Regras em bailes do CV vão do 'acautelamento' de fuzis à nova punição a quem briga, mostra denúncia
Facção estipula orientações através de comunicados em aplicativo de mensagem
Uma prática comum em casas noturnas é a proibição do porte de armas. Em alguns casos, policiais que frequentam esses estabelecimentos passam pelo acautelamento do equipamento. Mas, dentro do Complexo da Penha, o Comando Vermelho (CV) segue prática parecida em seus bailes, conforme um comunicado emitido por Washington Cesar Braga da Silva, o Grandão, apelidado também como Síndico da Penha, justamente pelas funções de gestor que exerce no conjunto de favelas da Zona Norte do Rio.
O trecho foi extraído dos relatórios da Delegacia de Repressão a Entorpecentes (DRE) e do Ministério Público do Rio de Janeiro (MPRJ), que basearam a megaoperação da última terça-feira, que deixou mais de 120 mortos, e que mostram ainda outras regras locais.
O MPRJ descreve que Grandão "emite comunicados sobre normas de comportamentos em atividades recreativas nas comunidades com e participação de traficantes da localidade". Um dos exemplos usados foi retirado do relatório da DRE, numa mensagem que o traficante — apontado como homem de confiança de Edgar Alves Andrade, o Doca ou Urso, chefe do Complexo da Penha — enviou em novembro de 2023 em um grupo de WhatsApp, meio usado para enviar comunicados e regras.
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"Fica proibido no evento: a entrada de qualquer amigo de fuzil, responsável de firma, dono, gerente, segurança, vapor, seja o que for, está proibida a entrada de fuzil no campo. O armamento fica fora do campo", diz trecho do comunicado sobre bailes na Penha, que aponta ainda que "não será tolerado nenhum tipo de transtorno". A justificativa para isso, de acordo com o texto de Grandão, é que "o evento é pro morador".
No evento, também foi proibida a entrada de bebidas alcoólicas, como uísque, cerveja, energético ou vinho, por exemplo. O aviso vem acompanhado de um alerta: "Sem macete de colocar bebidas em mochila, malandro demais se atrapalha".
Outro chefe do CV — neste caso, gerente do tráfico na Gardênia Azul, Zona Sudoeste do Rio, região da cidade para a qual a facção avançou — é Juan Breno Malta Ramos, o BMW, é aquele responsável pelas punições aplicadas. De acordo com o relatório da DRE, além de torturas e agressões, foi encontrada uma nova punição a quem briga durante os bailes: enquanto, antes, cabelos de mulheres eram raspados, agora as pessoas-alvo são mergulhadas em banheiras de gelo.
Outro comunicado emitido por Grandão aos homens recrutados pelo CV é que um "amigo" tomou "atitude isolada sem pegar orientação e sem obter comunicação com nossas lideranças e a consequência do ato gerou punição". Com isso, foi proibido qualquer atitude ser tomada sem que Doca ou Pedro Paulo Guedes, o Pedro Bala, fossem comunicados. Doca e Pedro Bala integram o "primeiro escalão" do CV na Penha, conforme aponta o MPRJ.
Entre as regras estipuladas pela facção, há ainda a de proibição de se entrar armado na casa de Doca, apelidada de Toca do Urso. O comunicado foi enviado por Gadernal, apelido de Carlos Costa Neves, outro homem de confiança de Doca, em 2023.

