, não”. Por que tinha que afirmar isso? Era a Paolla falando. Agora vou atrás de uma mulher que vira meu mundo de cabeça para baixo, me vira do avesso. Me vejo através dela. Essa mulher como a gente é num relacionamento, o quanto a gente se entrega, é obsessiva, frágil, tentando a busca pelo outro e esquecendo da gente. A vida fala o tempo todo: “Seja forte”. Onde podemos nos dar acalanto?
Heleninha te deu um reconhecimento que não tinha? Entendeu que tipo de atriz quer ser?
Acho que tô na esfera da ousada, da corajosa. Tenho feito mudanças na vida para não me acomodar com conquistas. Quando vou atrás da Heleninha sabendo o desafio psicológico, emocional e mudo coisas, estou me modificando como artista. Meu desejo era subir degraus. Estou na escada. São perguntas que tenho feito: que tipo de mulher quero ser? Que coisas quero aceitar ou não? Artisticamente também. Minha arte merecia espaço com meu emocional tranquilo. Por isso, abri mão do carnaval. Detesto a história de equilibrar pratos.
O carnaval se tornou gigante para você. Não está desesperada com esse vazio? Além de Heleninha, teve questão com seu pai... ele está bem?
Desesperada! Estaria arrumando roupa, teria feito mil reuniões, mas há demandas psicológicas. Meu pai está doente. O carnaval dependia de mim emocionalmente, fisicamente. Não ia dar conta. Consegui sair num momento bom. Por que só mudamos a vida, relacionamentos e trabalho, quando estão péssimos? É saída simbólica, o carnaval está em mim.
O que achou de Virginia Fonseca assumir o posto de rainha de bateria da Grande Rio?
Alguém ia ter que assumir. A Grande Rio sabe o que está fazendo. Vou passar a faixa. Só conheço a pessoa pública. Temos valores e pensamentos diferentes. Não acho que nenhuma opinião minha valha. Será só para criar Fla x Flu entre rivalidades femininas. Meu desejo é que tenha amor, responsabilidade e dedicação com a comunidade, com as mulheres. Tudo que conquistei foi olhando e escutando essas mulheres.
Foi no carnaval que descobriu o que pensa sobre o lugar da mulher no mundo?
Quando me chamaram, ouvi “sua carreira vai cair, vai perder o valor”. Fui, saí, fiquei agoniada porque queria mais e, quando volto, é como essa mulher que não se importa com o que vão falar. Me redescubro como mulher, descubro essa festa sobre a identidade do nosso povo, ancestralidade, diversidade de corpos. Em vez de olhar com moralismo, achar que é vulgaridade, é ver como lugar onde a mulher possa se libertar. Tornei esse movimento enorme a ponto de mudar minha relação com o mundo.
Você foi embaixadora de marca de cerveja no carnaval. Com Heleninha anunciou que não faria publicidade de bebida alcoólica. Perdeu muito dinheiro?
Nem sei. Abri mão antes, e eles nem chegaram. Me questionei. Não é sobre quem vai fazer, mas como estamos fazendo. Não pode mais colocar mulher como objeto de desejo e nem associar o fato de ser bem-sucedido sexualmente, socialmente, economicamente. Mas ainda falta.
O alcoolismo feminino é mais um lugar em que a mulher enfrenta o machismo o estigma de que as mulheres que bebem são promíscuas, acessíveis sexualmente... Qual a importância de a novela trazer esse assunto para a conversa?
É muita coisa. Acho que Heleninha é desses personagens que vão passar em outra novela, que volta, sabe, tipo o Jamanta? Ela tem história pra contar. Fui em reuniões só de mulheres, e o recorte feminino é muito triste. Elas fazem algo errado e o julgamento mortal é gigante. As que são mães, o sofrimento delas, que depois de 15 anos contando a mesma história ainda se sentem tristes por conta das coisas que fizeram com o filho. Há sempre uma dificuldade a mais para as mulheres diante dos estigmas serem muito piores para as mulheres. A novela ajuda a discutir, a fazer as pessoas refletirem, tirar da frente esse véu da crítica rejeitar determinados assuntos por esse aspecto afetivo, e eu acho que é muito importante, a novela ainda cumpre um papel social muito importante.
