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NEGACIONISMO

Povoado uruguaio onde grupo religioso diz "não precisar" de vacinas é alertado para casos de sarampo

Profissionais de saúde oferecem vacinas em casas; colégios suspenderam aulas presenciais

Povoado de San Javier, em Río Negro, no UruguaiPovoado de San Javier, em Río Negro, no Uruguai - Foto: Louis Lalaguna/Wikimedia Commons

A localidade de San Javier (Río Negro), situada a 365 quilômetros de Montevidéu, é o epicentro dos casos de sarampo no Uruguai, em um cenário de aumento de contágios na região devido a uma lacuna vacinal, que voltou ao país por falhas na cobertura local. Há pessoas nascidas após 1967 que ainda não têm as duas doses necessárias, que fazem parte do esquema de vacinação obrigatório para evitar a doença.

O Ministério da Saúde Pública (MSP) anunciou até agora sete casos confirmados de sarampo, todos em San Javier. Seis contágios ocorreram em pessoas de diferentes idades que viajaram à Bolívia, onde há um aumento de casos, e que vivem na Colonia Ofir, onde praticamente não há cobertura vacinal, que alegam ser por motivos “religiosos”.

O sétimo caso confirmado é de um homem de 29 anos, por “transmissão local”, e colocou em risco a eliminação da transmissão endêmica do sarampo que o Uruguai ostenta desde 1999. Enquanto isso, há casos suspeitos em análise em várias cidades do país.

"Há um pouco de incerteza e preocupação sobre o que pode acontecer",  afirmou ao jornal El País o prefeito do município de San Javier, Washington Laco.

A situação vivida em San Javier acionou nas últimas horas uma busca intensa de casos suspeitos ou confirmados, somada a uma persistente campanha de vacinação para evitar mais casos de sarampo, que, segundo o MSP e especialistas médicos, é uma doença “grave” e “altamente contagiosa” pela via respiratória, transmitida pelas gotículas quando alguém tosse ou fala alto, mas que pode ser evitada com as duas doses da vacina.

O município de San Javier engloba o povoado de mesmo nome e as colônias rurais circundantes San Javier, Ofir e Doutor Luis Alberto de Herrera, onde vivem cerca de 2.500 pessoas ao todo. Devido aos casos de sarampo, foram suspensas nesta terça-feira as aulas presenciais em colégios locais.

"Por agora, se sugere não realizar eventos de fim de ano para evitar aglomerações. Tivemos uma aceitação muito boa das pessoas", acrescentou Laco.

Com o objetivo de cortar a transmissão, uma equipe do MSP de Montevidéu iniciou nesta quarta um rastreamento por todo o centro populacional de San Javier.

Com esse plano, 10 grupos, com cerca de 25 membros no total, percorrem casa por casa as 70 quadras do centro populacional de San Javier, onde vivem cerca de 1.800 pessoas. Está previsto que nesta quinta-feira concluam a ronda nas 10 quadras restantes e consigam encontrar pessoas que não estavam na primeira visita.

Laco explicou que a medida implicou fornecer a “cada um” dos habitantes uma “informação personalizada”, explicando o que estava ocorrendo em San Javier com o sarampo, os sintomas (febre, erupção cutânea, rinite, tosse ou inflamação ocular), as precauções que devem ser tomadas e o chamado para revisar o esquema de vacinação.

Os grupos de busca e informação de casos foram acompanhados por duas equipes móveis de vacinação. No primeiro dia, 30 pessoas foram vacinadas contra o sarampo em suas casas com as equipes móveis, e cerca de 40 foram à policlínica após constatar que tinham apenas uma ou nenhuma das duas doses. Desde 20 de novembro, começou a campanha de vacinação, que vem tendo “muito boa resposta” das pessoas, acrescentou o prefeito.

Paralelamente à busca para conter a transmissão, há queixas entre os moradores de San Javier contra a Colonia Ofir. — Há um certo mal-estar, comum, de que o sarampo tenha chegado por essas pessoas que não se vacinaram e não querem se vacinar — afirmou o prefeito.

Com o panorama de que a população de Ofir “continua sustentando que não vai se vacinar”, a intenção é que as pessoas da localidade “tomem os devidos cuidados, se vacinem e adotem precauções para evitar os contágios”.

A colônia Ofir foi fundada há 30 anos por imigrantes russos, onde vivem cerca de cem pessoas, desconectadas das redes sociais, usando vestimentas do século XIX, e pertencendo a uma comunidade religiosa chamada starovery, advinda de russos ortodoxos separados da igreja oficial e que seguem a liturgia antiga.

Em entrevista ao El País, Marcos Chuprov, integrante de Ofir, destacou que os seis casos confirmados de sarampo não ocorreram na zona central da colônia, mas foram pessoas da mesma comunidade russa que vivem a cerca de 8 quilômetros de distância.

"Eu não tenho telefone com WhatsApp. Meu sobrinho me mostrou. Dizem que publicaram como se a Colônia Ofir estivesse com o problema de sarampo, mas a colônia não teve problema nenhum; foi afetada pelo problema de um vizinho", disse Chuprov.

Apesar da opinião de Chuprov, diversos estudos médicos, assim como o impacto da vacinação na população uruguaia e internacional ao longo dos anos, confirmam que a vacina contra o sarampo é segura, não gera contraindicações e é efetiva nos grupos para os quais as autoridades recomendam sua aplicação. Sua inclusão no calendário nacional de vacinação reforça a eficácia dessas doses.

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