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Campanha do Quilo: a tradição brasileira que transformou solidariedade em movimento nacional

A Campanha do Quilo, uma das mais antigas expressões de solidariedade do país, surgiu no Brasil por volta da década de 1930. Inspirada por princípios cristãos e espíritas de caridade, a proposta era simples: pedir um quilo de alimento de porta em porta para ajudar famílias em situação de vulnerabilidade.

A primeira ação documentada ocorreu em 31 de julho de 1938, no Rio de Janeiro, liderada pelo espírita Avelino de Carvalho. Na ocasião, integrantes do Grupo Espírita Amor e Caridade João Batista saíram às ruas para arrecadar alimentos destinados ao Abrigo Nazareno. O gesto, pautado pela compaixão e pelo desejo de amparar os mais necessitados, deu origem a um movimento que se espalhou por todo o país.

Em 1946, a campanha ganhou força em Recife (PE) com o trabalho de Elias Alverne Sobreira, que fundou a primeira Escola Central do Quilo. A iniciativa, inspirada no livro mediúnico O Bom Combate, ditado pelo espírito Bezerra de Menezes, ajudou a estruturar o movimento e a criar Escolas Regionais do Quilo, responsáveis por coordenar ações de arrecadação em diversos estados.

Os voluntários, conhecidos como “Legionários do Quilo”, tornaram-se figuras emblemáticas da solidariedade no Nordeste. Munidos de sacos de padaria, eles percorriam ruas e mercados para recolher doações destinadas a centros espíritas e instituições filantrópicas, que montavam cestas básicas para famílias em situação de pobreza.

Com o tempo, o exemplo se multiplicou e inspirou outras campanhas sociais. Movimentos como a Ação da Cidadania, criada em 1993 pelo sociólogo Betinho, e iniciativas recentes, como a “Vacinação Solidária” promovida por prefeituras durante a pandemia, seguem o mesmo princípio: transformar pequenos gestos individuais em grandes ações coletivas.

Embora tenha raízes no movimento espírita, a arrecadação de alimentos também faz parte da tradição de outras denominações religiosas. As Conferências de São Vicente de Paulo, fundadas pelo francês Frederico Ozanam no século XIX, realizam esse tipo de trabalho há mais de 180 anos. Paróquias católicas e igrejas evangélicas, como a Igreja Batista da Lagoinha Santos, também promovem campanhas semelhantes em prol de suas comunidades.

Hoje, a Campanha do Quilo continua viva em várias partes do Brasil, organizada por instituições religiosas, ONGs e grupos comunitários. Mais do que um ato de doação, ela representa um exercício de empatia e cidadania, lembrando que um quilo de alimento pode significar muito mais do que peso na balança — é o símbolo de uma sociedade mais solidária.

O dia 31 de julho, data da primeira campanha registrada, é lembrado como marco de um gesto coletivo de amor ao próximo, que atravessa gerações e reafirma o poder transformador da solidariedade.
 



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