"O Brasil é muito maior que Lula e Bolsonaro", afirma Aécio, que volta a comandar o PSDB
Em entrevista ao podcast "Direto de Brasília", o deputado federal Aécio Neves diz que encontra um partido menor do que deixou, mas procura manter o otimismo para fazer a sigla recuperar o espaço que já teve na política nacional
O deputado federal Aécio Neves (MG) reassume a presidência nacional do PSDB, hoje, oito anos após deixar o posto. Ele encontra um partido menor do que deixou, mas procura manter o otimismo para fazer a sigla recuperar o espaço que já teve na política nacional. Em entrevista ao podcast "Direto de Brasília", ele destaca que o PSDB foi “a única legenda que não aderiu ao bolsonarismo e ao lulopetismo”, reflete sobre a auditoria das urnas eletrônicas e critica o ex-presidente João Dória pela derrocada do tucanato.
Muita gente atribui o início dessa polarização entre lulistas e bolsonaristas ao pedido de auditoria às urnas eletrônicas após perder a eleição presidencial de 2014. Em sua visão, aquele gesto foi o ovo da serpente?
O Brasil é o país das narrativas. Essa é uma que começa com o presidente Lula (PT), que contaminou parte de brasileiros bem-intencionados, mas não fica de pé em razão dos fatos. Eu não contestei o resultado. Às 20h15 do dia da eleição, no mesmo instante em que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) comunicou a vitória de Dilma Rousseff (PT), eu telefonei para ela e parabenizei pelo resultado. Essa é uma liturgia que as democracias costumam fazer. Disse que o grande desafio era unir o país, e que eu estava à disposição, porque o Brasil era de todos nós. Como alguém pode contestar o resultado da eleição cumprimentando a vitoriosa?
E o que houve em relação às urnas?
O que houve foi em benefício das urnas. Pedimos uma auditoria para ver se existiria a possibilidade de manipulação. Isso não foi colocado. Mas foi muito depois do processo eleitoral. Falaram que pedi a recontagem de votos, como se fosse possível. Como democrata, não só aceitei o resultado como cumprimentei a presidente, e ali se encerra a questão eleitoral.
Mas essa questão influenciou nos meses seguintes, levando até à queda do governo Dilma...
Depois daquilo houve uma série de processos, inúmeras irregularidades, como os Correios, que estão até hoje quebrados. Mensagens de WhatsApp ilegais disparadas dos Estados Unidos, dizendo que eu iria acabar o Bolsa Família, principalmente no Nordeste. Identificamos lideranças importantes do PT por trás daquilo. Tudo foi alvo de ações na justiça. Queríamos que os crimes cometidos para vencer as eleições fossem apurados. Isso não aconteceu, mas algo pior. O Brasil quebrou. O que fizeram em 2014 para ganhar as eleições fez a Dilma cair em 2016, porque o país paralisou. Tantas loucuras, insanidades, falta de limites para vencer a eleição que ela não conseguiu ficar no cargo. O que não se confunde com contestação do resultado eleitoral.
E qual a sua visão sobre as urnas?
Acredito que são seguras. Não há uma declaração minha dizendo que as urnas poderiam ser fraudadas. Nós contribuímos para superar essa dúvida de parcela da população, fazendo uma auditoria séria. Sei que esse debate ficou interditado pela posição do Bolsonaro. Acredito que poderíamos ter um voto impresso para que você possa fazer depois uma amostragem. O Brasil tem 500 mil urnas, pegaria três mil e faria uma conferência. Iria mostrar a correção do resultado e parar com esse fantasma de desconfiança que circula no país. Não vejo razão de não fazer isso. E essa minha posição é muito anterior a Bolsonaro. Mas tudo evolui na vida, por que as urnas também não podem? Até para dar segurança ao eleitor. Acho que isso vem a favor, e não contra a credibilidade das urnas eletrônicas.
Depois do impeachment, o senhor deixou o comando do PSDB e retorna agora. O que mudou?
As redes sociais trouxeram para a primeira prateleira da política muitas figuras sem uma militância anterior. O Congresso Nacional hoje é um espaço conflagrado, onde os extremos protagonizam a disputa política. Ano que vem completarei 40 anos de mandatos eletivos, tendo passado por Governo de Minas Gerais, Senado, Presidência da Câmara dos Deputados, e sempre fui do diálogo. Sempre achei que os embates eram resolvidos através de conversa. Hoje perdeu-se esse espaço. Quanto mais agressivo é um ator da política, mais likes ele tem. A agenda do Brasil vai ficando num plano secundário. O PSDB perdeu musculatura ao longo dos anos, mas tem uma posição, um projeto de país e consegue dialogar com todos os extremos. Por isso estou me dispondo a esse desafio de presidir o partido novamente. Acredito que a avenida do centro vai se reabrir em 2026. Não merecemos ficar mergulhados eternamente nessa polarização tão rasa e que está paralisando o país.
