Documentário resgata primeira reportagem de Maurício Kubrusly para a TV Globo; assista
Filme "Kubrusly: mistério sempre há de pintar por aí", que repassa trajetória do ex-repórter do "Fantástico", chega nesta quarta-feira (4) ao Globoplay
O jornalista Maurício Kubrusly tornou-se célebre pelas reportagens irreverentes gravadas nos quatro cantos do país para o quadro “Me leva Brasil”, exibido pelo “Fantástico” ente 2000 e 2017.
O carisma do jornalista era tamanho que é difícil acreditar que ele resistiu a estrear na TV.
Essa é uma das revelações do documentário “Kubrusly: mistério sempre há de pintar por aí”, que passa em revista a trajetória do repórter e chega ao Globoplay nesta quarta-feira (4).
Leia também
• Confira registros do "Me leva Brasil", quadro que fez a fama de Maurício Kubrusly no Fantástico
• Esposa de Maurício Kubrusly explica por que topou filme que aborda diagnóstico de demência do marido
• Maurício Kubrusly: quais são os sintomas da demência frontotemporal, condição que afeta o jornalista
Num depoimento ao projeto Memória Globo, recuperado pelo documentário (que tem direção de Caio Cavechini e Evelyn Kuriki), Kubrusly conta que quando foi convidado para trabalhar na TV não tinha sequer um aparelho em casa.
“Eu não sabia nada de televisão. Eu não tinha o hábito de ver televisão”, diz ele, que começou fazendo comentários musicais na TV Globo e na TV Cultura.
Desde a década anterior, ele já se destacava como um dos mais antenados críticos de música de sua geração. Não à toa, o subtítulo do filme é um verso da canção “Esotérico”, de Gilberto Gil.
O documentário traz a primeira reportagem de Kubrusly para a TV, exibida em 1985. O tema era o espetáculo “Ubu, Folias Physicas, Pataphysicas e Musicaes”, inspirado nas peças do “ciclo Ubu”, do francês Alfred Jarry (autor de “Ubu rei”).
Produzida pelo Grupo Ornitorrinco, com direção de Cacá Rosset e cenografia de Lina Bo Bardi (a arquiteta que projetou o Masp), o espetáculo tinha no elenco nomes como Rosi Campos, Angela Dipp e o próprio Rosset, que interpretava o Pai Ubu.
Nesta primeira reportagem, Kubrusly já esbanjava irreverência. Ao anunciar o nome da peça, ele faz cara de dúvida e repete para a câmera: “Pataphysicas?”.
Como se fosse ele próprio um ator, o repórter se mete numa briga entre o Pai Ubu e a Mãe Ubu (Rosi Campos).
Em depoimento ao documentário, Rosset diz que, naquela gravação, farejou o “talento de ator” do jornalista e o convidou para participar de um espetáculo do grupo. “Pena que não pode fazer”, lamenta Rosset.
Evelyn Kuriki descreve essa primeira reportagem de Kubrusly como “um primor”, “podia ir ao ar hoje”
"É uma coisa genial. Ele está ali como repórter, mas interage como se fosse ator no meio de bolas de fogo, entra numa briga, quase recebe uns tabefes, tudo ensaiado, dirigido" diz ela, que também assina o roteiro do documentário.
"Aquela figura do repórter “participativo” está ali, mas não é gratuita, é puro repertório. E foi só a primeira reportagem dele, um pioneiro de um estilo que depois ele até abandonaria, porque passou a ser comum"
Evelyn acrescenta que Kubrusly “lapidou o que tinha de melhor: a linguagem, o texto de TV, a rapidez da abordagem”.
"Ele encontrou no “Me Leva Brasil” um campo vasto para empregar tudo isso em matérias engraçadas, populares, que deram protagonismo a personagens muito brasileiros"
"Problema coletivo"
Diagnosticado com demência frontotemporal, Kubrusly está afastado da TV desde 2019 e vive com a esposa, a arquiteta Beatriz Goulart, no Sul da Bahia.
Mês passado, ele compareceu à 11ª Mostra de Cinema de Gostoso, onde o filme foi exibido pela primeira vez. O jornalista subiu ao palco para ser homenageado e foi aplaudido de pé pelo público.
Durante o festival Beatriz contou ao Globo que Kubrusly gostou de se ver na tela e a abraçou bem forte durante a exibição.
Ela disse que, vendo o filme, foi duro constatar a piora no estado de saúde do marido, ocorrida nos meses que separaram a gravação (no fim do ano passado) e a estreia.
Ele, que já havia perdido a capacidade de ler e escrever, tem falado cada vez menos nos últimos tempos.
Beatriz disse ainda que optou por tornar público o diagnóstico de Kubrusly porque o cuidado dos pacientes com demência é um “problema coletivo”.
"A gente não sabe falar sobre demência, não sabe falar sobre a morte, tem vergonha, diz que é para preservar a privacidade das pessoas. Mas eu só penso naquela pichação que fizeram na Rio-92 quando o cacique Raoni e Sting se encontraram: “Ou a gente se Raoni ou a gente se Sting”"