Disse "não" a uma novela dirigida por Luiz Fernando Carvalho, algo considerado irrecusável, te ofereceram outro papel e você brigou para fazer Heleninha em "Vale tudo". Não costuma aceitar o que está posto e assim sua trajetória vem se desenhando...
Vivi muito tempo no instinto de sobrevivência com a minha carreira. Não sabia que ia fazer isso, ninguém na minha família é artista, estudei em escola pública, meu pai é um homem no nordeste, militar, estudei outra coisa (fisioterapia). Venho de uma criação super rígida em que não podia sonhar com determinadas coisas. Não podia muita coisa. Meu pai trabalhava muito, a brincadeira era entre irmãos. Tive uma infância e adolescência pouco lúdica. A gente não lia, não ouvia música, era dura. Comecei a ler muito tarde. Quando tive acesso às artes, fui em busca sozinha e a arte me salvou. Falei para o meu pai que queria ir à aula de teatro, ele foi comigo. Era uma oficina grátis perto da minha casa em Tatuapé. Quando entrei em contato com aquilo, do "vamos imaginar, viajar, experimentar", falei: "Que mundo diferente". Achei que ia ser hobby, corta para eu conseguir meu primeiro papel em "Belíssima".
Peraí, antes teve o programa "Passa ou repassa", em que foi assistente de palco, e novela na Record....
Fiz teste para o "Passa e repassa", e isso tem a ver com minha independência financeira, queria ganhar meu dinheiro. Foi a primeira carteira assinada que tive, recebi um caminhão de que dava cesta básica em casa. Achava maravilhoso, era a prova de uma ascendência, da batalha. Fiz teste pra "Belíssima" e, aí, chego na terceira novela e ouso dizer "não". Vem Danny Bond (a série "Felizes para sempre"). Isso depois de bater em várias portas fechadas. Mas demorei a chegar aí. Vivi no estilo sobrevivência do "vamos fazer, eu faço, vou fazer da melhor maneira que puder". Fui fazendo até entender que já estava fazendo opções sem perceber. Agora, é com mais consciência, querendo mudar até o que eu mesma construí. Aceito os "nãos", mas quando são de verdade. Enquanto puder, vou batalhar.
Foi um caminho, de construção mesmo, né? Muita gente, às vezes, acha que você "nasceu" na TV Globo ou no carnaval. Mas a real é que foi uma batalha grande de uma menina da Zona Leste de São Paulo... Desbravou uma estrada...
Com você falando agora fica até bonito. A gente vem desbravando e não percebe o quanto de coisa... Comecei desbravando na minha família, me entendendo como mulher ali dentro daquela família muito machista. Não julgo o meu pai, mas ele deu essa criação em que a gente não podia emitir opinião. Dessa maneira, fui para a vida. Mas não aceitei ficar assim. Fui tentando ser simpática, gentil, não dizer não, agradar a todos, mas através dos meus personagens me sentia forte.. Às vezes, a gente precisa parar e olhar paras as conquistas, celebrá-las e falar "qual é a minha próxima meta?". Para não estar o tempo todo em modo de sobrevivência como vivi por anos. "Isso aqui é o que me cabe, então é isso aqui que eu quero". Fui muito consciente, tenho muito orgulho do que construí diante da consciência que eu tinha e das minhas opções. De muitas coisas eu não tinha consciência, mas agora, temos! Cada vez mais.
Já disse que antes acreditava quando diziam que seu quadril era grande, seu braço era enorme. O que foi fundamental para parar de acreditar e não se calar mais diante das críticas ao seu corpo?
