"Temos uma matriz energética majoritariamente renovável"
Ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, defende a tese que nações industrializadas cumpram seus compromissos de investir em emissões de baixo carbono
O governo federal tem se mostrado ativo na transição energética do Brasil, implementando políticas e buscando investimentos. Em 2024, o país se consolidou como o sétimo maior destino global de investimentos em transição energética, com US$ 37 bilhões captados, um crescimento pelo terceiro ano consecutivo e que mostra seu potencial em soluções verdes, impulsionado por energia solar, eólica e veículos elétricos.
O ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, tem um papel relevante nesse cenário, enfatizando o potencial do Brasil em energias limpas e tem buscado parcerias internacionais para o desenvolvimento sustentável. Também tem apresentado o Brasil a outras nações como um ambiente favorável para projetos de transição energética, destacando o arcabouço legal para investimentos em hidrogênio, energia eólica offshore e combustíveis do futuro.
O ministro defende que nações industrializadas cumpram seus compromissos de investir em emissões de baixo carbono. Nesta entrevista exclusiva à Folha Energia, Silveira fala, entre outros temas, sobre o papel do Nordeste na transição energética brasileira, a COP30, que será realizada em novembro, em Belém (PA), os investimentos que o Brasil está fazendo em transição energética e sobre as prioridades até o final da gestão dele.
Nesses quase três anos do governo Lula, que avanços o senhor pontuaria no que diz respeito à transição energética brasileira?
Foram muitos os avanços. Neste período, fortalecemos a posição do Brasil na liderança da transição energética global, com uma matriz majoritariamente renovável e políticas consistentes de descarbonização. Entre os principais avanços, estão a aprovação da Lei do Combustível do Futuro e a criação do marco legal para o hidrogênio de baixa emissão, com foco na atração de investimentos e geração de empregos. Também conseguimos avançar na universalização do acesso à energia, com o relançamento do programa Luz Para Todos, ampliando a tarifa social, e a criação do Energias da Amazônia, voltado à substituição do diesel por fontes renováveis em áreas remotas. Na infraestrutura, tivemos a execução do maior plano de expansão da transmissão do país, essencial para conectar novas cargas estratégicas. O governo também fortaleceu as ações para garantir justiça tarifária, reduzindo encargos e promovendo inclusão energética para os mais vulneráveis. O Luz do Povo é o principal exemplo disso.
Quais são as prioridades até o final da sua gestão no que diz respeito à transição energética?
A principal prioridade é regulamentar as leis estruturantes aprovadas recentemente, transformando-as em políticas públicas com segurança jurídica e previsibilidade para atrair cada vez mais investimentos. Nesse sentido, já temos avanços significativos, como a definição de novas misturas de biocombustíveis - 30% de etanol na gasolina e 15% de biodiesel no diesel -, fortalecendo o papel das renováveis na matriz energética. Tudo isso graças à Lei do Combustível do Futuro que aprovamos. O foco atual está na edição de normas que viabilizem pontos centrais dessa Lei, como o SAF, a captura e estocagem de carbono e o fortalecimento dos mercados de biogás e biometano. Em novembro, o mundo inteiro estará com os olhos voltados para o Brasil por conta da COP30, que será realizada em Belém (PA).
O que o MME está preparando para apresentar aos outros países no evento?
Chegaremos à COP 30 como uma potência energética que lidera com responsabilidade e oferece soluções reais para uma transição justa e segura. Não me canso de repetir: temos uma matriz energética majoritariamente renovável e, aliado a isso, uma regulação madura, instituições sólidas e um ambiente seguro para investimentos. Essa combinação de ambição climática, capacidade técnica e governança eficiente tem garantido protagonismo na transição energética, com forte participação do setor privado. Neste ano, o Brasil já alcançou resultados que muitos países projetam para 2050. Nossos representantes também levarão à conferência a mensagem de que a transição energética deve ser centrada nas pessoas - com foco em acesso à energia, tecnologias limpas e combate à pobreza energética.
O senhor foi um dos primeiros defensores da implementação do E30 (mistura de etanol anidro na gasolina de 27% para 30%), que entrou em vigor em agosto. Quais as vantagens do E30 no que diz respeito à economia e à sustentabilidade?
Com o E30, voltaremos a ser autossuficientes em gasolina após 15 anos. Isso significa que o Brasil deixa de depender de importações, o que fortalece a nossa segurança energética e rompe com a lógica do PPI, que penalizava o consumidor brasileiro. Agora, o governo federal estabeleceu todas as condições para reduzirmos o preço da gasolina na bomba, com impacto direto no bolso da população. Estimativas indicam uma queda de até 20 centavos por litro, o que também ajuda no controle da inflação. Além disso, o E30 tem um papel crucial na agenda ambiental. Vamos evitar a emissão de 1,7 milhão de toneladas de gases de efeito estufa por ano - o equivalente a tirar 720 mil carros de circulação. Isso mostra, mais uma vez, que é possível aliar crescimento econômico com responsabilidade ambiental. Também projetamos R$ 10 bilhões em investimentos com esta medida.
