35 doses de rum
Quando contava com pouco mais de vinte anos, tinha alguns companheiros de copo. A bebida mais comum era a cerveja ou o chope.
Um deles, AN, substituiu a “loura” por uma bebida muito comum à época, a Cuba Libre – mistura de rum, Coca-Cola, gelo e uma fatia (ou suco) de limão. O refrigerante amenizava o sabor forte do rum. Com o passar do tempo, o grupo se dissolveu, cada um tomou um rumo.
AN (1) se aposentou e continuou a sua caminhada, agora sem rotinas e horários. Dividia o consumo em dois tempos: primeiro, pela manhã até a tarde, com pausa para uma soneca; o segundo, do final da tarde até quando o organismo permitia e tirava mais algumas horas de sono, de domingo a domingo.
Mesmo aposentado, ia visitá-lo com regularidade. Na 1ª casa, guardava mas de 200 garrafas vazias encostadas no muro do quintal. Quando vendeu a casa, construiu, no terreno do irmão, uma quitinete de uns 30 m², com dois pisos: no térreo, espaço para guardar trecos (e garrafas); na parte superior, ambientes de pequenas áreas - varanda, sala, wc, cozinha e dormitório.
Numa das últimas vezes em que estive com ele, estranhei a ausência do refrigerante: ela havia substituído o do rótulo vermelho por soda limonada. Quando questionei a mudança, foi categórico: o refrigerante anterior estava fazendo mal.
A história do rum vem desde o séc. XIV, boa parte associada aos piratas. Numa das bebidas fabricadas no Brasil, um pirata aparecia no rótulo. A bebida é obtida a partir de mel de cana de açúcar ou à base do suco de cana-de-açúcar.
O teor alcoólico do rum (35% a 70%) está próximo das bebidas destiladas mais conhecidas: gim (50%), tequila (35% a 59%), uísque (38% a 54%) e da campeoníssima vodca (até 88%).
Não faço apologia ao consumo de álcool e nem a outras drogas (cigarros, maconha, crack etc.). Todas causam dependência e podem acabar com a vida do usuário e das suas famílias. O título tem a ver com o filme 35 Rhums, da diretora francesa Claire Denis. Pode não ser uma grande obra, mas ela consegue mostrar habilmente essa miscelânea que a maior parte dos países europeus vive, a partir da aceitação de imigrantes de outros países, vindos de suas terras em busca de uma vida melhor.
Já se sabe que essa migração tinha vários objetivos, inclusive obter mão de obra barata para atividades que os europeus não queriam fazer (condutores de trens, garis, assistentes de cozinha, taxistas etc.). De forma sutil, o filme mostra esses conflitos e diferenças. O porquê do nome? – Não sou estraga-prazeres. Vejam o filme.
(1) Acredito que AN já deve ter partido para outra esfera, que tem bares que servem rum sem os malefícios que os daqui na Terra provocam.
*Executivo do segmento shopping centers
(jcporoca@uol.com.br)
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