Sex, 05 de Dezembro

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Defesa de Heleno reclama em julgamento no STF de "excesso de documentos" apresentado pela PF

Primeiro dia teve recados de Moraes e PGR reforçando a acusação

O advogado Matheus Milanez, que representa o ex-ministro Augusto Heleno (Gabinete de Segurança Institucional), reclamou nesta quarta-feira que o material colhido pela Polícia Federal O advogado Matheus Milanez, que representa o ex-ministro Augusto Heleno (Gabinete de Segurança Institucional), reclamou nesta quarta-feira que o material colhido pela Polícia Federal  - Foto: Gustavo Moreno/STF

O advogado Matheus Milanez, que representa o ex-ministro Augusto Heleno (Gabinete de Segurança Institucional), reclamou nesta quarta-feira que o material colhido pela Polícia Federal durante a investigação foi apresentado de maneira "desordenada". A defesa pede a absolvição do general.

Milanez mostrou em uma apresentação de slides que as provas foram disponibilizadas em meio a "uma montanha de documentos, excesso de documentos com nomes que não se entende".

O advogado alegou, ainda, nulidade do sistema acusatório, ao afirmar que a maior parte das perguntas realizadas no dia do interrogatório foi o ministro relator. Segundo Milanez, enquanto o Ministério Público fez 59 perguntas, Moraes fez 302.

— Nós temos uma postura ativa do ministro relator de investigar. Qual é o papel do juiz julgador? Ou é o juiz inquisitor? O juiz é imparcial, por que o magistrado tem a iniciativa de pesquisar as redes sociais da testemunha? — disse Milanez.

A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) retomou o julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro e os outros sete réus no processo da trama golpista. A manifestação da defesa de Heleno será seguida pelas argumentações dos advogados do ex-mandatário e dos ex-ministros Paulo Sérgio Nogueira (Defesa) e Braga Netto (Defesa e Casa Civil).

No primeiro dia de julgamentos, o ministro Alexandre de Moraes, relator do caso, criticou a ofensiva antidemocrática e, em seguida, leu o relatório, reunindo os principais pontos do caso. Depois, o procurador-geral da República, Paulo Gonet, reforçou a acusação.

 

Em seguida, foi a vez de se manifestarem as defesas do tenente-coronel Mauro Cid; do deputado federal Alexandre Ramagem, ex-chefe da Agência Brasileira de Inteligência (Abin); do ex-comandante da Marinha Almir Garnier; e dos ex-ministros Anderson Torres (Justiça).

Defesa de Heleno
Heleno não compareceu ao plenário do STF e acompanha o julgamento a partir de sua casa, em Brasília. Sua defesa obteve a autorização do relator da ação penal da trama golpista, ministro Alexandre de Moraes, para apresentar slides e vídeos durante a sustentação oral. O material foi encaminhado previamente à secretaria da Corte para checagem técnica.

Em declarações recentes, Milanez disse acreditar em uma absolvição do general e afirmou ter “provas robustas” em favor do general. A defesa argumenta que Heleno se afastou de Jair Bolsonaro a partir do segundo ano de governo e que não há provas de que tenha participado de qualquer articulação golpista. A defesa também questiona o uso de anotações de uma agenda de Heleno, com o logotipo da Caixa Econômica Federal, apreendida pela PF e usada para lhe imputar participação na trama golpista. Milanez disse que a agenda era apenas um apoio à memória e que seu conteúdo jamais foi compartilhado com outras pessoas.

A Procuradoria-Geral da República (PGR), porém, incluiu Heleno entre os oito réus e o acusou de fomentar a narrativa de descrédito ao sistema eleitoral. A denúncia afirma que ele incentivou o uso da Advocacia-Geral da União (AGU) para respaldar o descumprimento de decisões judiciais e que suas anotações pessoais faziam referência a hipóteses de ruptura institucional. “As falas públicas de Augusto Heleno não deixam dúvidas de sua inclinação a ideias que desafiam a harmonia institucional”, escreveu a PGR na denúncia.

