Montanhas, pedras e flores
Ao saber, ontem, e postar em primeira mão no meu blog, logo cedo, a morte de dona Magdalena Arraes, aos 95 anos, viúva do ex-governador Miguel Arraes, primeira-dama mais longeva do Estado, três mandatos conferidos pelo povo pernambucano ao seu marido, fiquei a matutar. O que escrever sobre a Dama da História, como a carimbou para a eternidade o jornalista e chargista Lailson de Holanda em seu livro em parceria com a historiadora Valda Colares?
Ela viu a França vencer o nazismo estrutural, escreveu, comovido, o publicitário baiano, meu amigo Edson Barbosa, que conviveu de perto com o neto dela, o ex-governador Eduardo Campos. Eu digo mais: dona Magdalena era como Cora Coralina, uma mulher a quem o tempo muito ensinou. Ensinou a amar a vida e não desistir da luta, nem mesmo quando Miguel Arraes foi golpeado pelos militares, exilando-se na Argélia.
Como Cora, ela recomeçou na derrota, renunciando às palavras e pensamentos negativos. Acreditou nos valores humanos de forma tão intensa, numa paixão tão avassaladora por Arraes, que foi mais do que madrasta dos oito filhos que já encontrou em seu novo lar, em razão da viuvez do amor da sua vida, que conheceu num outono da romântica e deslumbrante Paris.
Não convivi com Magdalena, mas de tão guerreira, passou a impressão de ter sido um espelho aos homens, por possuir o poder mágico e delicioso de refletir uma imagem do homem duas vezes maior que o natural. Sua família - filhos, enteados, netos e bisnetos - poderia escrever sobre a sua lápide: “Eu fui aquela mulher que fez a escalada da montanha da vida, removendo pedras e plantando flores”.
A frase, poética, também é de Cora Coralina, mas acho que a poetisa goiana escreveu por linhas tortas em homenagem à Dama da História pernambucana. As lutas e pedras removidas por Dona Magdalena Arraes nos servem de lições para o resto da vida, nos ajudam a aprender a viver.
Prêmio Nobel da Paz por seu serviço aos pobres, Madre Teresa de Calcutá, albanesa naturalizada indiana, fundadora da congregação das Missionárias da Caridade, tornou-se conhecida ainda em vida pelo codinome de "Santa das Sarjetas". Ela ensinou que ser mulher é acreditar sempre. Dona Magdalena se inspirava em Madre Teresa.
Como ela, seguiu em frente quando todos pararam. Acariciou oito filhos adotados e deu colo a mais dois filhos legítimos com Arraes. Dividiu-se em muitas, sem deixar de ser uma. Foi uma mulher encantadora. Nasceu forte, floresceu guerreira, cuidou, criou, sentiu, beijou, escutou, brincou com a vida. Foi uma mulher que respeitou seus próprios limites sem se sufocar.
*Jornalista