Dom, 14 de Dezembro

Logo Folha de Pernambuco
Brasil

Após velório na quadra do Império Serrano, Arlindo Cruz é enterrado em Sulacap, neste domingo (10)

Gurufim do sambista em Madureira começou às 18h e se estendeu até a manhã de domingo

Arlindo Cruz  faleceu nesta sexta-feira, aos 66 anosArlindo Cruz faleceu nesta sexta-feira, aos 66 anos - Foto: Reprodução/Instagram @arlindocruzobem

O corpo de Arlindo Cruz foi enterrado no início da tarde deste domingo (10), em uma cerimônia reservada à família e alguns amigos, no Cemitério Jardim da Saudade, em Sulacap, na Zona Oeste do Rio.

Muito emocionados, a viúva Babi e o filho Arlindinho Cruz acompanharam a cerimônia, que também contou com a presença de outros nomes do samba, como Diogo Nogueira.

O corpo do sambista saiu da quadra do Império Serrano, em Madureira, na Zona Norte do Rio, onde foi realizado o velório, com direito a um gurufim (homenagem na qual obras de um compositor são cantadas por parentes e amigos), que reuniu centenas de pessoas.

A despedida teve início na noite de sábado (9), seguiu durante a madrugada deste domingo (10) e foi encerrada às 10h. A cerimônia começou com o cântico “Alujá pra Xangô”, tocado nos atabaques por integrantes do centro de candomblé que o artista frequentava.

Fãs, amigos e familiares lotaram a verde e branca de Madureira desde o início da noite.

O velório teve início às 18h, marcado por roda de música, bebida e dança. Antes mesmo da abertura ao público, enquanto a quadra ainda era preparada e coroas de flores chegavam — entre elas, as enviadas pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva e pela primeira-dama Janja, uma das primeiras a chegar —, admiradores já se aproximavam para prestar homenagem.

Artsitas se despediram de Arlindo

Amigos do sambista também fizeram questão de estar presentes, como os músicos Marcelo D2, parceiro em composições como "Dor de verdade" e "O mundo em que renasci"; Marquinhos de Oswaldo Cruz; a atriz Regina Casé; o humorista Hélio de la Peña; e a escritora Conceição Evaristo.

Ao som da bateria da escola e de sucessos do compositor, músicos, amigos e integrantes da comunidade formaram uma grande roda de música, misturando reverência e celebração.

Emocionada, a filha de Arlindo, Flora Cruz, se manteve ao lado do caixão do pai durante os cânticos, e consolava seu filho Rian, neto de Arlindo, que chorava muito.

Maria Rita, Mart'nália, Beth Carvalho e Monobloco: relembre músicas que são de Arlindo Cruz e que ficaram famosas nas vozes de outros artistas

Às 19h, começou uma cerimônia, com a filha, Flora Cruz, cantando "O show tem que continuar" e "Meu lugar". Depois, o filho Arlindinho entrou tocando com a cantora Maria Rita "O que é o amor".

Por volta de 19h30, começou uma roda no meio da quadra, com músicos da escola e pessoas de todas as idades, de crianças a idosos, cantando junto sambas conhecidos. Torneiras de chope foram instaladas nos cantos da quadra. Com cada vez mais pessoas chegando à quadra, o clima era de festa para a despedida do músico.

Durante a cerimônia, a maioria dos presentes usava roupas claras, um pedido da família, como "símbolo da luz e da alegria que ele espalhou por toda a sua vida". Um telão no palco exibia fotos e vídeos de Arlindo com a família e amigos músicos, como Beth Carvalho, Caetano Veloso, Marcelo D2, Melo, Marcos Sacramento e Roberto Carlos.

O filho Arlindinho lembrou que o pai "sempre disse que queria um gurufim assim":

— Apesar de ser um momento de dor, ele ia gostar de ver a quadra assim cheia. Foram muitos anos difíceis, de sofrimento, agora ele foi descansar e vamos celebrar sua passagem aqui do jeito que ele gostava.

Parceiro de Arlindo em dez sambas-enredo pelo Império Serrano, incluindo dois estandartes de ouro, e em canções como "Fim da tristeza", Carlos Senna, vice-presidente da ala de compositores da escola, lamentou a morte do amigo.

— Arlindo era tudo para o Império. Agora foi descansar, o céu está em festa — disse o sambista, que conheceu Arlindo há mais de 40 anos, "desde a época em que ele trabalhava na Caixa Econômica".

A escritora Conceição Evaristo, que será enredo do Império em 2026, comentou:

— Conheci Arlindo através das músicas. Muitas vezes a arte nos aproxima das pessoas sem a gente conhecer pessoalmente. Só uma vez estive com ele, num aeroporto, mas Arlindo era uma potência musical, criativa, a poeticidade das músicas dele, tudo isso contamina. Madureira é um lugar feliz porque as músicas dele indicam um lugar de pertencimento. Que não é individual, é coletivo. Para nós negros, para a periferia, isso tem muito significado. A música de Arlindo nos dá um lugar. Samba tradicionalmente alcança o que muitas vezes o discurso político não consegue. Samba e literatura caminham juntos. Samba é lugar das pessoas dizerem aquilo que não está na academia

A homenagem ao sambista deve se estender até as 10h da manhã de domingo (10), e o sepultamento será às 11h, no Cemitério Jardim da Saudade, em Sulacap, na Zona Oeste do Rio de Janeiro.

A morte de Arlindo Cruz foi confirmada pela família na sexta-feira, que divulgou comunicado nas redes sociais do compositor. Ele estava internado no hospital Barra D'Or, na Zona Oeste do Rio, e teve falência múltipla dos órgãos.

Arlindo deixa três filhos, Arlindinho e Flora Cruz, fruto do seu casamento com Babi Cruz, e Kauan Felipe.

"Com imenso pesar, a família e a equipe de Arlindo Cruz comunicam seu falecimento. Mais do que um artista, Arlindo foi um poeta do samba, um homem de fé, generosidade e alegria, que dedicou sua vida a levar música e amor a todos que cruzaram seu caminho", diz o comunicado.

Um dos maiores sambistas de todos os tempos, conhecido pela riqueza melódica de suas composições, pelas letras carregadas de sentimento e pela malandragem de seu partido-alto, Arlindo Cruz nasceu em Piedade, bairro da Zona Norte carioca.

O subúrbio viraria tema constante de suas canções. Filho de um policial amante do samba e de uma dona de casa que cantava muito bem, Arlindo respirou música desde cedo, por influência do pai, Arlindão, que promovia encontros em casa onde apareciam figuras como Candeia.

O garoto se iniciou no cavaquinho aos 6 anos. Foi no disco “Roda de samba”, de Candeia, inclusive, que Arlindo começou sua carreira tocando cavaco, aos 17 anos, em 1975.

Em 2017, Arlindo Cruz sofreu um Acidente Vascular Cerebral (AVC). O episódio o deixou acamado, com dificuldades motoras e cognitivas, e o deixou impossibilitado de cantar e tocar. Desde então, ele passou por algumas internações.

Veja também

Newsletter