Além do apenas suave. Ou o ministro José Mucio Monteiro
José Mucio conhece o tempo. Conhece as pessoas. E, por conhecê-las, sabe o que é tolerância
Gilberto Freyre foi um inventor. Entre outras, ele criou a noção de tempo tríbio: o tempo passado está no presente que está no futuro. Uma forma de perceber a transitoriedade. Mas também o permanente. Esses conceitos nos ajudam a trabalhar e descansar. E a viver. Sobretudo na relação com o outro.
A propósito, Freyre escreveu Além do Apenas Moderno (topbooks, 1971, Rio). Onde ele refere o sentido ibérico do tempo. A compreensão do tempo como oportunidade para desfrutar a vida. O oposto do time is money dos norte-americanos. Pois bem. A modernidade é cheia de pressa. E precisa de conteúdo. No livro mencionado, o sociólogo de Apipucos diz: "O moderno apenas moderno é efêmero e mal se define como moderno e já está sendo superado por um tempo mais-que-moderno" (pg. 49).
O tempo. Às vezes, passa rápido. Quando a gente quer que demore. Às vezes, demora. Quando a gente quer que passe logo. Talvez seja essa a sensação que atravessa, agora, o ministro José Mucio. Ele possui a lucidez de conviver com a urgência. E também com a delonga. Mostrou isto nos governos de Lula. A que serviu com lealdade. Lealdade à República, no tempo da institucionalidade. E, com igual espírito, lealdade ao governo, no tempo de brevidade.
José Mucio não tem a pressa que aniquila o verso, como disse o poeta do azul. Também não tem a morosidade do infortúnio. Desfez os nós da desconfiança. Compôs a letra de canção que isenta de intriga o Ministério da Defesa. Reiterou, no Lula 3, o que já mostrara antes. Com rara proficiência. Pois não é fácil apaziguar ânimo em governo. Principalmente entre civis e militares. E, em especial, vizinho do PT de Gleisy Hoffman, que é acalorado. Quem sabe faz a hora, cantou o compositor.
José Mucio conhece o tempo. Conhece as pessoas. E, por conhecê-las, sabe o que é tolerância. Segundo o dicionário, tolerar é respeitar as diferenças. É suportar com paciência. A capacidade de aceitar o comportamento de outra pessoa. O exercício de lidar com o diferente. É indulgência. Condescendência. Passando na estante, vi Tratado sobre a Tolerância, de Voltaire (Editora Martin Claret, 2017, São Paulo). Abri. Li:
"Lembrando dois acontecimentos da história da França do Antigo Regime. O primeiro foi a promulgação do Edito de Nantes pelo rei Henrique IV, em 1598, dando liberdade de culto aos protestantes. O segundo acontecimento foi sua revogação por Luís XIV, em 1685, proibindo o culto religioso em solo francês. Da noite para o dia, milhares de protestantes deixaram o país". O preço social, econômico e político foi enorme.
As lideranças mais respeitadas da política mundial defenderam a tolerância: Lincoln, Churchill, Gandhi. E os carrascos dos autos de fé estão perdidos no lixo da história. No capítulo 21 do Tratado, Voltaire escreveu: "Quanto menos dogmas, menos disputas. Quanto menos disputas, menos infelicidade".
Vivemos época de fraternidade. Torçamos para que o espírito do tempo inspire o governo. E o Brasil continue a contar com os melhores exemplos dos que, como José Mucio, sabem servir.



