Castro admite "desvantagem" no armamento da polícia em relação aos bandidos, em justificativa ao STF
Argumentos foram apresentados pelo governador do Rio para justificar o uso proporcional da força durante ação nos complexos do Alemão e da Penha
Após a operação policial mais letal do Rio, com 121 mortos, entre 117 suspeitos e quatro agentes, o governador Cláudio Castro entregou ao ministro Alexandre de Moraes, relator temporário da ADPF das Favelas no Supremo Tribunal Federal (STF), na última segunda-feira, um documento justificando a ação.
Em 26 páginas, o chefe do Executivo fluminense enumera argumentos para o "uso proporcional da força" na ocasião. Depois de citar que o Comando Vermelho enfrentou as polícias Civil e Militar — que empregaram 2.500 agentes — com “armas de uso restrito” e com “táticas típicas de guerrilha urbana”, Castro admite que, no geral, “as capacidades técnicas e os armamentos das forças policiais, em muitos aspectos, se mostram em desvantagem frente a organizações criminosas de perfil paramilitar”.
O texto, assinado por Cláudio Castro na última segunda-feira, menciona que, durante a megaoperação da semana passada, os cerca de 500 bandidos ainda usavam roupas camufladas para percorrer “trilhas clandestinas em meio à vegetação”, assim como lançaram granadas contra os policiais, por meio de drones.
No entanto, ele menciona que "não há notícias de óbitos referentes a indivíduos não pertencentes à organização narcoterrorista, o que indica a limitação da atuação policial exclusivamente sobre o grupo", após citar o emprego de "força compatível" por parte das forças estaduais.
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Quanto à “perspectiva técnico-tática” dos suspeitos, o documento descreve “elevado poder bélico e métodos capazes de gerar risco letal difuso", mencionando fuzis automáticos de uso militar — dos calibres 5,56 x 45 mm, 7,62 x 39 mm e 7,62 x 51 mm — e "armas de altíssima potência", como a .30 e a .50. Por outro lado, os policiais estavam equipados com fuzis e pistolas semiautomáticos, por exemplo.
Rildo Anjos, consultor de segurança e especialista em armamento, explica que a diferença entre armas automáticas ou não está na capacidade de tiros disparados.
— Com um fuzil semiautomático, é tiro a tiro: a cada disparo, é preciso apertar o gatilho. Já o automático, à medida que está com o dedo no gatilho, ele está disparando — observa ele, ex-integrante das Forças Armadas.
Rildo também pontua que o fuzil 7,62 é mais letal e mais pesado que o 5,56, que, por sua vez, é adotado por facilitar o uso em becos e vielas, por ter uma plataforma menor. Já a .50 e a .30 não podem ser usadas pelas polícias, o que colocaria o criminoso em vantagem, e com armas que causam "dano colateral muito maior".
— O .50 é um fuzil sniper, de altíssima precisão, enquanto a .30 pode ser usada como antiaéreo — completa.
Dificuldades na perícia
Dezenas de corpos foram retirados por moradores da região da Vacaria, na Serra da Misericórdia, que liga a Penha ao Alemão, ao fim dos tiroteios, a partir da noite da segunda-feira passada.
Essa remoção, acompanhada da "descaracterização de corpos", são citadas por Castro, que aponta para “dificuldades significativas” na realização da perícia e a conservação de vestígios na cena do crime, mencionando área de mata de difícil acesso, assim como "limitações práticas inevitáveis, para além de qualquer perspectiva normativa abstrata". Uma "ofensiva contínua dos criminosos, com intenso confronto e ataques às forças de segurança", também foi citada como impeditivo para a estabilização da área e para atuação da Delegacia de Homicídios. Mas a polícia recolheu roupas dos mortos para exame residuográfico, realizou exame de necropsia detalhado, registro fotográfico e busca por fragmentos e projéteis de armas de fogo nos corpos, justifica Castro.
O que diz o governo
Em nota, o Governo do Estado pontua que o CV “utiliza equipamentos semelhantes aos usados em guerras, que não são autorizados para uso pelas forças policiais”. Ao mencionar armas de longo alcance, minas terrestres e granadas, o Palácio Guanabara observa ainda que “nenhum desses equipamentos pode ser utilizado por lei”, com a polícia sem poder usar granadas, nem drones com capacidade de ataque.
A estimativa é que haja entre 800 e mil fuzis em posse dos traficantes no Alemão e na Penha, segundo o governo, que pede que esses grupos criminosos sejam classificados como terroristas.
“Mesmo diante dessas limitações, as forças de segurança do Estado atuam com planejamento, inteligência e respeito absoluto à lei. Todas as ações são pautadas pela proporcionalidade e pela necessidade, com medidas que buscam reduzir riscos à população e às próprias equipes, protegendo tanto os policiais quanto os moradores.”