Qual a previsão de investimentos na transição energética brasileira?
Temos estimativas no MME de que, até 2030, o país poderá mobilizar cerca de R$ 1 trilhão em investimentos relacionados à transição energética. Esse volume engloba setores como renováveis, mobilidade de baixo carbono, eficiência energética, transmissão de energia e tecnologias inovadoras. Também inclui projetos minerais que serão essenciais para viabilizar cadeias produtivas estratégicas da nova economia verde. Esse cenário positivo é resultado direto da consistência regulatória construída nos últimos anos.
Como o senhor avalia o papel do Nordeste em relação às outras regiões do país no que diz respeito à transição energética?
O Nordeste, sem dúvida, tem um protagonismo que é único neste processo de transição energética pelos recursos naturais abundantes, que favorecem a produção eólica e fotovoltaica, levando energia limpa e renovável a outras regiões do país. Conforme dados do Sistema de Informações de Geração (SIGA) e do painel de Geração Distribuída da Aneel, a região detém 92,9% da capacidade instalada eólica, 51,2% da solar fotovoltaica centralizada e 21,6% da solar fotovoltaica na geração distribuída, consolidando-se como um importante polo gerador e exportador de energia limpa. Não apenas pelas fontes eólica, solar e hidrelétrica, mas também pelo grande potencial para a produção de hidrogênio de baixa emissão de carbono, podendo atrair indústrias que buscam descarbonização com energia limpa e hidrogênio. Ou seja, uma região extremamente importante para o nosso país.
Durante uma missão oficial à China em maio, ao lado do presidente Lula, o senhor participou da assinatura de um memorando de entendimento entre o MME, a estatal chinesa Windey Energy Technology Group e o Senai Cimatec. Poderia dar mais detalhes sobre esse memorando e como funciona essa parceria?
Quando falamos em expansão da geração de energias renováveis também falamos sobre como podemos melhor aproveitar essas importantes fontes para o processo da transição energética e, principalmente, para o benefício da população. Nesse sentido, assinamos, na viagem à China, esse memorando de entendimento, que traz, entre outros pontos, uma parceria tecnológica voltada ao armazenamento de energia no país. Uma proposta que vai promover soluções para estabilização do nosso sistema interligado nacional, permitindo um melhor e maior aproveitamento das renováveis no país, mitigando cortes na geração renovável conectada à rede elétrica. O memorando também prevê a criação de um centro de pesquisa e desenvolvimento no Brasil voltado ao avanço de soluções em energia eólica e hidrogênio verde, e iniciativas para levar energia limpa a áreas agrícolas remotas
Vistos os últimos avanços na regulamentação da energia eólica offshore no Brasil e o crescente interesse internacional, quais são as perspectivas do MME para ampliar parcerias com outros países nesse setor, e como essas cooperações podem impulsionar o desenvolvimento tecnológico e a atração de investimentos para os projetos eólicos?
Esse é um processo que envolve uma abordagem que combine elementos técnicos e jurídicos e que deve observar o alinhamento às melhores práticas internacionais, a fim de estruturar um marco regulatório sólido, capaz de oferecer confiança ao setor público e privado. Para que essa construção seja participativa e contemple todos os segmentos envolvidos, foi instituído um Grupo de Trabalho com representantes de diversos ministérios, agências reguladoras e instituições públicas para definição da regulamentação infralegal, incluindo o mapeamento dos normativos necessários, a metodologia de identificação das áreas para oferta aos empreendimentos, estabelecimento do fluxo para emissão das Declarações de Interferência Prévia (DIPs) e o plano para implantação do Portal Único para Gestão do Uso de Áreas Offshore para Geração de Energia (PUG-Offshore). Também estão em elaboração importantes diretrizes interministeriais que alinham as políticas públicas e as competências institucionais no processo.
Para terminar, ministro, o senhor recebeu, este ano, em Brasília, a Grã-Cruz da Ordem do Mérito da Defesa (maior grau da honraria concedida pelo Ministério da Defesa), das mãos do ministro José Mucio. Como foi para o senhor ser agraciado com essa honraria?
Como servidor público da área da segurança no meu estado, Minas Gerais, fiquei muito honrado com a medalha. Conheço muito bem a importância do reconhecimento e do fortalecimento das Forças de Segurança e da Defesa Nacional. E agora, no Ministério de Minas e Energia, essa homenagem reforça a importância estratégica destes setores na defesa da soberania nacional. A energia e os minerais críticos são grandes ativos para o desenvolvimento e a segurança do nosso país.

