Chance soberana
O governo Trump não respondeu, até agora, à carta enviada pelo Planalto o para discutir o tarifaço
“Esse é o substrato do nacionalismo, nele se abrigava a negação da cultura, da democracia e da racionalidade”,
Mario Vargas Llosa, em O Chamado da Tribo
Os Estados Unidos não vão sentar-se à mesa. Para negociar o tarifaço. A sanção. Porque a questão é mais funda. Porque “eu posso”, como disse o presidente norte-americano. A questão é a intolerância. Para conviver com o multilateralismo. Para debater na OMC com seus parceiros comerciais. E, no caso do Brasil, porque esse sentimento encontrou pretexto político: pedido de clã político para que fosse aprovada anistia a golpistas de 8 de janeiro.
A questão tem um fio. Até hoje, seis meses de gestão, o governo estadunidense não designou embaixador para ocupar a função em Brasília. Estranho. Dois países amigos. Com relações diplomáticas vigentes. Por outro lado, a embaixadora brasileira em Washington não foi recebida pelo Departamento de Estado até esta data. Insólito. Nações amigas. E, até agora, o governo Trump não respondeu à carta enviada pelo governo brasileiro para discutir o tarifaço.
Uma das mais respeitadas intelectuais alemães, judia, formada em Harvard, foi Hannah Arendt (1906-1975). Sua atividade profissional desenvolveu-se em Nova York. Um de seus livros clássicos é Origens do Totalitarismo. Na obra, ela analisa três conceitos: imperialismo, racismo e antissemitismo. Seriam formadores do pensamento totalitário. Ao se olhar a crise no comércio mundial, vê-se traços de imperialismo e de racismo. Imperialismo em face de medidas como o tarifaço, ataques ao multilateralismo e o modo absolutista de lidar com o poder. Racismo na forma rude como é implementada política anti migratória. Desrespeitando os direitos humanos.
Imperialismo e racismo são faces de mesma moeda. São vertentes de uma visão de mundo. Que pretende totalizar o modo de sentir e fazer as coisas. O imperialismo funciona de dentro para fora. No feitio de adequar todos ao seu modelo político. O racismo chega de fora para dentro. Eliminando os fluxos externos de migrantes. Estancando as possibilidades de absorção de estudantes, pesquisadores, trabalhadores. Troca sempre enriquecedora para os dois lados.
A política norte-americana, caótica, é agudizada por duas razões. Primeira, pela incapacidade do presidente Trump conviver com posições ideológicas que não se assemelhem às suas próprias. Segunda, pela tentativa frustra do deputado Eduardo Bolsonaro de trocar a suspensão do tarifaço por anistia aos golpistas. Sobrepondo o propósito familial ao interesse nacional.
Cria-se para o Brasil uma chance soberana.
O país exporta para os EUA apenas 12% do total de suas exportações. Menos de 2% do PIB brasileiro. É hora de reafirmar nossa soberania. Reordenando o comércio exterior. Com esforços para consolidar vínculos com a União Europeia e o Mercosul. E negócios com a China, nosso maior parceiro comercial. E a Argentina, nosso segundo maior parceiro. Mostrando que os destinos brasileiros são decididos por brasileiros. Patriotas.



