Sáb, 06 de Dezembro

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Israel realiza nova onda de ataques em várias cidades iranianas

Até agora, mais de 300 pessoas ficaram feridas e quase 80 morreram em Teerã; entre os mortos estão três dos principais chefes militares do país

Explosões em Natanz, após Israel anunciar ter realizado ataques a instalações nucleares e militares iranianas na República Islâmica Explosões em Natanz, após Israel anunciar ter realizado ataques a instalações nucleares e militares iranianas na República Islâmica  - Foto: AFP

Forças Armadas israelenses conduzem uma nova onda de ataque em pelo menos três cidades nesta sexta-feira, horas depois de uma série de ataques lançados entre a noite de quinta-feira e a madrugada. Até agora mais de 300 pessoas ficaram feridas e quase 80 morreram, dentre elas três dos principais chefes militares do país. O Exército de Israel afirmou que a operação tinha por objetivo eliminar a ameaça nuclear do Irã, considerada uma ameaça existencial ao país. Teerã, por sua vez, considerou a ofensiva um ato de guerra.

Entre os mortos na operação israelense estão o general Mohammad Bagheri, então chefe do Estado-Maior das Forças Armadas do Irã, e o general Hossein Salami, comandante da Guarda Revolucionária Islâmica — uma força de elite dentro da estrutura militar iraniana. A liderança iraniana não havia se pronunciado oficialmente sobre as mortes, quando Khamenei nomeou substitutos.

O Estado-Maior passa a ser comandado pelo general Abdolrahim Mousavi, que era comandante do Exército, enquanto a Guarda Revolucionária será chefiada por Mohammad Pakpour, que liderava as forças terrestres do mesmo braço armado.

 

— Gostaria de assegurar ao nosso querido povo que a bandeira que meus companheiros martirizados agitavam em suas mãos jamais cairá no chão — disse Mousavi em uma primeira declaração após a nomeação, segundo publicação da agência iraniana Mehr. — As Forças Armadas foram incumbidas pelo comandante-chefe de todas as Forças Armadas [líder supremo] de punir severamente os perpetradores, agentes e apoiadores desta agressão, e o sangue dos mártires não será derramado em vão, se Deus quiser.

Moradores de Teerã enfrentaram uma noite de terror e choque, cambaleando com as explosões em toda a capital iraniana e com a notícia de que altos comandantes militares, bases nucleares e bases militares de segurança máxima haviam sido atacados por 200 caças israelenses. O Irã não era atacado por um inimigo estrangeiro com tamanha força desde 1989, quando o país estava em guerra com o Iraque.

A capital amanheceu vazia, a não ser pelas longas filas que se formavam em postos de gasolina e supermercados — um indicativo de que os iranianos se preparam para tempos incertos. A TV estatal iraniana denunciou que edifícios residenciais foram atingidos e que "várias pessoas" morreram, incluindo mulheres e crianças. Horas mais tarde, indicou que 50 civis ficaram feridos nos ataques, sem mencionar um número de mortos.

Em um comunicado lido na televisão estatal, Khamenei disse que Israel deveria se preparar para uma punição severa, afirmando que "a mão forte da República Islâmica não os deixará escapar" após o ataque. Cerca de 100 drones foram disparados pelos iranianos contra Israel a partir de seu território, a fim de uma primeira onde de represália. Tanto Israel quanto a Jordânia disseram ter abatido parte dos dispositivos ingressarem em seus respectivos espaços aéreos.

Khamenei acrescentou que outros comandantes militares de alto escalão, além de cientistas ligados ao programa nuclear do país — a imprensa estatal citou seis cientistas — foram mortos em ataques que incluíram alvos residenciais.

— O regime sionista, com este crime, criou um destino sombrio e doloroso para si mesmo, e certamente o receberá — disse.

O ataque israelense aconteceu em meio a um momento de impasse na negociação de um acordo nuclear entre Irã e Estados Unidos, que o presidente americano, Donald Trump, tentou impor a Teerã. Em uma declaração nesta sexta-feira, o republicano afirmou que havia alertado os iranianos sobre as possíveis implicações de não aderir ao acordo — que pretende arrancar um compromisso de que o país não vai nunca ter armas nucleares.

"Dei ao Irã chance após chance para fazer um acordo”, escreveu Trump na rede social Truth Social. “Disse a eles, com todas as letras: 'apenas façam'. Mas, por mais que tenham tentado, por mais perto que tenham chegado, simplesmente não conseguiram concluir nada".

Segundo Trump, o Irã ignorou os alertas de que os EUA fabricam "o melhor e mais letal equipamento militar do mundo", e que Israel “tem muitos desses equipamentos, e sabe como usá-lo". Ele concluiu dizendo que Teerã precisa fechar o acordo "antes que não sobre mais nada" e salvar "o que um dia foi conhecido como o Império Iraniano".

Embora os EUA digam não ter tido participação no ataque, Trump convocou seu conselho nacional de segurança. O país disse que não estar implicado no ataque, e o secretário de Estado Marco Rubio advertiu que a nação persa não deve atacar bases americanas no Oriente Médio. Teerã diz que Washington será "responsável pelas consequências", e que a operação israelense "não poderia ter ocorrido sem a coordenação e autorização dos EUA.

