Diversidade é a melhor defesa contra ameaças digitais, diz Flávia Brito, vice-presidente da Abes-PE
Confira a entrevista
Em um país que figura entre os mais atacados por crimes cibernéticos no mundo, o cenário da cibersegurança no Brasil ainda carrega um grave déficit de representatividade: segundo a pesquisa mais recente da ISC2 — realizada em março de 2025 — as mulheres representam aproximadamente 22% das equipes de segurança cibernética globalmente, um percentual que inclui o Brasil. Isso evidencia que, mesmo em um campo estratégico e em rápido crescimento, as mulheres ainda enfrentam barreiras de entrada, visibilidade e ascensão.
Com o objetivo de transformar esse cenário, surgem cada vez mais iniciativas que buscam ampliar a presença feminina na tecnologia, promovendo inclusão, capacitação e oportunidades. Um exemplo é o Tech Woman, evento que será realizadom neste sábado (26), no Recife, reunindo cerca de duas mil participantes em um dia de trocas intensas sobre carreira, inovação, saúde emocional e liderança feminina no setor.
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Entre as convidadas estão Flávia Brito, CEO da empresa de cibersegurança Bidweb, conselheira do Porto Digital e vice-presidente da Abes (Associação Brasileira das Empresas de Software) em Pernambuco, e Jamile Sabatini Marques, diretora nacional de Inovação e Fomento da Abes. A presença das duas, com apoio institucional da entidade, reforça o compromisso da Abes com um ecossistema de tecnologia mais plural, inovador e seguro.
Nesta entrevista, Flávia fala sobre os desafios enfrentados por mulheres na segurança digital, os impactos da diversidade nas empresas de tecnologia e o papel de iniciativas como o Tech Woman na construção de um futuro mais inclusivo para o setor.
Por que falar de mulheres na cibersegurança é tão urgente no Brasil hoje?
Porque estamos diante de um cenário crítico: o número de ameaças cibernéticas cresce todos os dias, e continuamos com uma baixa representatividade feminina nas áreas responsáveis por proteger nossas empresas, nossos dados e nossa soberania digital. Incluir mais mulheres nesse campo é uma questão de segurança e de inovação. A diversidade amplia perspectivas e torna nossas respostas mais inteligentes e eficazes.
A cibersegurança ainda é vista como uma área masculina. Como romper esse estigma?
É preciso agir em várias frentes. Primeiro, oferecendo formação técnica e oportunidades desde cedo; ainda na escola, nas universidades e programas de capacitação. Depois, dando visibilidade a quem já está no setor. Quando uma menina vê outra mulher liderando uma empresa de cibersegurança, isso muda tudo. Também é essencial que as empresas revejam suas culturas internas e criem ambientes mais acolhedores e justos para todos.
Como a sua atuação na Abes e no Porto Digital contribui para essa transformação?
Na ABES, temos a missão de fortalecer o setor de software como um todo, e isso inclui ampliar o acesso e a diversidade. A inovação precisa vir acompanhada de inclusão. No Porto Digital, faço parte de um ecossistema que valoriza o capital humano e a criatividade. A tecnologia só faz sentido se estiver a serviço das pessoas, e as mulheres precisam estar entre essas protagonistas.
O que você destacaria como legado do Tech Woman para quem participa?
É um evento que gera pertencimento. Ver tantas mulheres reunidas para aprender, compartilhar e se fortalecer é transformador. Para mim, o Tech Woman é um movimento que não só inspira, mas também impulsiona trajetórias. Saímos daqui mais conectadas, mais empoderadas e mais certas de que estamos no caminho certo.
Qual é a mensagem que você deixa para as jovens que estão pensando em entrar no setor de tecnologia e segurança digital?
Não deixem ninguém dizer que esse lugar não é para vocês. A tecnologia precisa de mulheres. A cibersegurança precisa de vocês. E nós estamos aqui para abrir portas, apoiar e caminhar juntas.
Você enxerga algum avanço recente em políticas públicas ou iniciativas do setor privado voltadas à inclusão de mulheres na tecnologia?
Sim, temos visto um crescimento de iniciativas, tanto do setor público quanto de empresas, voltadas à formação de meninas em STEM, bolsas de estudo e programas de aceleração de carreira. Mas ainda é pouco diante do desafio. Precisamos transformar essas ações pontuais em políticas estruturantes. A inclusão não pode ser só uma pauta de marketing, tem que ser um compromisso estratégico.
Na prática, como a diversidade impacta a segurança digital de uma organização?
De forma direta. Equipes diversas têm mais repertório para identificar riscos, prever vulnerabilidades e pensar em soluções criativas. Quando todos pensam da mesma forma, os ataques se tornam mais previsíveis. A pluralidade de visões torna as defesas mais robustas e completas. Incluir mulheres não é só uma questão ética, é também uma vantagem competitiva.
Quais são os maiores desafios técnicos hoje no campo da cibersegurança, e como as mulheres podem se destacar nesse contexto?
Estamos lidando com desafios complexos como ataques de ransomware cada vez mais sofisticados, espionagem digital, deepfakes e proteção de infraestruturas críticas. Isso exige pensamento estratégico, análise de risco, mas também sensibilidade para lidar com pessoas, dados e privacidade. As mulheres, com sua capacidade de conexão e leitura multidimensional, têm muito a contribuir — e já estão contribuindo, mesmo que ainda invisibilizadas.
Você sente que já há um movimento de mudança cultural nas empresas ou ainda estamos no começo dessa transformação?
Estamos caminhando, mas ainda há muito a ser feito. Vejo empresas começando a entender que inclusão é parte do resultado, não um adendo. Quando as lideranças abraçam a diversidade como valor central, a cultura começa a mudar. Mas precisamos cobrar mais: mais mulheres em conselhos, em cargos técnicos, em posições decisórias. Só assim a transformação será real e sustentável.

