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OPINIÃO

Linguagem e comunicação jurídica em revista

O Conselho Nacional de Justiça (CNJ), Órgão cuja incumbência é a de “aperfeiçoar o trabalho do Judiciário brasileiro”, editou a Resolução nº 144, em 1º de setembro de 2023, a qual recomenda a utilização de “linguagem simples”, nas comunicações e atos editados pelos tribunais.

Embora o intuito seja, primordialmente, tornar acessível ao jurisdicionado (aquele recebe a jurisdição emanada dos juízes e tribunais), maior clareza e simplicidade nas comunicações jurídicas, o resultado disso não impactará tão significativamente, as decisões judiciais, se não for seguidas doutras recomendações.

Primeiro, porque não parece ser esse um entrave emergente à otimização do trabalho judicial, considerando a convivência hodierna com problemas maiores, relacionados, por exemplo, à prestação jurisdicional, os quais desafiam os operadores do Direito, a exemplo da demora processual, em grande parte justificada pelo reduzido número de servidores que integram o Poder Judiciário; em menor parte, sem justificativa plausível.

Segundo, porque a Recomendação não exime o jurisdicionado da indispensável assistência advocatícia, ainda que para o recebimento das devidas orientações jurídicas.

No dia-a-dia forense, esse encargo já faz parte do exercício de advogados e de defensores públicos, que patrocinam os interesses de seus clientes e assistidos (respectivamente), sendo raro se ter notícias de prejuízo às partes, por questões de incompreensão do vocabulário jurídico.

Embora a Recomendação estampe, claramente, o louvável objetivo de aproximar o usuário da Administração judiciária, bem como contempla o “Princípio da acessibilidade ao Judiciário”, consagrado no Artigo 5º, Inciso XXXV da Constituição federal, algumas outras recomendações devem acompanhar a adoção desse objetivo.

Uma delas é não se confundir a simplicidade ou a informalidade a ser adotada, com problemas de linguagem, com os quais convivemos, problematicamente, no cotidiano comum.

Em se tratando do espaço de utilização da linguagem jurídica, onde habita um vocabulário técnico “por excelência”, não se tem muita margem para relaxamento linguístico, sob pena de se comprometer a essência mínima dessa linguagem, que guarda inevitáveis diferenças com a linguagem comum, como em qualquer outro ramo técnico.

A Campanha para que se promova amplamente a Resolução já está no ar, estimulando os tribunais de todo o País, para que adiram ao “Pacto Nacional do Judiciário pela Linguagem Simples”, até o dia 31 de julho deste ano.

Embora a iniciativa seja de observância obrigatória para os magistrados em geral (juízes, desembargadores e Ministros das cortes superiores), ela só se tornará mais eficaz se houver, semelhantemente, a mesma adoção, por parte dos demais órgãos que integram as funções da Justiça (Advocacia, Defensoria pública e Ministério Público).

Pensando mais a fundo, seria de grande valia essa sincronização, dado que o usuário da Justiça é afetado, por distintos e quase sempre, inconciliáveis dizeres jurídicos.

Para que o grau de eficácia e de eficiência do Pacto, portanto, seja maior ainda, dever-se-ia encampar nas grades curriculares, noções ou disciplinas de linguagem e comunicação jurídica, as quais, inexplicavelmente, não compõem hoje a grade de disciplinas que os cursos jurídicos deveriam ter.

Essa revisão de linguagem, literalmente falando, perpassa o campo de atuação circunscrita aos atos e às comunicações provenientes dos juízes e tribunais, já que envolve os demais atores jurídicos, sendo, porquanto, de observância e zelo coletivos.
 

 

* Defensor público e professor

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