Prioridades de Lula patinam no Congresso, e governo tem "teste de fogo"
Primeiro semestre foi marcado por derrotas do Poder Executivo como a derrubada do decreto do IOF, criação de CPI e derrubada de vetos
A poucos dias do recesso do Congresso, iniciativas que são consideradas pelo governo como prioridades enfrentam dificuldades para avançar. Depois de ter visto o decreto que aumenta o Imposto Sobre Operações Financeiras (IOF) ser derrubado, a articulação política do Palácio do Planalto vai enfrentar novos embates no tempo que resta até a pausa que os parlamentares vão fazer em meados de julho.
As duas pautas prioritárias para o governo para este ano começarão a ter seus primeiros testes de fogo com a previsão de apresentação dos relatórios da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da Segurança, que reforça o papel da União na área, e do projeto de lei que amplia a isenção do Imposto de Renda para quem recebe até R$ 5 mil por mês.
Líderes partidários descartam que as duas iniciativas sejam aprovadas pelo plenário da Câmara antes do recesso programado para daqui a duas semanas, o que vai deixar o calendário apertado para o governo, principalmente no projeto do IR, que precisa ser sancionado até setembro para valer em 2026. As mudanças legislativas são consideradas na estratégia eleitoral do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que deve tentar a reeleição no ano que vem.
A PEC da Segurança vai ser analisada pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara na quarta-feira. Nesta terça-feira, o relator Mendonça Filho (União-PE) vai se reunir com o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), para tentar fechar um texto de consenso. A iniciativa sofre resistência da oposição e dos estados, que consideram que o texto dá excessiva influência ao governo federal.
O relator aponta que ainda há um longo caminho para o projeto ser aprovado.
"A primeira etapa é a CCJ, depois tem que pensar em comissão especial. Comissão especial são 40 sessões, então é impossível (a Câmara aprovar neste semestre)" afirmou Mendonça, pontuando que é possível chegar a um acordo:"Dá para aprovar, mas quero trabalhar antes as bancadas, consultar líderes, mostrar o que estou pensando, mas também não quero antecipar antes dessas consultas."
Dificuldades no IR
O desafio é o mesmo no projeto do Imposto de Renda, que tem o ex-presidente da Câmara Arthur Lira (PP-AL) como relator. A aprovação do texto tem passado por dificuldades em meio ao clima de rebelião no Congresso contra o governo.
O deputado Rubens Pereira Júnior (PT-MA), presidente do grupo de trabalho que cuida do projeto, diz que não há previsão de quando o texto vai ficar pronto para ser votado. Nesta terça, Rubens e Lira vão se reunir com representantes dos partidos na CCJ para falar sobre a iniciativa.
A expectativa é que a Câmara vote antes do recesso iniciativas como o projeto que flexibiliza o licenciamento ambiental, que possui alas do governo a favor e contra, e um projeto que revê isenções fiscais, que tem sido tocado pelo Legislativo em vez de ter o protagonismo do ministro da Fazenda, Fernando Haddad.
Motta se reúne com líderes partidários nesta terça para fechar acordo sobre as iniciativas que serão votadas pela Câmara nesta semana. A oposição vai aproveitar o encontro para pressionar mais uma vez para que o projeto de anistia aos condenados nos atos golpistas do 8 de janeiro seja pautado, o que contraria os interesses do governo.
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Agenda no Senado
Já no Senado, o presidente da Casa, Davi Alcolumbre (União-AP), tenta aprovar ainda antes do recesso o projeto que legaliza cassinos, bingos e jogo do bicho, tema que também possui grupos do governo contra e favor, e tenta avançar com o novo código eleitoral.
O Poder Executivo vive uma relação hostil com o Congresso, que patrocinou seguidas derrotas ao governo nos últimas semanas. Além da derrubada do decreto do IOF, também foi criada a Comissão Parlamentar Mista Inquérito (CPMI) do INSS, que deve mirar integrantes e ex-integrantes do governo, além de terem sido derrubados vetos presidenciais, inclusive em um que barrava subsídios a empresas de energia e consequentemente provoca aumento da conta de luz.
Um sintoma da dificuldade de articulação é a possibilidade de a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) não ser votada antes do recesso. Para o Congresso pausar os trabalhos é necessário que o texto seja votado, mas, quando a votação não ocorre, os parlamentares deixam de fazer sessões mesmo assim e instituem o chamado “recesso branco”.
Enquanto isso, iniciativas de interesse do governo seguem travadas. Além do projeto do Imposto de Renda e da PEC da Segurança, o governo ainda precisa aprovar a segunda fase da regulamentação da Reforma Tributária, que institui o comitê gestor dos novos impostos unificados, a nova lei das falências, que foi aprovada pela Câmara e está travada no Senado há um ano, uma MP que pode servir de acordo para atenuar o aumento da conta de luz e uma MP que institui o programa “Mais Especialistas”, umas das vitrines do governo e que amplia a oferta de médicos.
O líder do PDT na Câmara, Mario Heringer (MG), não vê tempo hábil para o Congresso aprovar essas iniciativas até chegar o recesso. "Muito difícil, temos duas semanas."
Em meio a esse cenário, há possibilidade de novas derrotas. A Medida Provisória feita para melhorar o quadro fiscal do governo e que aumenta a tributação sobre fintechs, bets e uma série de aplicações financeiras que hoje são isentas de tributos, como a Letra de Crédito do Agronegócio (LCA) e Letra de Crédito Imobiliário (LCI), enfrenta resistências.
A iniciativa será analisada por uma comissão mista com deputados e senadores. O relator é o deputado Carlos Zarattini (PT-SP) e o presidente da comissão será o senador Renan Calheiros (MDB-AL).
Hugo Motta já disse que a MP terá que ser bastante alterada e que, mesmo com o relator sendo do PT, para fazer o texto avançar ele vai precisar ceder e mudar o que o governo enviou originalmente. Por sua vez, Renan também é da base, mas já manifestou críticas em relação à estratégia do governo em focar no aumento de impostos.
Motta criou diversos grupos de trabalho para avançar com propostas de diferentes temas. Entre eles estão equipes que analisam a Reforma Administrativa, considerada prioridade para o presidente da Casa, o projeto que regulamenta trabalho por aplicativos, o novo Plano Nacional de Educação e o projeto que regulamenta a Inteligência Artificial. A tendência é que os relatórios de parte dessas iniciativas sejam apresentados antes do recesso, mas não há previsão de quando devem ser votados.