O inferno que se tornou a minha vida. O desagrado, a insuficiência. Quando se coloca uma roupa em que se sente bonita e não está bonita para os outros. Quando ia fazer um trabalho e me perguntavam sobre quantos quilos ia emagrecer e não sobre o personagem. O carnaval era sobre a dieta que faria. Respondia no modo sobrevivência, tipo: “Sabem mais que eu, preciso responder”. Uma hora era bonita, outra hora não era mais. Aqui era padrão, ali era gorda. Foi uma confusão tão grande que falei: “Não quero mais”. Foi uma crise gigante.
Onde encontrou escuta?
Na internet, esse lugar complexo que é porta de muita gente para identificação. Começou o movimento de mulheres se mostrando, de diversidade, falei: “Existe outro caminho, existe quem eu sou”. Comecei a me reconhecer e falar “preciso estar de acordo com o que penso e não com a expectativa dos outros”. Foi libertador. A régua continua cruel demais, temos que ser mais magra, mais jovem, mais bonita. Mas a partir do discurso posto, conseguimos arrumar lugar de mais conforto. O ano mais lindo foi o da onça, quando fiz vídeo falando: “Quero que se dane meu peso, a dieta que vou fazer, não vou fazer nada, parem de me perguntar”.
Acha que quando a gente se permite ser de verdade, as pessoas percebem?
Super. A liberdade de escolha de ser quem se é, de envelhecer, de emitir opinião, você vai carregar com você. Ser linda, jovem, sexy, passa, e aí, é igual a fracasso. É preciso estar de acordo com o que acha da vida e de você. Servir a expectativa do outro é um peso danado, e muda rápido, é uma construção que faz com alicerce fora de você, e isso não cria um bom edifício.
Como é que ouvir de mulheres: "Passei a usar biquíni por causa de você"?
Um misto de responsabilidade alegria e felicidade, com uma vontade de não parar de falar. O tempo inteiro eu ouço: "Paolla vai falar de corpo de novo? Justo ela que já usufrui tanto desse lugar...". A gente não pode parar de falar, sabe por quê? Quando saímos das nossas bolhas, encontramos mulheres que precisam ouvir que podem ser livres em relação a várias coisas, inclusive, em relação aos corpos.
'Veículos me escolhem por ser quem eu sou e, na hora em que estou lá, querem que seja outra'
Em 2021, você se mostrou sem Photoshop numa sessão de fotos para a Revista Ela. Parece ter sido um caminho sem volta... Ainda tem que brigar muito para suas fotos serem publicadas, sem interferência, sem quererem afinar a sua perna?
Muito! É inacreditável. O discurso é válido, mas, na prática, na prática, vai demorar um bom tempo para acontecer. Eu não tinha nem pensado nisso, era normal me corrigirem.... É interessante como situações, às vezes, nos colocam diante das nossas verdades. Houve uns retrocessos no meio do caminho para eu entender que era para lá que tinha que seguir. E foi maravilhoso. Mas ainda hoje, vários veículos me escolhem por ser quem eu sou e, aí, na hora em que estou lá, querem que seja outra. Por isso, digo que gente precisa alinhar o discurso com as atitudes. Quando a gente escolhe uma Paolla, uma beleza de outra maneira, precisa estar consciente. Porque as belezas a gente aprende. E isso também eu fui buscar. Como a gente vai achar bonito uma coisa que não conhece, não vê? A internet trouxe isso, as publicidades, revistas. A gente precisa colocar essa imagem para que outras mulheres se reconheçam e para que a gente comece a achar bonito.
E esse poder de ser sermos quem somos só pode ser dado pela gente mesmo, né? O amor próprio é a chave de tudo, é o mais importante que há?
Isso está sendo tão falado, né? É tão bonito a gente falar sobre amor próprio, principalmente, para a mulher. As pessoas deveriam não confundir o que é opinião, o que é você ser você mesma, com essa performance que tá virando também, você ser você sobre todos os aspectos, entende? Aí, invadir o outro, criticar, achar sua opinião a mais importante. É preciso cuidado com isso. Confundem autenticidade com essa crítica ferrenha. Amor próprio é você com você mesma, o respeito que tenho a mim sem invadir o outro com o que eu penso por achar que sou a voz absoluta.
