PGR usa declarações, mensagens e entrevistas como provas contra Eduardo Bolsonaro e Paulo Figueiredo
Paulo Gonet afirma que deputado federal e blogueiro 'confessaram' atuação nos EUA para pressionar STF
O procurador-geral da República, Paulo Gonet, usou principalmente declarações públicas do deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP) e do blogueiro Paulo Figueiredo Filho para denunciar os dois por coação em processo judicial. Gonet destacou que os dois reconheceram, em publicações em redes sociais, entrevistas e outras falas a própria atuação para levar autoridades americanas a aplicarem sanções ao Brasil. Também foram utilizadas como provas trocas de mensagens entre Eduardo e o ex-presidente Jair Bolsonaro.
Na denúncia, Gonet afirma que "os fatos expostos nesta acusação repousam em sólido acervo probatório, composto, especialmente, por declarações públicas dos próprios investigados, em suas redes sociais e em entrevistas, bem como por dados extraídos de aparelhos celulares apreendidos".
Eduardo e Figueiredo são acusados de atuar para que o governo dos Estados Unidos aplicasse sanções ao Brasil e a autoridades brasileiras como uma forma de atrapalhar o andamento do processo conduzido pelo STF que resultou na condenação de Bolsonaro por tentativa de golpe de Estado.
"A dupla denunciada anunciava as sanções previamente, celebrava quando eram impostas e as designava, elas próprias, como prenúncio de outras mais, caso o Supremo Tribunal não cedesse. As providências foram obtidas com porfiado esforço pela dupla, conforme os denunciados eles próprios triunfalmente confessam", escreveu Gonet.
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Confira as provas utilizadas pela PGR
Preparação e primeiras reuniões
A PGR relata que desde a posse de Donald Trump na presidência dos Estados Unidos, em janeiro, Eduardo e Figueiredo passaram a ter diversas reuniões com autoridades americanas, divulgadas por eles próprios.
Em março, por exemplo, Eduardo Bolsonaro afirmou, em entrevista à CNN Brasil, que sua presença nos Estados Unidos iria "aumentar ainda mais a pressão" contra o ministro Alexandre de Moraes, chamado por ele de "perseguidor".
Enquanto o perseguidor estiver com o poder para fazer as maldades que bem entender, o Brasil não é um local seguro e certamente a minha estada aqui nos Estados Unidos vai aumentar ainda mais a pressão contra ele aí no Brasil.
No mês seguinte, o deputado federal e Figueiredo gravaram um vídeo em frente à Casa Branca em que relataram suas reuniões. Eduardo disse que a ameaça de apreensão do seu passaporte que havia sido negada pelo STF teria sido um "tiro no pé", porque o fez ficar "24 horas por dias" focado em sua "missão" nos Estados Unidos. O resultado esperado, de acordo com ele, era "botar um freio" em pessoas que estariam "rasgando a Constituição".
Eu acho que foi um grande tiro no pé essa tentativa de confiscar o meu passaporte e me obrigar a ficar 100% do tempo aqui nos Estados Unidos, porque agora eu estou 24 horas por dia focado nessa missão afirmou, acrescentando depois: Então, a gente leva fatos, a gente encontra com diversas pessoas, e essa é a construção política necessária para que a gente chegue no resultado que a gente espera, né? Que é realmente botar um freio nas pessoas que há muito tempo estão rasgando a Constituição e não têm qualquer tipo de limite.
No mesmo vídeo, Figueiredo relata que os dois estavam sendo cobrados pelas sanções, mas que elas faziam parte de um "processo", que demandava diversas reuniões.
É um processo. Então, você tem que conversar com o Conselho de Segurança Nacional, você tem que conversar com o DPC, Domestic Policy Council, você tem que conversar com o Departamento de Estado, você tem que conversar com o Departamento de Tesouro, você tem que conversar com gente do White House Counsel's Office, com uma espécie de advocacia da Casa Branca.
Comemoração das primeiras medidas
Em julho, a dupla comemorou as primeiras medidas tomadas pelo governo americano e as atribuiram à própria atuação.
No dia 9 daquele mês, Trump anunciou a imposição de uma tarifa de 50% aos produtos brasileiros. Eduardo e Figueiredo divulgaram uma nota conjunta em que relacionavam o anúncio às suas conversas com autoridades.
