Recife, uma cidade de cinema
Poucas cidades no Brasil têm uma relação tão profunda com o cinema quanto o Recife. Desde as primeiras décadas do século XX, quando o cinema brasileiro ainda engatinhava, a capital pernambucana já se destacava como um dos polos mais vibrantes de produção audiovisual do país. Em 1920 e 1930, produzia-se mais filmes aqui do que no Rio de Janeiro ou em São Paulo — um fenômeno impulsionado por pioneiros como Gentil Roiz, Ary Severo, JotaSoares, EdsonChagas, entre outros, que viam na sétima arte não apenas entretenimento, mas um espelho da cultura e da identidade do nosso povo.
Esse espírito criativo atravessou o tempo e encontrou nova força nos anos 1990 e início dos anos 2000, com uma geração que reinventou o cinema nacional. Nomes como Lírio Ferreira, Paulo Caldas, Cláudio Assis e Guel Arraes colocaram o Recife novamente no mapa do cinema brasileiro. “Baile Perfumado”, “Amarelo Manga” e “O Auto da Compadecida” resgataram o imaginário nordestino com uma linguagem moderna, irreverente e profundamente autoral, mostrando ao país que o Nordeste podia ser protagonista de suas próprias histórias.
Hoje, o cinema pernambucano vive um novo auge. Em festivais nacionais e internacionais, os filmes recifenses acumulam prêmios e reconhecimento. Diretores como Kleber Mendonça Filho, Gabriel Mascaro, Mariana Brennand, entre tantos outros, são exemplos de uma geração que combina rigor estético e uma conexão genuína com o território e suas pessoas.
É nesse contexto que nasce a Recife Film Commission, um projeto da Secretaria de Desenvolvimento Econômico e da Secretaria de Cultura do Recife que visa antes de mais nada resgatar um caminho histórico ao fomentar o mercado audiovisual por meio da desburocratização, simplificação e incentivo à produção na cidade. O objetivo é claro: transformar o Recife em um ambiente ainda mais acolhedor e competitivo para quem produz cultura, emprego e visibilidade.
Mais do que um instrumento administrativo, a Film Commission é uma política pública estratégica. O audiovisual é um dos setores criativos que mais crescem no mundo, gerando oportunidades, turismo e inovação. Cada filmagem realizada no Recife movimenta a economia local — da hospedagem à alimentação, do transporte à prestação de serviços técnicos. E, ao mesmo tempo, cada obra filmada aqui amplia a presença simbólica da cidade no imaginário global.
Dados mostram que um percentual considerável dos turistas viajam para locais que já viram em séries ou filmes, ou seja, o audiovisual passou a influenciar diretamente a forma como as pessoas se deslocam pelo mundo e nesse cenário moderno colocar Recife no mapa é fundamental.
É inegável que o cinema tem uma relação de amor com as cidades.
Algumas se tornam personagens inseparáveis da câmera — Nova Iorque, por exemplo, foi durante décadas o cenário afetivo do diretor norte-americano Woody Allen. Mas o tempo passou, e filmar naquela metrópole tornou-se caro e burocrático.
Consequência disso foi a transferência das suas produções para Europa, resultando numa de suas fases mais criativas e festejadas - e, ao mesmo tempo, um impulso extraordinário de promoção urbana e desenvolvimento econômico para as cidades que o acolheram.
Londres ganhou uma aura elegante e sombria em “Match Point”.
Barcelona se mostrou vibrante e sensual em “Vicky Cristina Barcelona”.
Paris transformou-se em sonho, nostalgia e poesia em “Meia-Noite em Paris”.
E Roma, com “Para Roma, com Amor”, foi retratada com humor e afeto.
Com a criação da Recife Film Commission, a cidade escolhe o caminho inverso: abrir portas, simplificar processos e acolher produções. Queremos que diretores, produtoras e artistas sintam no Recife o mesmo encanto e a mesma liberdade que Woody Allen encontrou na Europa — e que o mundo, ao ver nossas telas, veja também a beleza, a energia e a diversidade da nossa cidade.
Em outras palavras, Film Commission nasceu para ser mais do que um mero suporte técnico para a cadeia do audiovisual, nasceu para ser um instrumento estratégico para o desenvolvimento da cidade.
Porque Recife é, sempre foi, e se depender da Film Commission, sempre será, uma cidade de cinema.
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