Suprema Corte indica que manterá veto a Trump sobre cidadania por nascimento
Tentativa da administração Trump é negar o direito aos filhos de migrantes em situação irregular ou sob status de residência temporária
A Suprema Corte americana debateu nesta quinta-feira as queixas do governo de Donald Trump de que juízes federais excederam sua autoridade ao bloquear temporariamente algumas de suas medidas políticas em todo o país, incluindo a polêmica ordem executiva — emitida em seu primeiro dia no cargo — que aboliria a cidadania por direito de nascimento nos Estados Unidos.
Uma decisão só deve ser conhecida em meados de junho, mas, segundo a imprensa americana, os juízes da Corte parecem determinados a manter os bloqueios, embora indiquem intenção de restringir o alcance nacional das liminares emitidas por instâncias inferiores.
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A tentativa da administração Trump é negar o direito aos filhos de migrantes em situação irregular ou sob status de residência temporária, como asilo ou vistos. Entretanto, o princípio da cidadania por direito de nascimento está consagrado na 14ª Emenda da Constituição americana, em vigor há mais de 150 anos e que determina que qualquer pessoa nascida no país é cidadã.
Pouco depois de assinar a ordem executiva em 20 de janeiro, estados governados por democratas, junto a organizações de defesa dos imigrantes, moveram diversas ações judiciais para derrubá-la. Juízes federais em Maryland, Massachusetts e Washington agiram rapidamente, considerando a medida inconstitucional e suspendendo sua aplicação em todo o território nacional.
Em resposta, o governo então apelou aos juízes da Suprema Corte que considerassem a legalidade dessas liminares, marcando a primeira vez em que uma disputa legal sobre uma ordem do presidente sobre o assunto chegou à máxima instância do Judiciário no país.
Durante a audiência, a juíza Elena Kagan pareceu articular as opiniões de vários de seus colegas da Corte quando disse que, embora muitos deles tivessem "expressado frustração" sobre a maneira como os tribunais inferiores estavam "fazendo seu trabalho", o caso diante deles era "muito diferente" do caso típico.
— Os tribunais emitiram 40 liminares universais contra o governo federal — argumentou o assessor jurídico do governo, John Sauer, que defendeu Trump na audiência. — Liminares universais excedem a autoridade judicial (...) e perturbam o delicado equilíbrio constitucional da separação de poderes.
Por sua vez, a juíza Sonia Sotomayor, alertou que limitar as ordens judiciais criaria regras confusas e desiguais pelo país, destacando o risco de algumas crianças "se tornarem apátridas, sem cidadania nos EUA nem nos países de origem dos pais".
Os grupos que contestam o decreto de Trump consideram que a tentativa do governo de limitar a aplicação da decisão dos tribunais inferiores não faz sentido, sobretudo no que se refere à cidadania por nascimento. As liminares "neste caso preservam a uniformidade da cidadania dos EUA" porque o fato de uma criança ser ou não cidadã "não deve depender do estado onde ela nasceu", argumentam.
Se a Suprema Corte decidir a favor do presidente republicano, "um bebê seria um cidadão dos Estados Unidos e um membro pleno da sociedade se nascesse em Nova Jersey, ou um estrangeiro que pode ser expulso se nascesse no Tennessee", citam como exemplo.
Uma série de medidas políticas iniciais de Trump foram bloqueadas nacionalmente por juízes que impuseram liminares amplas semelhantes. Outros presidentes reclamaram das liminares impostas durante seus mandatos, mas nenhum enfrentou tantas em tão pouco tempo.
— O governo Trump ultrapassa repetidamente seus limites, e os tribunais fazem o que os tribunais têm que fazer, que é restringir ilegalidades em um sistema de separação de poderes — explicou à AFP Steven Schwinn, professor de direito constitucional na Universidade de Illinois em Chicago.
Os magistrados provavelmente não emitirão uma decisão até o final de junho ou início de julho, embora a natureza incomum do caso possa levar a uma ação mais rápida, como sinalizado na audiência pelo presidente da Suprema Corte, John Roberts.
'Estamos perdendo direitos'
Trump critica a cidadania por direito de nascença desde seu primeiro mandato, quando chamou o direito constitucional de "francamente ridículo". Em janeiro, assinou o decreto chamando a ação de "um presente inestimável e profundo".
"A cidadania por direito de nascença não foi criada para pessoas que tiram férias para se tornarem cidadãos permanentes dos Estados Unidos da América, levando suas famílias com elas, o tempo todo rindo dos 'OTÁRIOS' que somos", disse Trump nas redes sociais na quinta-feira.
Enquanto o debate acontecia, dezenas de manifestantes se reuniram perto dos degraus da Suprema Corte.
— Este caso afetará não apenas nossas famílias, mas todas as famílias americanas pelas próximas gerações — disse ao NYT Valerie Nguyen, 28, que trabalha com o Viet Place Collective, um grupo local que busca preservar o legado da comunidade vietnamita em Washington e arredores.
Os manifestantes foram acompanhados por membros democratas do Congresso, incluindo a deputada democrata Nancy Pelosi, da Califórnia, ex-presidente da Câmara.
— O atual ocupante da Casa Branca, de tempos em tempos, diz que os Estados Unidos são estúpidos por apoiar a 14ª Emenda — disse Pelosi. — Não, senhor presidente. Os Estados Unidos não são otários. É a Constituição dos Estados Unidos.
Os manifestantes se reuniram porque uma "garantia fundamental da Constituição está sob ataque", disse Ama Frimpong, diretora de serviços jurídicos de um grupo de defesa dos imigrantes, o Casa. O grupo, que também presta serviços para imigrantes de baixa renda, foi o principal organizador do protesto.
— Estamos perdendo direitos todos os dias —disse Jackie Gilbert, 68, que pegou o trem de Baltimore com sua amiga Nancy Newman. — Isso precisa parar.
Tanya Kaplan, 54, membro do By Any Means Necessary, um grupo de defesa de esquerda, viajou de Oakland, Califórnia, para o protesto.
— Estamos dizendo à Suprema Corte: parem de empoderá-lo e autorizá-lo a tentar derrubar nossa Constituição e ser um ditador — disse ela sobre Trump. — Não aceitamos isso. Não aceitamos o racismo e a intolerância.

