Atores de "Pssica" falam como série pode contribuir para o debate sobre exploração sexual de menores
Produção da Netflix é adaptação de livro de mesmo nome, de Edyr Augusto, centrado no tráfico de uma adolescente paraense

O argumento de que “Pssica”, livro de Edy Augusto, era o “Cidade de Deus do Pará” foi suficiente para que as produtoras Andrea Barata e Bel Berlinck, da O2, convencessem o roteirista Bráulio Mantovani a adaptar a história, contada em 96 páginas, para quatro episódios da minissérie que estreia na quarta-feira na Netflix. A obra é dirigida por Quico Meirelles e produzida pelo pai dele, Fernando Meirelles.
— Li e fiquei em estado de choque. Não apenas pela história poderosa. Mas pela forma, a linguagem, o estilo. É literatura de altíssimo nível. Não conhecia e me senti um ignorante — conta, ao GLOBO, o roteirista, indicado ao Oscar em 2004 por transformar o livro “Cidade de Deus”, de Paulo Lins, no filme dirigido por Fernando e Kátia Lund.
Assista ao trailer:
A “história poderosa”, que tem o título de uma gíria local para “maldição”, é centrada em Janalice, uma menor de idade paraense levada para Guiana Francesa como escravizada sexual.
O caminho dela se cruza com um rato d’água (como são conhecidos os fortemente armados ladrões de cargas de embarcações nos rios da Amazônia) e com uma ex-guerrilheira colombiana (que, no livro, é um imigrante angolano). O papel da menina ficou com a estreante Domithila Cattete.
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— Em Belém, eu já trabalhava com teatro e publicidade — conta a jovem, de 20 anos, completados durante as gravações, todas em seu estado natal. — Fiz testes e mais testes. (Falavam:) “sua atuação está muito teatral” e eu respondia: “meu Deus, só conheço o teatro” (risos). Mas me esforcei e estudei. Foi uma caminhada até a Janalice ser minha.
Em contraste com a pouca experiência de Domithila, está a veterana Marleyda Soto, colombiana de 47 anos que no ano passado interpretou a matriarca Úrsula na adaptação da Netflix para o clássico “Cem anos de solidão”, de Gabriel García Márquez. Agora, ela vive Mariangel, cujo marido é assassinado pela mesma gangue que sequestra e vende Janalice. Marleyda aprendeu português especialmente para este trabalho.
— Geralmente, quando a gente vê séries na TV, elas contam histórias de personagens inalcançáveis que, mesmo que sejam interessantes, não são próximas a nós. Agora falamos de nós mesmos — diz Marleyda.
Debate atual
Edyr Augusto (e Bráulio, Fernando Garrido e Stephanie Degreas, o trio da redação final dos episódios), de fato, falam de triste e recorrente realidade. São muitas Janalices por aí — antes de ser traficada, ela foi vítima de abusos dentro de casa. Segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2024, 78% dos estupros registrados foram contra vítimas de até 17 anos.
— A série contribui bastante ao debate sobre a exploração sexual de menores, principalmente a uma reflexão das responsabilidade dos pais — diz Domithila, sobre a produção de classificação indicativa 18 anos. —Ela mostra como os pais de Janalice a deixam numa situação de maior vulnerabilidade e traz a conversa para dentro de casa.
O Congresso Nacional debate no momento a erotização de crianças, por causa de um vídeo com denúncias feito pelo influenciador Felca, que levou à prisão na sexta-feira do influenciador Hytalo Santos. A minissérie pode trazer mais assunto para o debate, acredita Lucas Galvino, intérprete de Preá, o rato d’água da quadrilha que sequestra Janalice, mata o marido de Mariangel e enfrenta dilemas éticos.
—A série tem cenas de ação e dramas, mas, a base dela é (também) essa denúncia — diz o ator cearense.
