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Conheça Leonardo Tonus, o nome do ensino da literatura brasileira na Sorbonne

Professor de uma das mais importantes universidades de Paris, ele conversou com o site RJ sobre vida, carreira e a sua mais nova aventura, um livro de poemas

O professor e escritor está no Brasil para lançar o seu primeiro livro O professor e escritor está no Brasil para lançar o seu primeiro livro  - Foto: Gustavo Gloria

Professor da universidade mais famosa de Paris, a Sorbonne, Leonardo Tonus é o nome do Brasil quando se fala em ensino de literatura nacional na capital da França. Há 30 anos no país europeu e há 18 lecionando, o brasileiro é destaque na área e agora aventura-se do outro lado das letras, como escritor. Reuniu os poemas que vem escrevendo ao longo da vida e os distribui nas 96 páginas do livro batizado de "Agora vai ser assim", que lança em várias cidades do País. Em papo com o site Roberta Jungmann, na biblioteca da Academia Pernambucana de Letras, o estudioso se revelou em citações, conhecimento e simpatia de sobra. Versou sobre si, sobre a expatriação e sobre a delícia que é estar imerso em histórias. 

Tonus é referência em Paris quando se fala em literatura brasileira

Tonus é referência em Paris quando se fala em literatura brasileira - Crédito: Gustavo Gloria

VIDA E CARREIRA

Filho de imigrantes italianos, Leonardo viveu a pluralidade de culturas desde cedo, em casa, no bairro de São Judas, em São Paulo. Com vizinhos de várias nacionalidades, ele pôde ter contato com costumes de outros lugares apenas atravessando a rua. A dupla nacionalidade foi decisiva para ir viver na Europa, em 1988. Tonus estudava música no Brasil, e esse foi o objetivo pelo qual viajou, inicialmente para Alemanha. Também cursava letras, voltado para alemão e latim, fundamentais para a formação de músico de coral.

Foi só na França que retornou à área de letras. Fez graduação e depois especializações em literatura brasileira, sempre com o olhar voltado para a figura do imigrante nas produções do nosso País. Seus trabalhos de mestrado, doutorado e livre-docência são todos voltados para a imigração, vista sob o olhar curioso e sensível de quem reconhece a importância do multiculturalismo e do resgate da humanidade.

Tonus é o nome da Sorbonne e de Paris quando se fala em ensino de literatura brasileira

Tonus é o nome da Sorbonne e de Paris quando se fala em ensino de literatura brasileira - Crédito: Gustavo Gloria

 

PRIMAVERA BRASILEIRA

A Primavera Brasileira, criada por Leonardo em 2014, transformou o modo como a literatura contemporânea produzida por aqui é vista lá fora. Com caráter pedagógico, para engajar alunos e apresentar as novas produções, o projeto leva autores brasileiros para a sala de aula em que ele leciona na Sorbonne. O intercâmbio literário e cultural foi tão rico que foi expandido, em 2016, para outros países da Europa, a exemplo de Alemanha, Holanda, Portugal, Espanha e Itália, e Estados Unidos. A decisão de internacionalizar o evento foi também política. "Apesar do português ser lecionado há muitos anos na Europa, esses departamentos são muito frágeis. Depende muito do fluxo do estudante, que é pequeno, e muitos acabaram por desaparecer. O objetivo era trazer os autores para dar visibilidade aos departamentos", explica.

Na hora do convite aos autores, Leonardo leva em consideração o desequilíbrio que existe no sistema literário. Há uma presença maciça de homens em relação a mulheres, uma disparidade regional, editorial. "Então eu busco paridade homem e mulher, a questão dos gêneros literários, é importante que não haja só o romance, diversidade regional, para que tudo não fique concentrado no eixo Rio-São Paulo-Porto Alegre, afrodescendentes, indígenas", justifica. 

Nome à frente da Primavera Brasileira, Leonardo criou o movimento para trazer a atenção dos alunos ao que é produzido no Brasil

Nome à frente da Primavera Brasileira, Leonardo criou o movimento para trazer a atenção dos alunos ao que é produzido no Brasil - Crédito: Gustavo Gloria

 

RELAÇÃO BRASIL E FRANÇA

Leonardo faz um balanço da presença da literatura brasileira na França. A relação um tanto desequilibrada, uma vez que era sempre o autor brasileiro que viajava para o país europeu no intuito de mergulhar e se banhar no conhecimento dos grandes mestres franceses, começa no século 19. E se intensifica com o Modernismo. Nos anos de 1950 e 1960, "Ocorre uma penetração maior da literatura brasileira na França", como explica Leonardo, principalmente por causa do boom da literatura latino-americana. E é Jorge Amado quem ganha maior destaque e começa a ser traduzido para o francês. Depois, é Clarice Lispector que aparece para os estrangeiros e começa a ser estudada nas universidades.

O professor faz questão de destacar, no entanto, que a relação ainda é muito frágil. "Em termos percentuais em tradução, ela [a literatura lusófona] conta 1%. E desse 1% é o Brasil que mais traduz", explica.

MERCADO EDITORIAL

Com as grandes editoras passando por um processo de renovação e adaptação ao novo mercado editorial, cercado intensamente pelos recursos digitais, as pequenas editoras, que trabalham de forma independente, com alcance mais local, regional, começam a ganhar corpo e força em todo o mundo. Para Tonus, a grande diferença deste mercado independente no Brasil e na França é que "As independentes, lá, conseguem um apoio governamental, estatal muito maior. Por conta de apoios e subsídios que são dados pelo estado regional e pelo estado nacional. Ou seja, tem organismos que funcionam diretamente com as editoras. Isso não há no Brasil, por isso as independentes ficam tão fragilizadas". 

 

O livro

O livro "Agora vai ser assim", primeiro de Tonus, revela o seu cuidado e apreço pelo tema imigração - Crédito: Gustavo Gloria

O LIVRO: "AGORA VAI SER ASSIM"

A diagramação arrojada, com um poema na capa e título e autor na parte de trás, em um azul que mais parece o encontro entre o mar e o céu, anuncia o convite à emoção e ao espanto que a obra faz ao leitor. Batizado de "Agora vai ser assim", a obra, publicada pela editora Nós, traz, logo nos versos-convite, o sentimento que circunda as palavras das suas 96 páginas - intensas, cortantes: "porque a partir de agora vai ser assim: / a palavra crua sem metáforas/ o pior de mim no teu olhar abolindo a distância entre / o visível e o dissimulado". 

 

"Entre", poema que estampa a capa do livro - Crédito: Gustavo Gloria 

 

Como perfeitamente define Cíntia Moscovich, que prefaciou a obra, "Sem ser previsível, Leonardo toma partido e assinala o lado do qual está. É quase um livro-denúncia, um dedo a apontar o malfeito, a aberração, o fato que se desvia do humanamente tolerável'.

 

"Agora vai ser assim", editado pela Nós - Crédito: Gustavo Gloria 

 

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