Todo o seu posicionamento também impactou diretamente no seu engajamento nas redes sociais. Foi ganhando milhares de seguidores, visualizações nos vídeos. Na época da onça, no carnaval, foi uma loucura... Transforma esse engajamento em dinheiro? A gente sabe que a publicidade se mudou para o Instagram...
Que interessante essa pergunta. Sempre fiz muita publicidade e sempre que me perguntavam por que que fazia, ficava na dúvida. Talvez não tivesse consciência sobre isso. Mas parte disso, talvez, seja a verdade que eu trazia ali. Diante de tudo que vinha aprendendo, existia uma pessoa que ainda questionava algumas coisas, que escolhia coisas que tivessem a ver comigo. Mas eu mudei! E a publicidade veio junto. Teve coisas que eu não quis mais, que também não me quiseram porque eu não fazia mais parte, não me alinhava mais. A publicidade não aceita mais as máscaras. Pode aceitar por um tempo, mas a internet tirou isso. A gente tem valor pela nossa autenticidade, narrativa, opinião pelo quanto estamos alinhados em nossa vida com as questões. Quando me reajustei, me alinhei, e descobri um novo caminho, isso veio junto? Não necessariamente fiz dinheiro pensando "vou mudar aqui porque quero ganhar dinheiro". Nunca foi a minha meta. Pelo contrário, a minha meta era me descobrir.
Dentro das ondas do feminismo, como falamos aqui, muito se debate sobre a liberdade dos corpos, apesar de existir ainda um culto à magreza. Queria falar sobre outro ponto, o da cobrança pelo não envelhecimento da mulher, do rosto sempre jovem. Como lida com com procedimentos estéticos? Há mulheres mudando completamente a fisionomia. Cada uma faz o que quer, mas acha que há uma medida? Qual seria ela para você? Em que momento perde-se a mão? A linha é tênue, né?
Caramba, é tanta coisa aí envolvida. Mesmo eu sendo uma voz no discurso de a gente abraçar nossas características, ser mais natural, isso nada tem a ver com não se cuidar. Seria hipócrita da minha parte. Acredito que a gente tem que ter critério, senso crítico de si mesma, saber "estou fazendo por mim ou pelo outro?". A cobrança pela juventude feminina é muito cruel. A régua ainda está cruel sobre ser mais jovem, mais magra, mesmo com todos os avanços. Acho que os procedimentos estéticos podem ser feitos, a tecnologia está aí para nos ajudar, por que não usar? Mas é preciso lucidez. Se eu puder desejar uma coisa para mim é que eu fique lúcida a ponto de saber quais são as minhas expectativas, os meus desejos, como eu quero me envelhecer. Penso sobre isso: estou exposta, com um rosto numa tela para todo mundo ver, comentar. Faço os meus procedimentos, usufruo e um baita privilégio que é poder me cuidar, mas uma hora a gente tem que deixar o tempo passar, faz parte da vida. Quero poder envelhecer. Faz parte desses pilares de saúde mental, de autocuidado, eu me cuidar. E essa lucidez também.
Pensa com a cabeça de hoje sobre os assédios que sofreu na vida? Não vou nem perguntar se você sofreu, porque não existe uma mulher que não tenha sofrido assédio de algum tipo, né? Mas, sei lá, situações que você não tinha consciência, que hoje você fala: "Caraca!"?
Muitas situações que hoje considero inadmissíveis. Elas estão no meio do caminho, naquelas ações que passavam batidas por nós. Então, quando a gente acaba se vendo aos olhos, nas situações contadas pelos outros... Quando as mulheres colocam várias situações bizarras, falo: "Gente, já passei por coisa parecida!". Todas nós passamos. Que bom que a gente não está mais vendada para esse tipo de coisa. Temos muito ainda que caminhar, mas com um discurso posto, assim como a gente falou, em relação à liberdade e diversidade de corpos, não tem como a gente retroceder, fechar os olhos. E isso é um avanço. Passei por muita coisa no trabalho. Esse assédio moral que, de uma maneira geral, é o que mais está entre nós. E a gente deixava passar, achava que era assim. Eu pensava que a pessoa só estava falando comigo de uma maneira grosseira. Me falaram que o máximo que eu ia chegar era fazer uma playboy. "Ah, já fez uma playboy? Ah, porque isso aí é o seu máximo, o seu auge". E eu falava: "Ah, é? Não, acho que não vou fazer". Quando a gente ouve esse tipo de discurso, que está o tempo inteiro te diminuindo, te menosprezando, esse assédio moral que está entranhado nos nossos ambientes... Quer dizer, estava, porque agora não passa mais. Não passarão.