O general nega as acusações e declarou que “nunca defendeu qualquer atitude ilegal”. Ele responde por tentativa de golpe de Estado, tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, participação em organização criminosa armada, dano qualificado ao patrimônio da União e deterioração de patrimônio tombado.

Recados de Moraes
A primeira fala de Moraes teve uma defesa da Corte na condução do processo e críticas à pressão do governo dos Estados Unidos e à defesa de uma anistia para os envolvidos nos atos do 8 de janeiro.

Moraes ainda fez um aceno ao ministro Luiz Fux, principal esperança de divergência entre as defesas, e citou o inquérito aberto contra o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP), que levou à prisão domiciliar de Bolsonaro.

Antes da leitura do relatório, tradicionalmente a primeira etapa do julgamento, Moraes fez uma declaração inicial, tratando de diversos aspectos da tramitação da ação penal e rebatendo críticas e pressões. Depois leu o relatório, uma espécie de resumo de todo o processo até aqui.

Sem citar diretamente os pedidos de anistia, Moraes afirmou que a "impunidade, a omissão e a covardia não são opções para a pacificação". Os defensores de um perdão para os envolvidos nos atos golpistas do 8 de janeiro costumam citar como objetivo a "pacificação" do país.

— A História nos ensina que a impunidade, a omissão e a covardia não são opções para a pacificação. Pois o caminho aparentemente mais fácil, e só aparentemente, que é da impunidade, que é da omissão, deixa cicatrizes traumáticas na sociedade.

Moraes também afirmou que foi descoberta uma "verdadeira organização criminosa" que teria tentado coagir o STF e submetê-lo "ao crivo de outro Estado estrangeiro".

— Lamentavelmente, no curso da ação penal se constatou a existência de condutas dolosas e conscientes de uma verdadeira organização criminosa, e de forma jamais vista anteriormente em nosso país, passou a agir de covarde e traiçoeira, com a finalidade de tentar coagir o Poder Judiciário, em especial esse Supremo Tribunal Federal e submeter o funcionamento da Corte ao crivo de outro Estado estrangeiro.

O governo do presidente Donald Trump cassou os vistos da maioria dos ministros do STF e ainda incluiu Moraes na Lei Magnitsky, que prevê restrições econômicas, como o bloqueio de contas bancárias e de bens que tenham relação com o sistema financeiro americano. Além disso, o julgamento de Bolsonaro foi citado por Trump como um dos motivos para aplicar uma tarifa de 50% em produtos brasileiros.

— A história desse Supremo Tribunal Federal demonstra que jamais faltou ou jamais faltará coragem aos seus membros para repudiar as agressões contra os inimigos da soberania nacional, da democracia, do Estado de Direito ou da independência do Poder Judiciário — acrescentou o magistrado.

Gonet: tudo foi "documentado"
Gonet, ao defender a condenação dos oito réus, afirmou que a ofensiva, para ser caracterizada, não precisa de uma "ordem assinada pelo presidente". De acordo com ele, toda a ofensiva foi "documentada" pelos acusados.

— Para que a tentativa se consolide não é indispensável que haja ordem assinada pelo presidente da República. Não é preciso esforço intelectual extraordinário para reconhecer que, quando o presidente da República e depois o ministro da Defesa convocam a cúpula militar para apresentar documento de formalização de golpe de Estado, o processo criminoso já está em curso — disse Gonet.

Um dos argumentos da defesa de Bolsonaro é que não houve ordem formal, como um decreto assinado, de qualquer medida buscando uma ruptura institucional.

Gonet afirmou que documentos encontrados com os investigados previam "medidas de intervenção inaceitáveis constitucionalmente". O ex-presidente admite ter conversado com os comandantes das Forças Armadas sobre alternativas ao resultado eleitoral, mas alega que foram discutidos apenas instrumentos previstos na Constituição.

