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Confusão entre CPF e CNPJ ainda é armadilha para pequenos negócios

Especialista alerta que a mistura entre finanças pessoais e empresariais é um dos principais fatores

Pesquisa Censo Agências 2024 revela que somente 36,14% dos gestores se dedicam regularmente à administração de seus negóciosPesquisa Censo Agências 2024 revela que somente 36,14% dos gestores se dedicam regularmente à administração de seus negócios - Freepek

Por trás de muitos negócios que não conseguem prosperar está uma falha recorrente, mas ainda pouco discutida com a profundidade necessária: a ausência de uma gestão financeira que respeite a separação entre o que pertence à pessoa física e o que diz respeito à empresa. De acordo com Azenate Xavier, contadora e fundadora da Azenate Soluções Contábeis, essa é uma das principais causas de descontrole financeiro e colapso de micro e pequenos empreendimentos.

“A confusão entre CPF e CNPJ é mais do que uma prática equivocada, é uma cultura enraizada entre muitos empreendedores brasileiros, especialmente os que começam a empreender por necessidade, sem preparo técnico”, afirma. “E ela tem consequências graves.”

Dados do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) revelam que mais de 50% dessas empresas encerram suas atividades antes de completarem cinco anos. Entre os principais motivos está a má gestão financeira. Para Azenate, o problema está menos na falta de lucro e mais na falta de organização.

“É comum o empreendedor acreditar que todo dinheiro que entra no caixa é lucro, e que ele pode usá-lo para pagar contas pessoais ou cobrir despesas familiares. Mas esse comportamento impede a construção de capital de giro, a reinversão no próprio negócio e a análise real da rentabilidade”, explica.

Ela destaca que muitos pequenos empresários sequer definem um pró-labore, tornando suas finanças pessoais totalmente dependentes da saúde da empresa. Quando há queda no faturamento, todo o orçamento familiar é afetado, e o desespero leva a mais retiradas aleatórias, criando uma espiral que compromete o futuro do negócio.

Para Azenate Xavier, contadora. Foto: Divulgação. 

Ilusão 

Outro ponto crítico, segundo a contadora, é o fato de que muitos microempreendedores individuais (MEIs) e empresários de pequeno porte ainda mantêm seus negócios em uma zona nebulosa entre o formal e o informal. Apesar de possuírem um CNPJ, continuam operando como se a empresa fosse uma extensão de si mesmos. Não emitem nota fiscal, não fazem controle de estoque e usam o mesmo cartão de crédito para gastos pessoais e empresariais.

“Mesmo com CNPJ aberto, muitos continuam operando como se fossem uma extensão de si mesmos. Não emitem nota fiscal, não fazem controle de estoque, usam o mesmo cartão de crédito para tudo. Isso os expõe a riscos fiscais e jurídicos”, alerta.

Além das consequências legais, essa postura afeta a imagem da empresa perante o mercado.

“Empresas desorganizadas não conseguem crédito, não conseguem investidores, não inspiram confiança. A profissionalização da gestão começa pela separação clara entre o que é da empresa e o que é do dono”, ressalta Azenate.

Passos

A especialista defende que a educação financeira empresarial precisa fazer parte da rotina do empreendedor desde o início da jornada. Algumas ações simples podem ajudar a corrigir essa rota. Entre elas, está a criação de uma conta bancária exclusiva da empresa, inclusive para MEIs, com movimentações estritamente ligadas à atividade empresarial; a definição de um pró-labore mensal, ainda que simbólico no início, para disciplinar a retirada de valores; o uso de ferramentas simples de controle financeiro, como planilhas ou aplicativos, para registrar entradas, saídas, custos fixos e variáveis; além da busca por consultoria contábil desde o início, mesmo que esporádica, para garantir que as obrigações legais estão sendo cumpridas e para auxiliar na leitura correta dos números do negócio.

“Separar CPF de CNPJ não é uma exigência burocrática, é uma estratégia de sobrevivência”, reforça Azenate. “E quanto antes o empreendedor perceber isso, maiores serão as chances de construir um negócio sustentável, resiliente e lucrativo.”

Erros

Azenate Xavier também elenca os equívocos mais frequentes que comprometem a saúde financeira de pequenos negócios: usar a conta bancária da empresa como conta pessoal; não definir um pró-labore fixo, o que torna as finanças vulneráveis a saques aleatórios; pagar contas da empresa com cartão pessoal (e vice-versa), gerando confusão contábil e riscos fiscais; misturar bens da empresa com bens pessoais, o que pode causar complicações legais em caso de fiscalização ou processos judiciais; e ignorar o controle financeiro por acreditar que o negócio ainda é “pequeno demais”, quando, na verdade, é justamente nessa fase que os hábitos corretos devem ser formados.

A mensagem central da especialista é clara: enquanto o empreendedor não enxergar a empresa como uma entidade separada da própria vida pessoal, o risco de fracasso continuará alto, mesmo que o negócio tenha potencial para crescer.

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