Rui Costa admite que governo precisa de mais gente para acelerar liberação de emendas da Saúde
Crise escalou com o anúncio de Motta de que a Câmara deve votar a derrubada de um decreto que aumentou o Imposto de Operações Financeiras
Pego de surpresa com a decisão do presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), de colocar em votação a derrubada do decreto que aumenta o Imposto de Operações Financeiras (IOF), o ministro da Casa Civil, Rui Costa, havia admitido dia antes a líderes a incapacidade do governo de acelerar o pagamento de emendas. Em conversa com deputados na semana passada, ele disse que será precisará reforçar as equipes responsáveis pelos pagamentos dos recursos. Um dos principais gargalos, de acordo com participantes do encontro, está no Ministério da Saúde, comandado pelo ministro Alexandre Padilha.
A declaração do ministro da Casa Civil ocorreu em reunião em que também estavam a ministra de Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann, o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-RP), além dos líderes da Casa. O encontro foi uma tentativa dos articuladores políticos do Palácio do Planalto de evitarem novas derrotas, como as sofridas na semana passada com a derrubada de vetos presidenciais.
Nesta quarta-feira, porém, a crise com o Congresso escalou com o anúncio de Motta de que a Câmara deve votar a derrubada de um decreto que aumentou o Imposto de Operações Financeiras (IOF). A medida foi anunciada no mês passado pelo ministro Fernando Haddad (Fazenda) como forma de equilibrar as contas. Por uma rede social, Gleisi rebateu o deputado ao afirmar que, caso o decreto caia, o governo terá que cortar emendas parlamentares.
Como mostrou ontem o GLOBO, nos primeiros seis meses de 2025, o Executivo adotou ritmo mais lento do que no mesmo período dos dois primeiros anos do terceiro mandato de Luiz Inácio Lula da Silva. Desde janeiro, foram empenhados R$ 776 milhões. No mesmo período do ano anterior, eram R$ 23 bilhões — ou seja, 30 vezes mais do que o montante atual. E nos primeiros seis meses de 2023, R$ 7,5 bilhões.
No encontro, os ministros de Lula ouviram uma série de reclamações sobre o ritmo de liberação de emendas parlamentares por parte do governo, em especial as vinculadas ao Ministério da Saúde, pasta que concentra 70% dos repasses. A demora no pagamento de recursos usados para obras nos redutos políticos dos parlamentares é um dos principais flancos da crise entre governo e Congresso. Embora o ritmo dos empenhos seja ditado pela Secretaria de Relações Institucionais (SRI), é nos ministérios que se desenrola o trâmite para a liberação desse recursos.
Rui Costa admitiu que, frente a demora, era necessário que Padilha contratasse mais gente para agilizar o cadastro de projetos, avaliação das propostas e liberação dos recursos. O relato feito aos líderes é de que existe um gargalo na pasta que a atual equipe, aquém da necessária, não dará conta de suprir. Procurado, Costa e Padilha não quiseram comentar.
Apesar da constatação do chefe da Casa Civil, não está no radar do Ministério da Saúde a contratação de pessoal específico para essa função. Integrantes da pasta afirmam que o processo de liberação de emendas é submetido a um corpo técnico especializado e aprovado por diretores de cada área, seguindo um cronograma com prazo regulamentado para cadastro no sistema, abertura de propostas e aprovação dos projetos. O trâmite percorre um caminho por várias áreas do ministério, sendo as Secretarias de Atenção Primária e Secretaria de Atenção Especializada as que concentram o maior volume de emendas. Neste cenário, técnicos da pasta argumentam que não cabe contratar mais gente e que a aprovação das emendas não é mecânica e nem automática.
Gleisi tem justificado a demora pelo fato de o orçamento ter sido sancionado em 10 de abril deste ano e pondera que a comparação com ritmo de pagamento dos anos anteriores deve ser levada em conta a partir desta da sanção do orçamento, que em 2023 e 2024 ocorreu em janeiro. A ministra também pondera que as novas regras para aprovação e execução de emendas determinadas pelo Supremo Tribunal Federal tornaram o trâmite mais criterioso.
Na avaliação dos líderes, as medidas de transparência e rastreamento impostas pelo ministro Flavio Dino, do Supremo Tribunal Federal, ampliaram o prazo para o pagamento de emendas. Segundo eles, as exigências criaram uma série de novos mecanismos que os ministérios não tem infraestrutura técnica e de pessoal para pôr em prática em uma "velocidade razoável".
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Principal avo das críticas dos parlamentares, o Ministério da Saúde afirma estar em modo força-tarefa para pagamentos de emendas desde 5 de junho, o que não inclui contratação extra de pessoal, remanejamento de equipes ou horas extras. A pasta seguiu trabalhando no feriado de Corpus Christi para assegurar o empenho de mais de R$ 840 milhões relativos às emendas parlamentares nos últimos dias. Em nota, a pasta comandada por Alexandre Padilha afirma que "empenhos de emendas parlamentares estão sendo feitos em tempo recorde". De acordo com a pasta, "em oito dias ( a partir da apresentação dos planos de trabalho), as liberações começaram a ser feitas e atualmente somam mais de R$ 1,466 bilhão. Nos anos anteriores, o prazo para as primeiras liberações foi de, pelo menos, 23 dias."
A pasta também afirma que estados e municípios têm papel importante para acelerar esse trâmite: "À medida que estados e municípios finalizam os cadastros — com a inserção dos planos de trabalho e a abertura das contas bancárias individuais —, novos empenhos serão liberados. O processo atende rigorosamente à determinação do Supremo Tribunal Federal, que instituiu novas regras para a execução das emendas parlamentares, com foco em maior controle, rastreabilidade e transparência."
O governo vinha contando com essa semana e a próxima para reduzir a temperatura com o Congresso. Porém, o Planalto foi pego de surpresa com a decisão de Motta de votar o projeto que pode derrubar o decreto do IOF. O Ministério da Fazenda estima arrecadar R$ 10 bilhões neste ano com a medida.
Na semana passada, a Câmara aprovou a urgência desse projeto com placar elástico de 346 a 97, o que acelera a sua tramitação. A articulação política do governo tentava usar esse o período de festas de juninas, em que parlamentares ficam fora de Brasília, e o pagamento de emendas para debelar a crise. Em paralelo, tentava construir o acordo para resolver o impasse nas contas públicas que o governo precisa, além de também atender o Congresso, que critica medidas que aumentem a alíquota de impostos.