— Havia previsão de medidas de intervenção, inaceitáveis constitucionalmente, sobre o exercício das atividades do Poder Judiciário, elaboração de estrutura de poder a ser construída no desenrolar do golpe, bem como acertos de prisões espúrias e substituição de titulares de cargos públicos.

Gonet ressaltou que a investigação reuniu uma série de provas da atuação pela tentativa de golpe e que Bolsonaro "incitava a animosidade contra o Judiciário e seus integrantes":

— A organização criminosa documentou, como dito, a quase totalidade das ações narradas na denúncia por meio de gravações, manuscritos, arquivos digitais, planilhas e trocas de mensagens eletrônicas, tornando ainda mais perceptível a materialidade delitiva. Encontra-se materialmente comprovada a sequência de atos destinados a propiciar a ruptura da normalidade do processo sucessório — afirmou Gonet

O que diz a defesa de Bolsonaro
Nas alegações finais apresentadas ao STF, a defesa de Bolsonaro voltou a pedir a anulação da delação premiada do tenente-coronel Mauro Cid. Além disso, alegou que não há provas contra o ex-presidente.

"Não existe texto, decreto ou minuta prevendo a prisão de qualquer autoridade. Não existe decreto assinado. Não existe pedido de movimentar as tropas nem pedido a quem possa assim fazer. Não existe prova do golpe imaginado pela acusação", afirmam os advogados.

Para refutar tese de articulação em prol do golpe, a defesa afirmou que Bolsonaro "de pronto determinou" a sucessão de governo para o presidente Lula. E destacou o seu estado de saúde no fim de 2022, no qual ele se apresentava como alguém "monossilábico", "abatido" e que mal conseguia "se movimentar" por causa da infecção na perna, de acordo com o depoimento de testemunhas.

"A transição ocorreu – por ordem do então presidente – de forma eficaz, pacífica e imediata. Sem intercorrências; sem qualquer dificuldade; e em todas as áreas, inclusive na área militar", diz o texto.

A defesa também declara que a PGR atribui a Bolsonaro "como se atos criminosos fossem, os seus discursos eleitorais e suas manifestações com críticas ao sistema eletrônico de votação". Essas falas seriam apenas "manifestação de opinião política".

O que está em discussão?
O ponto central a ser debatido pela Primeira Turma do STF, composta pelos ministros Alexandre de Moraes, Cármen Lúcia, Cristiano Zanin, Flávio Dino e Luiz Fux, é o plano golpista. De acordo com a PGR, foi arquitetado um complô para reverter o resultado da eleição, contrariando a Constituição, para manter Bolsonaro no poder. A investida só não teria ido adiante, mesmo com apoio de alguns militares, porque os então comandantes do Exército, Freire Gomes, e da Aeronáutica, Baptista Júnior, rejeitaram colocar as tropas à disposição do ex-presidente. O processo também representa um marco para a caserna, porque pode levar pela primeira vez à prisão de integrantes das Forças Armadas por atentado à democracia.

Quais os crimes?
Os réus respondem por cinco crimes: organização criminosa armada, abolição violenta do Estado Democrático de Direito, tentativa de golpe de Estado, dano qualificado ao patrimônio da União e deterioração de patrimônio tombado.

A tramitação com relação às duas últimas imputações foi suspensa em relação a Ramagem por decisão da Câmara, já que os crimes foram cometidos após a diplomação dele como parlamentar, prerrogativa que a Constituição dá ao Congresso.

Veja as datas do julgamento

3 de setembro: 9h

9 de setembro: 9h

9 de setembro: 14h

10 de setembro: 9h

12 de setembro: 9h

12 de setembro: 14h

Quais as próximas etapas?
Na semana que vem, será a vez dos votos dos ministros, começando por Moraes, que será o relator. Os ministros também vão decidir, em caso de condenação, qual pena será aplicada a cada um dos réus.

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