Energia solar: hora de acelerar o potencial brasileiro
Com crescimento expressivo e destaque global, setor solar no Brasil esbarra em tributos altos, entraves regulatórios e falta de crédito. Segmento reivindica linhas de crédito com juros mais baixos e menos burocracia
A transição energética deixou de ser uma tendência para se consolidar como uma urgência global. Em meio às metas climáticas e à crescente pressão por soluções sustentáveis, a energia solar desponta como uma das principais apostas para diversificar a matriz energética, reduzir emissões de carbono e democratizar o acesso à eletricidade.
No cenário mundial, o crescimento é expressivo: segundo o relatório Global Market Outlook for Solar Power 2025-2029, divulgado pela SolarPower Europe, a energia solar manteve-se como a fonte renovável de crescimento mais rápido do planeta pelo vigésimo ano consecutivo, atingindo 2,2 terawatts (TW) de capacidade instalada até o final de 2024.
O Brasil, que historicamente já conta com uma matriz limpa por conta das hidrelétricas, vem consolidando sua posição de destaque no setor solar. Em 2024, o país adicionou 18,9 GW de potência fotovoltaica, um crescimento de 21% em relação ao ano anterior.
Com isso, passou a ocupar a quarta posição no ranking mundial da SolarPower Europe - atrás apenas da China, Estados Unidos e Índia - e se igualou à Alemanha no mercado global, representando 3% do total.
Os dados impressionam: só no primeiro semestre de 2025, o Brasil acrescentou 5,25 GW à sua capacidade instalada, sendo 4,5 GW em geração distribuída - que inclui sistemas instalados em telhados de residências e comércios - e 738 MW em geração centralizada, formada por grandes usinas solares.
Com o avanço, a fonte solar chegou a 58,9 GW de potência, consolidando-se como a segunda maior da matriz elétrica brasileira, com 23% de participação, atrás apenas das hidrelétricas.
Entraves
Apesar do crescimento, há um alerta para riscos de desaceleração. Para Luzer Oliveira, coordenador estadual da Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica (Absolar) em Pernambuco, o avanço da energia solar no Brasil é resultado de um cenário favorável que, aos poucos, começa a ser ameaçado por entraves internos.
“A energia solar é inevitável no Brasil. Temos um dos melhores níveis de radiação solar do mundo. Hoje, quem tem telhado e não tem energia solar está perdendo uma oportunidade de economizar, de produzir sua própria energia e de ajudar o planeta”, afirma.
Luzer Oliveira, coordenador estadual da Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica (Absolar) em Pernambuco | Foto: DivulgaçãoSegundo ele, o marco regulatório de 2012 e os incentivos fiscais dos anos seguintes, como a isenção de impostos para importação de painéis solares, impulsionaram o mercado.
“Com o tempo, a demanda cresceu, os preços caíram, empresas se multiplicaram e a tecnologia se popularizou. Entre 2022 e início de 2023, houve queda de mais de 30% nos preços dos equipamentos, o que ajudou a acelerar novas instalações”, explica.
No entanto, o cenário mudou. O fim de incentivos, o aumento nos custos e a tributação elevada colocaram um freio no setor. “Em 2023, a curva começou a desacelerar. O preço atingiu um mínimo e depois voltou a subir. Hoje, temos o imposto de importação do painel solar em 25%, o que é uma penalização enorme, principalmente porque o Brasil não tem produção suficiente para atender a demanda”, aponta Oliveira.
Ele critica a ausência de políticas públicas que facilitem o acesso ao crédito e fomentem o financiamento de sistemas solares. Segundo o coordenador, cerca de metade dos projetos não avança porque os bancos não aprovam as propostas.
“O financiamento hoje depende quase exclusivamente de bancos privados, que não têm nenhum incentivo. Deveria haver mais estímulo, linhas de crédito com juros mais baixos e menos burocracia”, defende Luzer.
Outro ponto são as barreiras impostas pelas concessionárias de energia. Segundo ele, empresas distribuidoras vêm dificultando novas conexões. “Em muitos casos, os integradores têm que acionar a Justiça. É um custo desnecessário. Aqui no estado [Pernambuco], estamos pedindo aos órgãos competentes a criação de um portal de transparência, que permita ao consumidor acompanhar seus créditos, o protocolo de acesso e a fila de espera.”
Investimento
Apesar das dificuldades, o setor segue sendo vantajoso sustentavelmente e economicamente. Segundo Oliveira, o retorno do investimento segue atrativo. “Em 2012, o payback (tempo de retorno) era de 10 anos. Hoje está entre três e quatro anos. Mesmo que vá para seis, ainda vale a pena, porque o sistema dura mais de 20 anos”, acrescenta Oliveira.
O impacto na geração de empregos também é expressivo. “Precisamos de mão de obra técnica e comercial. Em Minas Gerais, quando o mercado esfriou, cerca de 2.000 pessoas ficaram desempregadas. Já São Paulo avançou com força, impulsionado até por apagões mais recentes”, afirma.
Modelos como a energia por assinatura, em que o consumidor aluga parte de uma usina e recebe desconto na conta, sem instalar equipamentos, também ganham espaço. Mas, para Oliveira, a geração no próprio telhado ainda é o melhor cenário.
Olhando para o futuro, ele aposta na inovação com baterias solares. “Uma indústria pode substituir geradores a diesel por baterias solares. Nas residências, com redução de impostos, o mercado pode explodir. A Europa já vive esse movimento. O Brasil pode ser um hub global de energia limpa, até para atrair data centers. Podemos ser o Vale do Silício da energia verde”, dispara.
Mundo
No cenário internacional, o mundo continua acelerando. Em 2024, ainda segundo o relatório da SolarPower Europe, foram instalados 597 GW de energia solar - um aumento de 33% em relação a 2023.
A energia solar representava, no fim do ano, 46% da capacidade renovável global. A previsão é que, até 2030, o mundo atinja mais de 7 TW em capacidade instalada, o que representaria cerca de 65% da energia renovável necessária para cumprir as metas climáticas globais.
China, Índia e Estados Unidos lideram esse movimento. A China, sozinha, adicionou 329 GW em 2024, o equivalente a 55% de toda a capacidade solar instalada no planeta naquele ano.
Nesse contexto, o Brasil tem a oportunidade de ser protagonista. Mas, como reforça Luzer Oliveira, isso depende de muitos fatores. Para ele, a COP30, que será realizada em novembro em Belém (PA), precisa enviar uma mensagem clara ao Brasil: “Não podemos penalizar quem quer produzir sua própria energia. Os incentivos devem estar nos impostos e na compensação de créditos”, completa.


