Julgamento do golpe: a cor do tempo
O que desaparece são as inverdades. O que fica é o que tem consistência entre lei e realidade
Chegou o dia do julgamento. Ele traz duas dimensões da vida: a dimensão fugaz e a dimensão permanente. O que desaparece com o tempo e o que fica na funcionalidade política. O que desaparece são as inverdades. O que fica é o que tem consistência entre lei e realidade.
O julgamento vai projetar suas consequências sobre seis instituições. Cujas reações serão a matéria-prima do futuro do país. São elas:
1 O Exército
O Exército vem alcançando, desde a Constituição de 1988, crescente maturidade. E correspondente nível de profissionalização. O resultado mais eloquente foi o não do Estado-Maior ao golpe. O que se viu é que a tentativa golpista não veio da Força Armada. Ela chegou lá. E naufragou. A tendência, daqui em diante, é viver a pedagogia do crime. Contribuindo para a visão profissional das Forças Armadas. Que enxerga no julgamento um ato judicial.
2 A relação do Brasil com os Estados Unidos
O tarifaço foi espasmo. Fruto de populismo gasto. Que não está à altura da história tecida pelos grandes: Lincoln, Roosevelt e Obama. Penso que o atual momento americano é um desvio. Construção esconsa. Porque a arquitetura do governo tem origem viciosa no propósito: poder oligárquico e não bem público. E porque perniciosa no destino: autoritarismo. Tempo e sensatez de instituições diplomáticas vão corrigir o rumo de relação histórica entre os dois países. Que tem raiz no respeito à lei.
3 O Supremo Tribunal Federal – STF
O STF é o atual fiador da funcionalidade institucional. Intimorato. Sua alegada hiper atuação decorre, em parte, de inação do Legislativo. Que não ousa legislar sobre matérias que exigem coragem política. E as matérias terminam sendo judicializadas. O capítulo que envolve a família Bolsonaro tem contorno próprio. Pois está na fronteira do interesse particular do clã. A extrapolação internacional do tema é extravagância que vem de longe. Ideia fixa. De época soldada no chumbo. Ao pensarem: dar um golpe basta um cabo e um soldado.
4 O governo
Não lhe falta só dinheiro. Falta suporte parlamentar. Na ausência deste, a trilha do governo depende, cada vez mais, das luzes da economia. Se a economia crescer, criando empregos, e se a inflação de alimentos baixar, gerando bem-estar, o governo fertiliza a campanha eleitoral. Se não, o governo corre o risco de derrota.
Na prática, o governo não tem equipe brilhante. Sequer ministros que se sobressaem. As deficiências conhecidas nas áreas da educação e da saúde, por exemplo, abririam espaço para o talento de bons gestores. Não é o que se vê. A inexistência de referência para suceder a Lula, como candidato, é uma certidão. Da pobreza de nomes. Emitida no cartório da (in)competência administrativa.
5 A oposição
A oposição está fragmentada. São quatro candidatos a presidente extra família Bolsonaro. E dois candidatos na família. Com duas hipóteses: a primeira hipótese, mais de um candidato no primeiro turno. Que se aglutinarão no segundo turno. A segunda hipótese, um acordo para lançamento de um único nome logo no primeiro turno.
Esse pacto vai depender da direção que tomar o centrão. Se o governo caminhar bem nas pesquisas, o centrão se orientará para o Palácio. Se o governo caminhar mal nas pesquisas, o centrão se voltará para a oposição. Haverá uma bússola a indicar caminho: as pesquisas eleitorais. Que refletirão o grau de acertos e de erros do governo. E o rumo que tomará o centrão.
6 A democracia
Penso que a qualidade da democracia atenderá a dois fatores: a funcionalidade do Legislativo e a temperatura da campanha eleitoral. A funcionalidade do Legislativo dependerá da taxa de golpismo da extrema direita no Congresso Nacional.
Interrompendo (ou não) fisicamente os trabalhos parlamentares. E da capacidade de liderança do presidente da Câmara dos Deputados.
A temperatura da campanha eleitoral será importante para mensurar a maturidade dos candidatos. E de suas equipes. No respeito aos adversários. Na fidelidade à verdade factual. E na objetividade dos compromissos assumidos para governar. Ao votar, em 2026, os eleitores celebrarão 41 anos de democracia.



