Sex, 05 de Dezembro

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Marcella Balthar

E como fica a saúde mental? O grito silencioso da emergência climática no Brasil

O Brasil vive recordes alarmantes de desastres climáticos. Enchentes devastam o Rio Grande do Sul, secas históricas assolam a Amazônia e o Pantanal sofre com incêndios que destroem ecossistemas inteiros. Ao mesmo tempo, cresce uma crise silenciosa e menos visível: o colapso da saúde mental coletiva.

No Rio Grande do Sul, pesquisa realizada pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) revelou que 91% das pessoas atingidas pelas enchentes apresentam sintomas de ansiedade, 50% desenvolveram depressão e 60% sofrem de burnout. Entre aqueles com renda de até R$ 1,5 mil, 100% relatam ansiedade e 70% têm sintomas de depressão e esgotamento. Em regiões atingidas por queimadas e secas, como no Pantanal, relatos mostram medo constante e sensação de impotência diante de fenômenos que se repetem ano após ano.

A ecoansiedade, definida pela Associação Americana de Psicologia como o medo crônico de uma catástrofe ambiental, já faz parte do cotidiano de milhões de brasileiros. Seus efeitos vão muito além da preocupação: afetam o sono, a produtividade, as relações sociais e, de forma ainda mais grave, a saúde mental de crianças e adolescentes. Segundo o UNICEF, parte significativa das crianças sofrem depressão após vivenciarem um desastre climático extremo, manifestando insegurança, pesadelos, tristeza e perda de apetite. Estudos na Amazônia e no Centro-Oeste apontam que mais da metade dos adolescentes já foi diretamente afetada por eventos extremos e que pais e professores também apresentam altos índices de sofrimento psicológico.

Apesar das recomendações da Organização Mundial da Saúde para que a saúde mental seja integrada aos planos nacionais de enfrentamento às mudanças climáticas, a resposta brasileira ainda é fragmentada. A expansão dos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) e a criação de canais como a Linha Vida são avanços importantes, mas insuficientes diante da escala do problema. Em muitas regiões, o atendimento se resume à medicalização, sem acompanhamento terapêutico capaz de oferecer suporte integral e prolongado.

O impacto econômico dos desastres climáticos já é bilionário, mas os custos invisíveis para a saúde mental continuam fora das contas oficiais. No Rio Grande do Sul, apenas as enchentes de 2024 geraram perdas bilionárias economicamente, mas o trauma coletivo que acompanha essa destruição não aparece nas planilhas. Sem ações preventivas e estruturantes, cada novo evento extremo reforça o ciclo de vulnerabilidade e sofrimento psicológico.

Além da ampliação de serviços, é preciso investir em prevenção e resiliência comunitária. Isso significa capacitar equipes de saúde para primeiros socorros psicológicos, integrar programas de educação emocional nas escolas e oferecer espaços seguros de convivência para populações afetadas. Experiências internacionais mostram que comunidades com redes de apoio consolidadas se recuperam mais rapidamente dos impactos emocionais de catástrofes, reduzindo a dependência de tratamentos emergenciais.

A emergência climática é também uma emergência de saúde mental. Reconhecer essa conexão e agir de forma coordenada e imediata é essencial para proteger não apenas o meio ambiente, mas também a saúde e o futuro da população brasileira.

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