Socorro às companhias aéreas só sai no 2º semestre: veja quais são as pendências que perduram
Governo já apresentou o plano, que envolve R$ 7 bilhões em financiamentos do BNDES, às companhias, mas quer algum tipo de contrapartida delas
O governo apresentou seu plano de ajuda ao setor aéreo às três maiores empresas do país e o anúncio está previsto para o segundo semestre do ano, segundo pessoas familiarizadas com o assunto.
Após contratempos e atrasos, as negociações com Azul, Gol Linhas Aéreas Inteligentes e Latam Airlines Group, com sede em Santiago, estão progredindo, mas ainda há pontos a serem definidos, disseram as pessoas, sob a condição de anonimato.
A equipe do presidente Luiz Inácio Lula da Silva quer alguma contrapartida das companhias aéreas em troca do plano. Algum tipo de compensação faz sentido, disse o secretário do Tesouro, Rogério Ceron, em entrevista, dado que as empresas receberiam uma “ajuda estrutural” para aliviar dificuldades financeiras.
O CEO da Azul, John Peter Rodgerson, reconheceu que estão sendo feitos progressos. “Estamos trabalhando com o governo nas possibilidades. Teremos algumas notícias sobre o acordo em duas semanas”, disse o CEO por telefone nesta segunda-feira, acrescentando que não há data prevista para um anúncio completo do plano de resgate.
A Latam segue investindo para crescer e avalia todas as opções de financiamento disponíveis no mercado para obter crédito mais atrativo e com menor custo para o seu negócio.
Lula quer reduzir as tarifas o suficiente para permitir que a população de menor renda voe regularmente. Em troca de ajuda, é possível que o governo exija mais ofertas de voos. No entanto, isso resultaria em atrasos na produção de novas aeronaves e gargalos na cadeia de abastecimento, de acordo com Carolina Chimenti, analista da Moody’s Ratings. “É difícil imaginar um cenário que tenha mais oferta e que a passagem caia muito,” disse ela.
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O programa de ajuda estatal está em discussão há meses e prevê a criação de uma linha de crédito permanente para as empresas aéreas usando R$ 7 bilhões do Fundo Nacional de Aviação Civil. Segundo o plano, o BNDES daria garantia para empréstimos voltados à compra de aviões ou manutenção de turbinas, disseram as pessoas. Os empréstimos para outros fins, contudo, ainda exigiriam garantias das próprias empresas.
As taxas de juros dos empréstimos também ainda estão sendo negociadas. A equipe econômica de Lula quer que o BNDES cobre tarifas padrão, mas as companhias aéreas pedem condições mais favoráveis, disse uma das pessoas.
As companhias aéreas da América Latina têm enfrentado dificuldades desde a pandemia, com os governos oferecendo pouca ajuda ao setor. Em 2020, a Latam entrou com pedido de recuperação nos Estados Unidos, conhecido como Chapter 11, e conseguiu se recuperar. A Gol, por sua vez, pediu proteção aos credores em janeiro, após uma dúzia de tentativas de reestruturação de sua dívida.
Ao mesmo tempo, as tarifas dispararam em meio aos altos custos de combustível, à escassez de aeronaves e a um excesso de ações judiciais de clientes insatisfeitos.
O plano de Lula pode beneficiar particularmente a Azul, que enfrenta pagamentos de juros elevados para pagar a sua dívida mais pesada, de acordo com Chimenti. A rival Latam tem uma estrutura de capital mais enxuta depois de sair da recuperação judicial, focando agora no refinanciamento da sua dívida. “A Latam não precisa de capital nem de nenhuma nova dívida”, disse a analista da Moody’s.
“A Azul seria a maior beneficiária porque não reduziu os níveis de endividamento e tem maiores necessidades de caixa”, disse Chimenti. Embora a Azul tenha conseguido alargar o vencimento da sua dívida até pelo menos 2028, a empresa ainda precisa gerar fluxo de caixa suficiente para cobrir os seus custos operacionais e de leasing, acrescentou.
A elegibilidade da Gol para receber ajuda do governo permanece um ponto de interrogação, uma vez que a empresa está conduzindo seu processo via Chapter 11 nos EUA. De acordo com a legislação brasileira, quem está reestruturando suas dívidas judicialmente enfrenta restrições no acesso ao crédito de recursos públicos.
Qualquer dívida adicional do governo precisaria ser aprovada por um juiz e incluída no plano de financiamento de saída da empresa, disse Chimenti.
Houve conversas sobre a possibilidade de a Gol solicitar o auxílio por meio do Abra Group, holding colombiana que controla a Gol e a Avianca, segundo pessoas familiarizadas com o assunto. Abra não respondeu a um pedido de comentário.
O Brasil tem trabalhado num plano para ajudar o setor aéreo e reduzir tarifas desde que Lula tomou posse, mas a oposição da equipe econômica atrasou o processo. O Ministério da Fazenda, por exemplo, questionou a urgência de resgatar o setor em meio a preocupações com gastos excessivos e às negociações da Azul para se fundir com a Gol.
Solução Estrutural
Segundo Ceron, o governo precisava de mais tempo para observar como as empresas lidariam com seus problemas financeiros. No final, optou por trabalhar numa solução estrutural em vez de apenas prestar ajuda de emergência. O foco, disse o secretário do Tesouro, é ajudar as companhias aéreas a obter financiamento de longo prazo mais barato.
Por mais que Lula queira tornar os voos mais acessíveis, Chimenti não vê qualquer potencial para as transportadoras reduzirem as tarifas, dada a situação das suas finanças. E o pacote de ajuda pouco auxiliaria, uma vez que os custos continuam elevados e as restrições de oferta persistem.
“A Gol está no meio do Chapter 11, a Latam está na saída, e a Azul tem uma situação de balanço mais complicada”, disse a analista da Moody’s. “Não vejo uma motivação comercial para as empresas reduzirem as tarifas, a não ser que isso seja algo subsidiado ou imposto pelo governo.”