É possível recuperar o protagonismo que a sigla já teve?
Temos um desafio grande. Recolocar o PSDB no centro das grandes decisões nacionais. Nós nascemos na adversidade. Em 1988, nos reunimos na assembleia constituinte, para acreditar num sonho, na possibilidade de ter um partido político que fosse claro na defesa do parlamentarismo, da responsabilidade fiscal. Pouca gente acreditava na nossa capacidade de vencer, e não só vencemos como transformamos o Brasil. Nosso legado é poderoso. O que temos que fazer é dar voz a essas pessoas que não se sentem representadas nem por um lado nem por outro. Não vai ser fácil, mas lá atrás também não foi, e a experiência do passado me inspira a acreditar que o Brasil merece um partido que não trate o adversário como inimigo, que aceite discutir propostas independente de sua origem. Somos o único que não se curvou ao bolsonarismo e ao lulopetismo.
Mas o partido perdeu quadros importantes, como os três governadores, inclusive a de Pernambuco, Raquel Lyra...
Tenho um carinho enorme por Raquel, lamentei muito sua saída, ainda mais porque fui eu que a convidei para vir e disputar a Prefeitura de Caruaru. Mas todos têm as suas circunstâncias, e as dela a levaram a deixar o PSDB. Mas seguimos otimistas com o resultado que vamos ver em Pernambuco, com o presidente Álvaro Porto. Queremos quem esteja confortável conosco para voltarmos a sonhar.
O que levou o partido a reduzir tanto seu tamanho?
Tem formas distintas de enxergar o cenário atual. Se tivéssemos ido para o caminho mais fácil, da incorporação ou fusão, e não foram poucas as oportunidades que surgiram, talvez alguns estariam mais confortáveis. Mas não abrimos mão daquilo que representamos. Perdemos quadros, cometemos equívocos, e houve o projeto megalomaníaco do ex-presidente João Dória, que impediu que tivéssemos uma candidatura presidencial em 2022. O partido subordinou-se a um projeto regional, e pagamos preço alto em relação a isso.
Hoje o PSDB tem 13 deputados federais. Quais as metas para ampliar esse número, que é importante para questões como fundo partidário e eleitoral?
Acredito que já na janela partidária estaremos com um número maior, e devemos apresentar perspectivas de fazermos bancada em torno de 30 parlamentares. Mas o PSDB é muito maior que essa aritmética, ele está na memória das pessoas como o partido que transformou o Brasil em muitos aspectos. Está vivo e presente na vida de todos os brasileiros, com resultados muito marcantes. Temos que resgatar isso. E vamos fazer como PSDB, não como fusão partidária.
E quanto aos seus passos? Deve voltar a disputar o Governo de Minas?
Eu sou cauteloso em definir essas coisas antes da hora. Na política, a decisão correta no tempo errado dá errado no final. Vivemos um momento de muita turbulência. A construção das candidaturas nacionais repercutirá nos estados. Temos um governante que até é um sujeito de bem, mas está a anos luz de compreender o que é governar Minas e está absolutamente ausente das discussões nacionais. Minas sempre foi ponto de equilíbrio no país, entre Nordeste e São Paulo. Quando fui governador, levamos o estado a ter a melhor educação fundamental do Brasil em todas as nove séries. Arrumamos as contas do estado. E hoje com muita tristeza essas políticas implementadas se perderam.
Isso parece conversa de candidato...
O governo do PT (Fernando Pimentel) foi trágico, e o governo de Romeu Zema (Novo) conseguiu terminar sem uma marca, uma obra, um investimento. Torci muito para que o (senador Rodrigo) Pacheco (PSD) pudesse se animar ao governo, e agora vamos tentar construir uma candidatura ao governo. Existe um chamamento, mas não é meu objetivo. Quero me dedicar a esse projeto nacional. Acredito que o PSDB vai voltar a ser um partido essencial ao Brasil, e em pouco tempo disputaremos as eleições nacionais.
Para finalizar, o que tem a dizer sobre a prisão do ex-presidente Jair Bolsonaro?
Ninguém pode atentar contra a democracia. Custou a muitos brasileiros chegarmos até aqui, entre eles o meu avô Tancredo Neves. Aqueles que participaram de uma tentativa de abolição do estado democrático de direito têm que pagar pelo que fizeram. Claro que vejo exageros em algumas penas, para aqueles que tiveram participação lateral nos processos. Ajudei a articular o projeto de lei que permite o abrandamento de algumas penas. Que impactaria no pedaço de alguma pena de Bolsonaro. Mas a Justiça decidiu, e a decisão da Justiça tem que ser cumprida. Mas o que eu quero é virar essa página. O Brasil é muito maior que Lula e Bolsonaro, e está vendo oportunidades históricas passarem. E o PSDB volta para colocar racionalidade, serenidade e qualidade no debate político.

