Prisão por violência de gênero em Toritama é resultado de lei aprovada em 2021
Vereadora prestou queixa em delegacia e juiz decidiu pela preventiva do acusado
Na primeira eleição municipal a contar com uma lei para prevenir, reprimir e combater a violência política contra as mulheres, a prisão preventiva de José Claudemir de Oliveira, conhecido como Sinal, diretor de feiras da cidade de Toritama, reacende a questão da violência de gênero. Mostra pequenos avanços e a insuficiência da lei aprovada em 2021 .
Ele foi preso na última terça-feira, no Agreste pernambucano, após denúncias da vereadora Carol Gonçalves (PSDB), 28 anos. A vítima afirma que desde 2023, quando passou a ser oposição, vem sendo alvo de ataques por parte do diretor. Segundo ela, Sinal usou as rádios locais em várias oportunidades para distorcer informações sobre sua atuação política.
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Chegou a afirmar que ela teria usado recursos públicos para fazer uma viagem ao México, em 2022, a fim de discutir mudanças climáticas. E não teria pedido licença para afastar-se da Câmara. A viagem aconteceu. Mas a vereadora nega o uso indevido de verba. Assegura também ter comunicado à Casa, embora nem fosse necessário, porque o prazo era curto.
A situação, sustenta Carol Gonçalves, agravou-se este ano, quando o acusado passou a taxá-la de usuária de cocaína e recorreu a fotos de suas redes sociais para fazer montagens e constrangê-la publicamente. A parlamentar, em seu primeiro mandato, prestou queixa na delegacia por ‘injúria eleitoral’.
“Era uma tentativa de conter o dano. Eu estava com medo de sair às ruas até para panfletar”, afirma a candidata à reeleição.
Justiça
Em audiência na última terça-feira (10), no fórum de Toritama, a promotora Wanessa Kelly Almeida Silva e o juiz Marcos José de Oliveira atentaram para a gravidade do fato. Depois de o réu, sobre quem pesam outras 16 ações, recusar retratar-se, as autoridades consideraram a denúncia ‘crime de violência eleitoral’. O magistrado expediu mandado de prisão e Sinal foi levado ao presídio de Santa Cruz do Capibaribe, município vizinho.
“A Justiça mostrou que não tolera esse tipo de comportamento, especialmente contra mulheres que, como eu, estão na política para promover mudanças com respeito e democracia”, registrou a vereadora no Instagram.
Para o Instituto Alziras, que defende ampliar a participação de mulheres na política, a realidade está longe de ser confortável. "Desde 2021, foram monitorados 175 casos de violência política de gênero e apenas 12 viraram ações penais eleitorais. Houve só uma condenação até janeiro de 2024”, aponta.
Os dados constam do Relatório Monitor da Violência Política de Gênero e Raça, publicado pelo Observatório Nacional da Mulher da Política da Câmara dos Deputados, em conjunto com o Instituto Alziras e a Agência Francesa de Desenvolvimento.
O advogado de defesa Denys Ricardo de Oliveira Alves não foi localizado na tarde desta quarta-feira (11). Até o início da noite, Sinal continuava preso.
Canal para denúncia
A denúncia de Toritama não foi formalizada junto ao Tribunal Regional Eleitoral (TRE-PE), que dispõe de um canal para isso. Segundo a assessoria de comunicação, se o registro aconteceu em uma delegacia, leva um tempo para chegar ao órgão.
O.Tribunal informa também ser possível denunciar casos de violência política de gênero diretamente no site do TRE-PE. Basta acessar a página da "Ouvidoria da Mulher" (clique aqui) e escolher um dos canais de atendimento disponíveis: telefone, e-mail ou formulário eletrônico. Em todos os casos, o sigilo e a privacidade da denúncia são garantidos.
Deputado federal Túlio Gadêlha (Rede) Foto: DivulgaçãoParlamento
O deputado federal Túlio Gadêlha (Rede), que apoia a reeleição de Carol Gonçalves, usou as redes sociais para, dirigindo-se aos eleitores do município, denunciar o que chamou de machismo na política.
"Se tem uma coisa que tem me impressionado da política de Toritama é o quão machista tem sido alguns vereadores, atacando mulheres e, principalmente, quão baixo é o nível dessas pessoas que tentam, muitas vezes, afastar as mulheres da política", sustentou.
O deputado também destacou a coragem da parlamentar para lidar com a situação. "Ela tem tido coragem para enfrentar esse machismo e essa misoginia que parece que prolifera na Câmara Municipal de Toritama", destacou, pedindo voto para a candidata. "É a melhor para a juventude, para a mulher, para o meio ambiente e para Toritama"
Deputada Benedita da Silva Foto: DivulgaçãoNa mesma terça-feira (10) da prisão em Toritama, a Secretaria da Mulher da Câmara dos Deputados, o Grupo de Trabalho de Prevenção e Combate à Violência Política de Gênero da Procuradoria-Geral Eleitoral e o Conselho Nacional de Secretários de Segurança Pública assinaram, em Brasília, um protocolo que estabelece diretrizes para o enfrentamento da violência política contra a mulher.
A ideia é aprimorar o recebimento de denúncias nos estados e municípios. Coordenadora da bancada feminina na Câmara, a deputada Benedita da Silva (PT-RJ) afirmou que o protocolo é necessário porque a violência política não está sendo devidamente enfrentada.
“Precisamos falar do que não acontece, do não recebimento das denúncias, do não acolhimento dos relatos das mulheres. Vamos falar da demora e dos equívocos no julgamento dos casos”, apontou. “Só assim conseguiremos pressionar quem precisa ser pressionado para que a mudança radical aconteça na nossa política”, acrescentou.