"Nos últimos meses, temos mantido intenso diálogo com autoridades do governo do governo do presidente Trump sempre com o objetivo de apresentar, com precisão e documentos, a realidade que o Brasil vive hoje. A carta do presidente dos Estados Unidos apenas confirma o sucesso na transmissão daquilo que viemos apresentando com seriedade e responsabilidade", disseram os dois.
No dia 18 de julho, após Moraes impor medidas cautelares a Bolsonaro, como o uso de tornozeleira eletrônica, o governo dos Estados Unidos anunciou a suspensão dos vistos de Moraes e de seus "aliados" no STF, assim como de seus familiares.
Em publicação no X, Eduardo agradeceu o presidente Donald Trump e o secretário de Estado, Marco Rubio, e afirmou que havia "muito mais por vir". No mesmo dia, Figueiredo afirmou em vídeo que era "bastante seguro afirmar que esse é só o começo".
É bastante seguro afirmar que esse é só o começo. As coisas que eu tenho ouvido são assustadoras. Talvez Magnitsky seja algo que vai deixar saudade. Então se preparem porque vocês terão semanas eletrizantes pela frente, e eu faço um apelo às autoridades: vocês não têm, não há um cenário onde vocês saíam vitoriosos nessa história.
No dia 30, o governo incluiu Moraes na Lei Magnitsky, que impõe restrições econômicas, como o bloqueio de contas bancárias e de bens em solo americano.
Ameaças de novas sanções
A PGR afirmou que os dois passaram a atuar para ampliar as sanções contra mais pessoas.
Em 21 de agosto, Paulo Figueiredo afirmou em vídeo, republicado por Eduardo, que atuava por punições a delegados da Polícia Federal (PF):
Vocês acham que eu estou fazendo obstrução de Justiça buscando sanções contra o Alexandre? Então dobrem essa acusação, porque estou buscando sanção contra vocês. Delegados da Polícia Federal, eu estou buscando sanções contra vocês. E olha, tic, tac, tic, tac. As sanções estão vindo.
No dia 9 de setembro, quando o julgamento de Bolsonaro estava em andamento no STF, Paulo Figueiredo falou na possibilidade dos demais ministros da Primeira Turma também serem alvo de sanções. Ele mencionou uma declaração do subsecretário de Diplomacia Pública dos Estados Unidos, Darren Beattie, de que o governo americano continuaria a tomar "medidas cabíveis" contra Moraes e quem colaborasse com ele.
E não somente Alexandre, mas também Flávio Dino, Cristiano Zanin, Cármen Lúcia, Luiz Fux, todos eles estão sendo observados. E o recado que o Darren Beattie, que a embaixada deu, é que se eles continuarem a agir com abuso de autoridade para minar as liberdades fundamentais, serão alvos das medidas apropriadas declarou Figueiredo, em transmissão ao vivo.
Mensagens com Bolsonaro
A PGR separou um trecho da denúncia para as conversar entre Eduardo e Bolsonaro, recuperada pela PF, que apreendeu o celular do ex-presidente.
Segundo Gonet, os diálogos "revelam que Eduardo Bolsonaro instruía o pai quanto ao momento e ao conteúdo de suas manifestações públicas, reparando que declarações desalinhadas poderiam comprometer o andamento das articulações", como em um trecho em que ele diz: "se você disser algo sobre EUA que não se encaixar com o que estamos fazendo aqui, pode enterrar algumas ações".
Outra preocupação exposta pelo deputado federal foi de que uma candidatura à Presidência do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), fizesse com que o governo dos Estados Unidos a não se preocupar em livrar Bolsonaro da condenação.
"Aqui nos EUA tivemos que driblar a ideia plantada pelos aliados dele, de que 'Tarcísio = Bolsonaro'' uma clara mensagem de que os EUA não precisariam entrar nesta briga, pois com TF [Tarcísio] ou você, Trump teria um aliado na presidência do Brasil em 2027", escreveu.
Gonet ainda destacou o episódio em que Eduardo se irritou e chegou a xingar o pai, após ele criticá-lo por um embate com Tarcísio. O parlamentar disse que isso poderia prejudicar o próprio Bolsonaro, se Eduardo não conseguisse se reunir com autoridades americanas para ajudá-lo.