Como lida com expectativas em relação a você e seu companheiro, Diogo Nogueira? O público fica louco, acha que vocês transam o dia inteiro, né?
Me divirto. É bom estar no imaginário das pessoas. Mas relacionamento é igual para todos, dificuldades, delícias. Não passo o dia inteiro com Diogo cantando no meu ouvido, e eu de cinta liga andando pela casa, sensualizando. As pessoas idealizam. Acabam com o nosso relacionamento, dizem que voltamos, que tivemos filhos. Tem até foto de trigêmeos na internet! É uma vida paralela que acontece.
Mas, mas é muito doido ter, as pessoa têm um relacionamento com vocês, né?
Tem. Tem um relacionamento. E eu vejo, as pessoas vão no show do Diogo e mandam foto, assim, pessoas que eu conheço, mas que não mandam, ele fala, olha, tô aqui, hein, tá mesmo, tá no show, tá aqui em Minas mesmo, eu falei, é, gente, que isso? Aí, as pessoas falam, Paola, manda beijo pra Paola, quando é o Diogo, então, assim, é interessante, mas eu acho que tudo isso é carinho, diante de tantas outras coisas que são tão complexas, né? Acho que essa demonstração de carinho, inclusive com o casal, eu acho delicioso?
Recebe cantada de mulher? Pegaria?
Bastante, recebo bastante. Menina, não tá ainda nos meus planos, não, mas a gente, né? Não vou dizer nunca. O nunca já morreu. Depois que fiz Danny Bond mexeu nesse, diria, gracioso... porque o imaginário é tão amplo, né? Eu adoro, elas são divertidas também, e são, é um assédio num lugar diferente, assim, pra mim, pelo menos, eu sinto, e eu acho divertido.
O que achou de todo mundo ficar falando do implante de cabelo do Diogo?
Isso é um exercício que temos que fazer o tempo inteiro. A gente vinha fazendo coisas ao longo do caminho que não eram legais. Você pode ter opinião, eu tenho minha, às vezes, posso colocar... Se é bom ou ruim não tá mais na nossa gestão, né? As pessoas vão demorar muito tempo ainda para ter essa diferença do quanto pode apontar a vida do outro, do quanto os corpos do outro tá livre pra ser palco, julgamento. Diogo levou isso de uma maneira divertida. Falou: "Tô tão feliz, me sentindo tão bonito, eu não tinha cabelo". Lidou com a crítica de uma maneira diferente. Se fosse uma mulher sendo criticada, ia se abalar. Diogo se abalou zero. Fez um vídeo penteando o cabelo, mostrou que não tinha feito harmonização. Ele não tá nem aí.
Por defender a escolha pela não-maternidade foi acusada de ser insensível e contra a família...
Tinha tanta vergonha de falar. Começou em casa, meu pai falou: “Quando vai casar na igreja, com flor de laranjeira e ter filhos?”. Somos criadas para isso. A sociedade falou o tempo inteiro que se não tiver filhos é menos mulher. Comecei a arrumar um monte de artifício até perceber que não estava sozinha. Era a opção de 37% das mulheres. Fiquei mais confiante, assumi que era uma opção válida de liberdade que diz respeito apenas a mim. É uma escolha, tenho óvulos congelados e posso mudar de ideia. Toda hora que a gente se posiciona, isso te engaveta. Mas ainda é uma escolha válida, apesar de eu ter a possibilidade de mudar de ideia.
É importante poder dizer que há uma vida consistente, interessante sem ser mãe.
