Sex, 05 de Dezembro

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Governo avalia que EUA fizeram inflexão, mas mantém cautela antes de encontro entre Lula e Trump

Segundo interlocutores, Washington pode ter optado pelo pragmatismo em relação com o Brasil

Lula deve se encontrar com Trump presencialmenteLula deve se encontrar com Trump presencialmente - Foto: Antonio Cruz/Agência Brasil; Jim Watson/AFP

No governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, há uma avaliação de que os Estados Unidos estão corrigindo a rota por uma razão essencialmente pragmática: Washington teria percebido que não pode continuar relegando a relação com o Brasil. A confirmação desse novo rumo, contudo, dependerá do aguardado encontro presencial entre os dois líderes, previsto para ocorrer na Malásia.

Essa leitura ganhou força após a conversa telefônica entre Lula e o presidente dos EUA, Donald Trump, na manhã da última segunda-feira. Trump já havia sinalizado uma possível mudança de postura da Casa Branca uma semana antes, ao se encontrar rapidamente com o mandatário brasileiro, durante a reunião da Assembleia Geral da ONU, em Nova York.

Interlocutores do governo brasileiro avaliam que a política de pressão conduzida pela Casa Branca não produziu os resultados esperados. Ainda assim, defendem cautela, à espera das próximas conversas entre autoridades dos dois países.

Para observadores e pessoas próximas às negociações, a mudança de tom dos EUA pode ser explicada por dois fatores principais. O primeiro é que o comércio exterior brasileiro resistiu sem grandes abalos, as instituições políticas seguiram funcionando — como evidenciado pelo julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro no Supremo Tribunal Federal (STF) — e Lula viu sua popularidade crescer mesmo sob o peso do tarifaço. O segundo é o temor de que o afastamento de Washington empurre o Brasil para uma aproximação maior com potências rivais, como a China e a Rússia.

Dawisson Belém Lopes, professor de Política Internacional e Comparada da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), lembra que, até recentemente, Washington mantinha uma postura mais dura com o Brasil, marcada por sanções unilaterais, comerciais e individuais contra produtos e autoridades brasileiras. Agora, diz ele, o momento é de “correção de rumos”: em vez do porrete, a fala mansa; no lugar da imposição, o diálogo.

— Para evitar que o Brasil se distancie ainda mais da Casa Branca e se aproxime de rivais como China e Rússia, Trump substituiu o porrete pela fala mansa. A diplomacia brasileira, contudo, não dá mostras de que vá baixar a guarda. Cada passo na coreografia será cuidadosamente estudado daqui em diante. Não há margem para amadorismo — afirma Lopes.

Vice-presidente do Centro Brasileiro de Relações Internacionais (Cebri) e experiente negociador comercial, o embaixador José Alfredo Graça Lima vê a nova postura de Trump como um possível teste, lembrando que o comércio se orienta, acima de tudo, pela lógica da oferta e da demanda. Para ele, o ponto central é descobrir o que os EUA realmente pretendem do Brasil.

— Os EUA sabem o que o Brasil quer. Porém, o Brasil não sabe ao certo o que querem os EUA. Vamos ver o que Marco Rubio tem a dizer — questiona Graça Lima.

Nos bastidores de Brasília, a avaliação é que, enquanto o Brasil busca o fim do tarifaço e das sanções impostas a cidadãos brasileiros, os americanos demonstram interesse em áreas estratégicas, como minerais críticos e regulação das grandes plataformas digitais — um conjunto amplo de temas que deverá pautar as negociações bilaterais. Assessores de Lula afirmam que o foco agora é evitar a retomada da escalada de tensão.

Para o professor Lucas Martins, especialista em História Americana e Estudos Globais da Temple University, na Filadélfia, o momento é favorável ao governo brasileiro. Segundo ele, o componente ideológico que travava avanços na relação com Washington ficou para trás.

— Estamos de volta à normalidade e discutindo relações comerciais com os Estados Unidos. O Brasil é o mais importante parceiro comercial norte-americano na América do Sul. Não há disputa ideológica que resista à pressão de empresas de ambos os países, cujas relações são, em muitos casos, centenárias — ressalta Martins.

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