UE tenta proteger Airbus e montadoras em negociação comercial com os EUA; Ferrari deve ficar fora
Gigante europeia fabricante de aviões comerciais, principal rival da Boeing, é um dos pontos sensíveis da negociação tarifária entre Comissão Europeia e o governo de Donald Trump
Enquanto a União Europeia se aproxima de um acordo comercial com os Estados Unidos, seus negociadores estão concentrando esforços para proteger setores-chave contra tarifas alfandegárias maciças que devem atingir as exportações do bloco para a maior economia do mundo já em 1º de agosto.
A Comissão Europeia, responsável pelas questões comerciais da UE, está prestes a concluir um acordo preliminar que isentaria aeronaves comerciais de algumas tarifas, em um possível impulso à Airbus SE, segundo pessoas familiarizadas com o assunto ouvidas pela Bloomberg.
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O acordo também incluiria exceções para algumas montadoras de automóveis — principalmente alemãs — proporcionando alívio a empresas como a BMW AG e a Mercedes-Benz Group AG.
Outras montadoras, como a italiana Ferrari NV, podem ficar de fora dos benefícios, já que a isenção pode contemplar apenas empresas com fábricas nos Estados Unidos, informou a Bloomberg anteriormente.
Os setores poupados — bebidas alcoólicas também devem receber alívio — refletem o peso político de Estados-chave da UE, os setores considerados críticos pelo bloco e as áreas nas quais os EUA têm interesse em proteger seus próprios fabricantes.
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No caso da fabricante de aviões Airbus, trata-se de uma combinação desses fatores.
— Ela é, sem dúvida, o estandarte da indústria aeronáutica europeia — disse John Strickland, analista de aviação da JLS Consulting, em entrevista. — Tarifas repassadas aos clientes podem ter um efeito significativamente negativo sobre a demanda e, portanto, sobre o sucesso financeiro da Airbus — afirmou.
Maior fabricante de jatos do mundo
Mais do que a maior fabricante mundial de jatos comerciais, a Airbus monta suas aeronaves por meio de uma complexa rede de fornecedores peças e fábricas, sendo símbolo da cooperação industrial no continente europeu.
A sede principal da Airbus fica em Toulouse, no sul da França, onde há linhas de montagem final para diversos produtos, além da outra grande unidade em Hamburgo. Com o tempo, porém, a fabricante expandiu sua presença de produção global para Tianjin (China), Mobile (Alabama, EUA) e Mirabel (Canadá).
Isso deu à Airbus uma ferramenta poderosa para vender jatos fabricados localmente a clientes nos EUA e na China, os dois maiores mercados de aviação. A Boeing, por outro lado, produz apenas nos EUA, sem a opção de adaptar sua estrutura global a tarifas específicas em certos mercados.
A UE fez da proteção à fabricante uma prioridade. O comissário europeu para a Indústria, Stephane Sejourne, disse à Bloomberg no mês passado que a Airbus não pode estar sujeita ao que considera "concorrência desleal" da Boeing, sediada em Arlington, Virgínia, nos EUA, já que a empresa europeia enfrenta uma tarifa adicional de 10%.
— Se não reequilibrarmos, deixaremos setores líderes desprotegidos; há um interesse econômico em agir assim — afirmou.
Ainda não está claro quais tipos de isenções tarifárias imediatas os EUA concederão à UE para aeronaves, peças e bebidas alcoólicas, disseram as fontes, que pediram anonimato.
Estratégia europeia
No Paris Air Show do mês passado, o maior evento anual da indústria, o secretário de Transportes dos EUA, Sean Duffy, afirmou apoiar o retorno aos termos do acordo comercial de 1979, que isentava aviões e peças de tarifas no comércio transfronteiriço.
Duffy reconheceu que o setor de aviação gerou superávits comerciais para os EUA graças ao pacto de décadas. Ele disse a jornalistas:
— Deveríamos tirar a aviação da mesa de negociações, voltando a 1979, o que nos ajuda a eliminar ferramentas de negociação que hoje são úteis para nossos parceiros.
Atualmente, as tarifas dos EUA cobrem € 380 bilhões (US$ 445 bilhões), ou cerca de 70% das exportações europeias para o país, segundo estimativas da UE. Em sua última previsão, feita em maio, a Comissão Europeia revisou significativamente para baixo sua projeção de crescimento para este ano como resultado da guerra comercial, esperando uma leve alta de 1,1%, ante 1,5% estimados em novembro.
Pressão para livrar automóveis
A UE tem até 1º de agosto para firmar um acordo comercial preliminar que mantenha uma tarifa de 10% enquanto os negociadores trabalham por um pacto permanente. Se não houver acordo até essa data, as tarifas sobre quase todas as exportações do bloco para os EUA saltarão para 50%.
O bloco também pressiona os EUA por cotas e isenções para reduzir, na prática, a tarifa de 25% aplicada por Washington a automóveis e peças, além da tarifa de 50% sobre aço e alumínio, segundo as fontes. Mas um avanço nessas questões ainda não está à vista.
As tarifas sobre veículos aumentaram os custos e a complexidade para os fabricantes europeus, que dependem do lucrativo mercado norte-americano para vender seus SUVs maiores e mais caros.
A situação é especialmente crítica para as montadoras alemãs, que enfrentam pressão para manter participação nos EUA enquanto perdem terreno na China, onde marcas locais como a BYD Co. estão dominando.
A Porsche AG e a Mercedes relataram esta semana queda nas vendas de veículos, devido à redução de entregas na América do Norte e na China.
No entanto, a UE e os EUA estão discutindo um mecanismo de compensação que permitiria que montadoras europeias com fábricas nos EUA exportassem um certo volume isento de tarifas, segundo fontes. Isso beneficiaria empresas como BMW, Mercedes e a marca Volkswagen AG.
Já Porsche e Ferrari, que não possuem fábricas nos EUA e importam todos os seus veículos da Europa, ficariam de fora.
A Audi, da Volkswagen, está atualmente avaliando a possibilidade de iniciar produção nos EUA, e em maio anunciou que escolherá um local ainda este ano. Seu modelo mais vendido nos EUA, o SUV Q5, é importado do México. As vendas do modelo caíram 29% no segundo trimestre.
A Mercedes transferirá a produção do SUV GLC — seu modelo mais popular nos EUA — para sua fábrica no Alabama até 2027.
O chanceler alemão Friedrich Merz apoiou no mês passado a ideia de uma regra de compensação para aliviar tarifas sobre algumas montadoras europeias. Mas as negociações se tornaram mais urgentes desde então.
— Queremos um acordo com os americanos — disse o ministro das Finanças da Alemanha, Lars Klingbeil, a parlamentares em Berlim nesta terça-feira. — Mas o acordo precisa ser justo — e, se não conseguirmos alcançar um acordo justo com os EUA, a UE terá que adotar contramedidas para proteger nossa economia.