É reducionista esse tipo de lugar na mulher, como se você fosse menos mulher, fosse um ser improdutivo. Assim como quando envelhece sai do jogo, não faz parte mais de algo que possa produzir, pensar, emitir opinião. Fico orgulhosa de não ter mais vergonha, de outras mulheres chegarem até mim e falarem "também tinha vergonha, achava que era a única e quando vejo você falando abertamente, vejo que é um movimento meu de liberdade". Fico feliz de ter essa consciência e levar ela adiante.
Que perguntas se fez para chegar a essa decisão?
Não foi tão claro, foi ao longo do caminho. Não acho que ser mãe limita. Claro que é um desafio ser profissional. Não olhei por esse lado, mas pelo meu real desejo. O que é o meu desejo e o desejo, a expectativa do outro, a sociedade me empurrando para fazer uma coisa que não tenho o desejo? Ouvi muito sobre o egoísmo, sobre mães que trabalham e não ficam com os filhos, pensa só nela. E também: "Ah, mas você vai ficar sozinha quando ficar mais velha". Oi? Então, parto do princípio que vou gerar um ser que vai me cuidar quando eu ficar velha? Diante da impermanência que é a vida, que garantia tenho disso? Também acho cruel colocar a velhice ou a não solidão numa outra pessoa, mesmo que seja seu filho.
Essa escolha impacta sua vida profissional? Porque uma marca chegou a afirmar que não podia vender produtos para a família...
Vinha fazendo a campanha, mudaram as cabeças pensantes da marca e foi uma questão: “Temos que ver outra pessoa porque ela não é tão família”. Eu: “Família é o que? É só sobre ter ou não filhos? Eles são extensão, mas que outros aspectos familiares tenho que podem suprir isso?”. Teve discussão e, por dez anos, fiz essa campanha em que disseram (chora) que, talvez, eu não fosse mulher suficiente. Ou que não devia estar na sociedade como uma pessoa que tem família por não querer ser mãe. Provei que a gente pode falar de família, sobre as datas que nos são caras, ser amorosa e afetuosa por outros aspectos. Ser mãe é grandioso, só não é meu desejo. Mas isso não me reduz, isso não me diminui.
Alteraram uma entrevista sua no 'Roda Viva' e havia um perfil fake seu no Instagram que fazia publicidade com a sua imagem. Como tem sido ligar com a inteligência artificial sem limites?
Comecei a falar desse assunto porque tinha um perfil com três milhões de pessoas vendendo coisas que não autorizei. Não é só sobre a minha imagem e credibilidade, é sobre defender também o meu publico, que demorei para conquistar, que confia em mim. Pasme: quando falei sobre regulamentação da internet como um todo, as pessoas usaram censura e outros termos nada a ver. Não é sobre não poder falar, mas sobre ter regras. Como a gente normaliza uma internet como uma terra sem lei? Tem que ter lei. Quando pedi para derrubar a página, o dono processou a plataforma. Pedi para ser auxiliar no processo, que é um caminho gigante. Gastei dinheiro, tempo. Sou uma pessoa publico, posso ir no Instagram e dizer que não sou eu. Imagina quem não tem essa exposição, essa voz. É sobre todo mundo, nõa só sobre a Paolla. É sobre a pessoa física, adolescentes criançcas tendo imagens adulteradas. Até que você consiga fazer algo a sua imagem vai estar lá.
Você fez uma participação na série portuguesa, "Mar Branco", e agora depois da novela, quais são os planos?
Férias, talvez? Com todas as escolhas que fiz, ainda não consegui parar e não vislumbro tão cedo. A novela é até outubro, empurrei a vida pra frente e tenho que dar conta dela. Tem um fim do ano, um carnaval que ainda estou vendo o que vai acontecer. Mas é isso, a menina que não respondia chamada, a moça da penha que chegava de ônibus e tinha que esperar os carros passarem para atravessar a mureta de cimento da estrada para chegar na hora no trabalho, no "Passa e repassa", está aqui com você. Isso é conquista e estou feliz.

