Saiba como foram os bastidores da negociação da aprovação unânime do projeto de IR na Câmara
Projeto foi aprovado pela Casa sem alterações relevantes nos critérios de compensação desejados pelo governo
O placar unânime que marcou a aprovação do projeto que prevê isenção de Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil na Câmara, na quarta-feira (1º), foi precedido de uma longa negociação.
Ministros do governo e integrantes da equipe econômica se reuniram com deputados até o último minuto para garantir que a proposta sairia sem alterações do plenário. Uma quebra de acordo apontada pelo relator, Arthur Lira (PP-AL), chegou o motivar o reinício da votação.
Ex-presidente da Câmara e ainda hoje um dos parlamentares mais influentes da Casa, Lira se empenhou para que o texto enviado pelo governo fosse alterado o mínimo possível. De 99 sugestões recebidas, aceitou apenas 3, que pouco mudaram a essência do projeto. Já com a sessão iniciada, desceu à "planície" e, no meio do plenário, reuniu deputados para convencê-los a não tentar alterar pontos do seu relatório.
O avanço do projeto foi a primeira vitória relevante do governo do presidente Lula desde quando Hugo Motta (Republicanos-PB) foi escolhido para comandar a Casa. O texto contou com o apoio de 493 deputados e nenhum contrário.
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A votação foi acompanhada de perto por integrantes do governo, como secretário nacional da Receita, Robinson Barreirinhas, e pelo secretário de Reformas Econômicas, Marcos Pinto. A ministra das Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann, e o ministro dos Esportes, André Fufuca, também esteve presente. Mesmo com prazo para deixar o cargo, após ultimato de seu partido, e articulou o apoio dentro da bancada do PP e também dialogou com o União Brasil.
Circulando pela planície da Casa após quatro anos da presidência, Lira repetiu aos colegas que seu texto era uma “unanimidade”, orgulhoso do resultado.
Apesar do apoio unânime, houve momentos de tensão durante a votação. A Lira deixou claro, em discurso, a irritação com os líderes do PSB e do Novo. Os dois haviam se comprometido a retirar destaques, de votação de trecho em separado. durante a votação do projeto do Imposto de Renda, mas não cumpriram o acordo e apresentaram propostas incluindo a correção da tabela do IR indexado ao IPCA. A confusão atrasou a tramitação e fez com que a votação reiniciasse.
O ex-presidente da Câmara reagiu de imediato: classificou todas as propostas como “inadequadas economicamente” e atropelou a tentativa de mudança no texto, uma forma de impor autoridade no plenário.
Em outro momento, Lira conversou com uma série de deputados de oposição, entre eles o líder do PL, Sóstenes Cavalcante (RJ). Segundo relatos, o ex-presidente da Casa estava explicando detalhes do texto e defendendo a tributação de escritórios de advocacia.
Lira participou de diversas reuniões ao longo do dia para alinhar o texto. Além do encontro com líderes partidários e Hugo Motta, o relator também ouviu o presidente do PP, senador Ciro Nogueira (PI).
Ao chegar no plenário da Câmara para participar da votação, o deputado do PP não escondeu a insatisfação com o fato de o Senado ter avançado com um texto alternativo de isenção do IR. Na outra Casa Legislativa, o projeto foi relatado pelo senador Renan Calheiros (MDB-AL), rival de Lira.
O relator reclamou que os senadores demoraram para aprovar a regulamentação da reforma tributária.
"No Senado fizeram até na frente (projeto do IR do senador Renan Calheiros). Não vi nenhuma cobrança no Senado na reforma tributária".
Durante seu discurso na Câmara, Lira também reclamou da pressão popular contra os deputados após a aprovação da PEC da Blindagem. No último dia 22 de setembro foram realizados protestos em todas as capitais do país em que a Câmara foi um dos principais alvos.
As manifestações pediram a aprovação da isenção do IR e também criticaram a aprovação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da Blindagem, que dificulta investigações contra parlamentares. A PEC foi aprovada pelos deputados, mas rejeitada no Senado.
"Cumpriu o presidente Motta o prazo estabelecido também de trazer a matéria a este plenário até o final de setembro. Hoje, nós estamos na primeira quarta-feira da semana, 1º de outubro. Portanto, qualquer crítica enviada a esta Casa, de onde vier, não é justa, não é correta".
O líder do PDT na Casa, Mario Heringer (MG), também citou as manifestações.
"Câmara está jogando para fora depois da porrada".
O líder do PP na Câmara, Doutor Luizinho (RJ), também participou de uma série de reuniões ao longo do dia. Ele conversou com Hugo Motta, o líder do União Brasil, Pedro Lucas Fernandes (MA), com a senadora Tereza Cristina (PP-MS) e o deputado Evair de Mello (PP-ES).
Da base à oposição, o clima foi leve e de quase consenso em torno da proposta. Deputados do PT chegaram a fazer piadas durante a votação, afirmando que Renan Calheiros poderia ser escolhido relator, rival do Lira. Questionada sobre o tema, a ministra Gleisi Hoffmann afirmou não ter uma decisão.
"Vamos esperar o texto chegar ao Senado", afirmou.