O chanceler iraniano, Abbas Araqchi, afirmou que o ataque israelense correspondia a uma "declaração de guerra" em uma mensagem à ONU, em que pediu atuação do Conselho de Segurança. Parte da comunidade internacional condenou a ofensiva e pediu contenção.

O Secretário-Geral da ONU, António Guterres, pediu "máxima contenção" de todas as partes após os ataques, assim como a principal diplomata da União Europeia, Kaja Kallas. A Rússia expressou "preocupação" com os ataques israelenses e denunciou a "súbita escalada de tensões".

A Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) afirmou que instalações nucleares "jamais devem ser atacadas", chamando o incidente de "profundamente preocupante". A agência confirmou que a instalação de Natanz foi atingida pelo ataque, embora tenha declarado não ter observado um aumento nos níveis de radiação na área.

Mesmo em Israel, vozes críticas surgiram em torno da operação. "O Irã não esquecerá o conhecimento nuclear que adquiriu ao longo de décadas de desenvolvimento só porque uma instalação ou outra foi atacada. Além disso, Israel não pode garantir que uma ação militar – por mais ousada e sofisticada que seja – impediria o Irã de continuar no caminho nuclear. No entanto, tal ataque definitivamente colocaria a retaguarda israelense em risco de sérios danos novamente", escreveu o jornal israelense Haaretz em editorial publicado nesta sexta.

"A guerra que já dura 20 meses na Faixa de Gaza já demonstrou mais uma vez como é difícil pôr fim a guerras ou alcançar a 'vitória total', como Netanyahu prometeu. A pressão militar por si só não produzirá segurança nem vitória", acrescenta o texto.

Mudança de estratégia
Khamenei fez da prevenção da guerra uma parte central de seu legado, levando o país à beira do conflito diversas vezes, incluindo duas vezes com Israel no ano passado, mas evitando uma guerra total e direta. Esse cálculo pareceu ter chegado ao fim na noite de quinta-feira, quando autoridades iranianas declararam abertamente que o país estava se preparando para um conflito.

Quatro autoridades iranianas disseram que Israel atacou pelo menos uma dezena de bases militares, depósitos de mísseis e centrais nucleares e de mísseis em várias cidades do Irã, incluindo Teerã, Tabriz, Isfahan, Kermanshah e Arak. A usina nuclear de Natanz também foi severamente danificada, segundo a televisão estatal, e os danos se estenderam a uma importante rodovia que liga Teerã a Isfahan.

— Infelizmente, eles fizeram o que não esperávamos que fariam — disse Mehdi Rahmati, analista político conservador em Teerã, próximo ao governo, em entrevista após os ataques. — O Irã responderá com muita seriedade, visando infligir destruição. Prevemos um período de ataques de pingue-pongue que podem se espalhar para a região.

Além dos comandantes militares, Ali Shamkhani, um ex-comandante sênior da Marinha, um dos políticos mais influentes do Irã e confidente próximo de Khamenei, também foi morto após sofrer ferimentos graves em um ataque ao seu apartamento de cobertura em uma torre residencial de luxo no norte de Teerã, de acordo com três altos funcionários e relatos da mídia iraniana.

Acredita-se que pelo menos três outras figuras importantes do Irã tenham sido mortas, segundo a mídia estatal iraniana. Trata-se do general Gholamali Rashid, um alto líder das Forças Armadas iranianas; Mohammad Mehdi Tehranji, um físico iraniano; e Fereydoun Abbasi, um cientista nuclear iraniano.

Shamkhani, ex-secretário do Conselho Nacional Supremo, supervisionava as negociações nucleares com os Estados Unidos como parte de um comitê nomeado por Khamenei para dirigir as negociações. Matá-lo, disseram autoridades, seria prejudicar os esforços da diplomacia nuclear.

'Nação dos Leões'
O primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, e o Exército israelense afirmaram que o ataque contra o Irã se tratava de uma ação preventiva contra a ameaça nuclear representada pelo país persa. De acordo com as fontes israelenses, Teerã estaria obstinado a desenvolver armas nucleares e já havia ultrapassado o ponto de "não retorno" no enriquecimento de urânio e desenvolvimento de seu programa.

— Não podemos deixar essas ameaças para a próxima geração. Porque se não agirmos agora, não haverá outra geração. Se não agirmos agora, simplesmente não estaremos aqui — disse Netanyahu, que declarou "estado de emergência" em Israel após lançar o ataque. — Internalizamos as lições da História. Quando um inimigo diz que pretende destruir você, acredite nele. Quando o inimigo desenvolve a capacidade de destruir você, detenha-o.

Israel tem um histórico de assassinatos bem-sucedidos de autoridades de segurança e cientistas nucleares iranianos. Mas, em geral, os tem eliminado um a um em operações secretas, como parte de sua longa guerra secreta com o Irã, Líbano e Síria.

Os ataques na manhã desta sexta-feira foram uma escalada impressionante dessa tática. Não apenas atingiram o programa nuclear e as defesas aéreas do Irã, como também eliminaram de uma só vez os principais comandantes militares, atingindo suas residências, incluindo algumas em complexos militares de segurança. Em algumas áreas da capital, Teerã, prédios de apartamentos inteiros desabaram. (Com AFP e NYT)

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