Pentágono não informou Trump sobre decisão de suspender envio de armas à Ucrânia, afirma imprensa
Presidente determinou a retomada das entregas, mas não escondeu seu descontentamento com a falha de coordenação entre a Casa Branca e o Departamento de Defesa
Uma controversa decisão do Pentágono para suspender o envio de algumas armas — já revertida — para a Ucrânia foi tomada sem o aval do presidente dos EUA, Donald Trump, e deixou de lado integrantes de primeiro escalão do governo.
Segundo veículos de imprensa americanos, alguns assessores da Casa Branca ficaram sabendo da medida por terceiros e o mal-estar no Gabinete do republicano ficou evidente em uma reunião na terça-feira.
De acordo com a agência Associated Press, citando três membros do governo, Trump sentiu que o Pentágono não coordenou de maneira adequada com a Casa Branca uma decisão que impacta diretamente os esforços de guerra ucranianos — uma das fontes revelou que o presidente foi literalmente pego de surpresa pela suspensão.
À rede CNN, integrantes do governo disseram que o enviado especial dos EUA para a Ucrânia, Keith Kellogg, e o secretário de Estado, Marco Rubio, ficaram sabendo da decisão pela imprensa, e não pelos canais usuais e sigilosos dentro do governo.
Em comunicado à emissora, um porta-voz do Pentágono disse que o secretário de Defesa, Pete Hegseth, “forneceu uma estrutura para o presidente avaliar os envios de ajuda militar e os estoques existentes", e que “esse esforço foi coordenado por todo o governo”.
Na reunião de Gabinete na terça-feira, quando anunciou a retomada do envio das armas, Trump disse que os ucranianos “precisam ser capazes de se defender”, mas não escondeu a insatisfação com o impasse interno quando perguntado quem foi o responsável pela decisão de barrar parte da ajuda militar.
— Não sei. Por que você não me diz?
Anunciada na semana passada e recebida com espanto na Ucrânia e também em Washington, a suspensão envolvia dezenas de interceptadores do sistema de defesa aérea Patriot, munições de artilharia, mísseis de ataque Hellfire e guiados por precisão, além de mísseis portáteis Singer e lançadores de granada. Armamentos cruciais para apoiar as forças ucranianas no momento em que a Rússia parece agredir com mais força o país por terra e por ar.
Na ocasião, revelou a rede NBC, Hegseth alegou que os estoques de armamentos dos EUA estavam em níveis perigosamente baixos, e determinou a suspensão por conta própria para não ameaçar a própria capacidade militar americana. Contudo, uma análise interna, citada pela NBC, apontou que, apesar da quantidade de determinados armamentos estar mais baixa do que o usual, ainda não havia motivo para alerta, e que o envio das armas a Kiev não afetaria a prontidão militar do país.
Inicialmente, a Casa Branca pareceu apoiar a suspensão, mas nos bastidores assessores de Trump exigiram a retomada de alguns dos envios, enquanto prometeram “blindar temporariamente”, como citou a rede CNN, Hegseth da pressão do Congresso, que também não foi informado.
— O Congresso ficaria feliz em trabalhar com o Departamento de Defesa se fossem apresentadas evidências confiáveis de que os estoques do Pentágono estavam criticamente escassos, exigindo que tomassem medidas unilaterais como fizeram na semana passada — disse um integrante do governo à CNN. — Mas não houve nenhuma nova solicitação urgente do Departamento de Defesa apresentada ao Congresso para nenhuma dessas munições.
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O ruído entre a Casa Branca e o Departamento de Defesa ocorre no momento em que Trump parece cada vez mais inquieto com a falta de perspectivas sobre um cessar-fogo para a Ucrânia, e sem a mesma paciência com o líder russo, Vladimir Putin.
Na terça-feira, Trump destinou algumas palavras duras a Putin.
— Putin nos diz muita besteira, se você quer saber a verdade. Ele é muito legal conosco o tempo todo, mas acaba não tendo importância — disse. —Putin não trata bem as pessoas. Ele mata gente demais. Então, enviamos algumas armas defensivas; eu aprovei.
Na semana passada, após um telefonema a Putin, ele também expressou sua frustração com a resistência do presidente russo a um acordo de cessar-fogo imediato, sem condições prévias e válido por 30 dias, ao mesmo tempo em que a Rússia realiza bombardeios intensos contra os ucranianos.
E aos poucos parece ceder à ideia de adotar sanções mais duras contra Moscou, uma demanda de longa data de seus parceiros europeus na Otan — na terça, ele disse estar olhando de maneira “muito séria” um projeto de medidas econômicas contra Moscou em tramitação no Senado americano.
Segundo o Wall Street Journal, Trump considera enviar mais um sistema de defesa aérea Patriot para Kiev, no que seria a primeira medida do tipo desde que tomou posse, em janeiro. Hoje, a Ucrânia opera três sistemas fornecidos pelos EUA, três pela Alemanha e mais um oferecido por um consórcio de países europeus, mas nem todos operam ao mesmo tempo por questões logísticas e de manutenção.
— Desta vez, o presidente precisará rejeitar os apelos dos isolacionistas e moderadores dentro de seu governo para limitar essas entregas a armas defensivas — disse o senador republicano Mitch McConnell, citado pela Associated Press. —E ele deve desconsiderar aqueles no Departamento de Defesa que invocam a escassez de munições para bloquear a ajuda, enquanto se recusam a investir seriamente na expansão da produção de munições.

