Discursos históricos marcaram a trajetória de líderes políticos
Pernambuco
Cercado no Palácio do Campo das Princesas, após a deflagração do regime militar, em 1964, o governador Miguel Arraes preparou um discurso de despedida. Antes da ordem de prisão, no dia 1º de abril, ele gravou uma mensagem aos pernambucanos, que deveria ser distribuída pelas rádios do estado, mas não pôde ser entregue, pois os veículos de comunicação estavam ocupados por militares. Nela, Arraes negou que iria renunciar ao mandato que lhe foi outorgado pelo povo pernambucano.
"Sei que cumpri até agora o meu dever para com o povo pernambucano, sei que estou fiel aos princípios democráticos e à legalidade e à Constituição que jurei cumprir. Deixo de renunciar ou de abandonar o mandato, porque ele está com minha pessoa e me acompanhará enquanto durar o prazo que o povo me concedeu e enquanto me for permitido viver", disse o governador deposto.
Brasil
No dia 13 de março daquele ano, o presidente João Goulart também fazia seu último grande discurso, antes de ser deposto pelo regime militar. O caso dele é particular, pois sua fala no famoso Comício da Central do Brasil, no Rio, não foi programada para ser a última. Mas foi. Nela, ele defendeu as reformas de base propostas por seu governo.
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"Democracia para esses democratas não é o regime da liberdade de reunião para o povo: o que eles querem é uma democracia de povo emudecido, amordaçado nos seus anseios e sufocado nas suas reivindicações. A democracia que eles desejam impingir-nos é a democracia antipovo, do antissindicato, da antirreforma, ou seja, aquela que melhor atende aos interesses dos grupos a que eles servem ou representam. A democracia que eles querem é a democracia para liquidar com a Petrobrás; é a democracia dos monopólios privados, nacionais e internacionais, é a democracia que luta contra os governos populares e que levou Getúlio Vargas ao supremo sacrifício", disse o ex-presidente, que teve seu mandato cassado no dia 31 de março.
"E podeis estar certos, trabalhadores, de que juntos o governo e o povo – operários , camponeses, militares, estudantes, intelectuais e patrões brasileiros, que colocam os interesses da Pátria acima de seus interesses, haveremos de prosseguir de cabeça erguida, a caminhada da emancipação econômica e social deste país", acrescentou Goulart, na ocasião.
Chile
No dia 11 de setembro de 1973, o então presidente do Chile, Salvador Allende, recebia a informação de que havia sido instalado um levante de militares em Valparaíso. O Palácio La Moneda, então, passou a ser bombardeado pelos militares, mas o presidente se negou a se entregar. Em seu último discurso, divulgado pela rádio Magallanes, revelou que "a semente que entregamos à consciência digna de milhares e milhares de chilenos, não poderá ser ceifada definitivamente".
"Seguramente, esta será a última oportunidade em que poderei dirigir-me a vocês. A Força Aérea bombardeou as antenas da Rádio Magallanes. Minhas palavras não têm amargura, mas decepção. Que sejam elas um castigo moral para quem traiu seu juramento”, disse.
“Diante destes fatos só me cabe dizer aos trabalhadores: Não vou renunciar! Colocado numa encruzilhada histórica, pagarei com minha vida a lealdade ao povo. E lhes digo que tenho a certeza de que a semente que entregamos à consciência digna de milhares e milhares de chilenos, não poderá ser ceifada definitivamente. (Eles) têm a força, poderão nos avassalar, mas não se detém os processos sociais nem com o crime nem com a força. A história é nossa e a fazem os povos”, colocou o presidente, que resistiu ao cerco, mas terminou morto pelos militares.
África
Preso em 1962 pela sua luta contra o apartheid na África do Sul, Nelson Mandela também se dirigiu ao povo, em seu discurso proferido no Julgamento de Rivônia, na Suprema Corte da Pretória. "Dediquei toda minha vida a esta luta do povo africano. Lutei contra o domínio branco e lutei contra o domínio negro. Defendi e prezo a ideia de uma sociedade democrática e livre, em que todas as pessoas convivam em harmonia e com oportunidades iguais. É um ideal para o qual eu espero viver e que espero ver realizado. Mas, Meritíssimo, se preciso for, é um ideal pelo qual estou disposto a morrer”, disse Mandela, que ficou preso por 27 anos.
Em 1991, ele foi eleito o presidente do Congresso Nacional Africano, principal partido negro do país, que havia sido extinto nos anos 60 e recém retomava as atividades. Em 27 de abril de 1994, foi eleito presidente nas primeiras eleições multirraciais do país, colocando um ponto final no regime segregacionista que governara a África do Sul por 46 anos.






