Os problemas da Arena de Pernambuco
Estádio seria o coração da Cidade da Copa, que não saiu do papel, e enfrenta hoje dificuldades, prejuízos e desinteresse por parte dos investidores
Quando começou a ser construída, em 2010, a Arena de Pernambuco prometia ser um grande vetor de desenvolvimento para São Lourenço da Mata, no Grande Recife. Nos planos do Governo, o estádio seria o coração da Cidade da Copa, uma região planejada que teria casas, empresas, shopping, cinema, museu, teatro e até uma via de acesso especial, o Ramal da Copa. Até hoje, no entanto, só a Arena saiu do papel - um empreendimento que encantou a todos, mas passou a ser mais lembrado pelos problemas financeiros do que pela estrutura de padrão internacional.
A obra foi investigado na Operação Fair Play por suspeitas de superfaturamento e nunca alcançou a receita esperada antes da Copa do Mundo de 2014, gerando, consequentemente, prejuízos para os cofres públicos e desinteresse na iniciativa privada. Já houve meses em que o Estado teve de colocar R$ 2 milhões na Arena. Sem os jogos e os shows que estavam previstos, o estádio nunca conseguiu manter-se sozinho. Segundo a Fundação Getúlio Vargas, R$ 9,6 milhões era a receita mensal projetada para o estádio em 2014. No mês da Copa, porém, só foram arrecadados R$ 6,1 milhões. E já no mês seguinte esse valor caiu para R$ 1,3 milhão.
A frustração foi tão grande que a Itaipava desistiu de patrocinar o empreendimento e o contrato de Parceria Público-Privada (PPP) firmado com a Odebrecht para a construção e a gestão da Arena precisou ser rompido pelo Estado, ao custo indenizatório de R$ 246,8 milhões. O pagamento seria parcelado ao longo de 15 anos, mas foi interrompido há quase um mês por cautelar do Tribunal de Contas do Estado (TCE).
É que, assim como a Polícia Federal, o TCE acredita que o valor final da Arena gira em torno de R$ 389,4 milhões e não R$ 479 milhões como afirma o Governo. Este, no entanto, foi só mais um imbróglio na saga Arena. Afinal, há mais de um ano, o Estado trabalha para lançar a licitação que vai escolher uma empresa para ficar no lugar da Odebrecht e administrar o estádio. E já há quem duvide do sucesso desse edital. É que, no mês passado, outro certame foi lançado para buscar um patrocinador para o empreendimento, mas ele chegou ao fim sem que nenhuma empresa se mostrasse interessada no contrato.
“Este é um empreendimento muito custoso, pois tem manutenção cara e depende dos jogos para ter receita. E, como os grandes clubes pernambucanos têm seus próprios estádios, é difícil imaginar um fluxo de jogos suficiente para manter os investimentos. É uma equação difícil de fechar. Então, não sei se este é um negócio sustentável para um investidor de fora”, avaliou o conselheiro do TCE, Dirceu Rodolfo. “A Arena não é rentável e seu histórico administrativo também é negativo.
Isso gera uma insegurança por parte do investidor privado. Não vejo como o Estado vai torná-la atrativa para o privado”, acrescentou o professor de direito constitucional, André Mussalém, dizendo que o custo do empreendimento não compensa nem para o poder público. “Este acabou se tornando um problema no orçamento do Estado, porque se esperava que aquela área fosse desenvolvida.
Eram expectativas até fantasiosas se comparássemos com outros países em desenvolvimento que construíram aparelhos esportivos desse porte, como a África do Sul, cujos estádios ficaram sem uso depois da Copa. E elas realmente foram frustradas por conta da crise”, completou Mussalém, dizendo que a localização da Arena também contribuiu para essa situação. “A mobilidade poderia tornar a Arena acessível, mas obras como o Ramal da Copa e o Corredor Leste-Oeste também não foram concluídas por conta do descompasso financeiro”, justificou o professor de engenharia civil Fernando Jordão, dizendo que, por todos esses problemas, era melhor ter investido em outros projetos para a Copa do Mundo. “Se os planos fossem mais modestos, talvez não teríamos esse elefante branco que é a Arena”, finalizou.
Enquanto tudo isso não se resolve, a Arena vai sendo administrada pelo Estado, através da Secretaria de Esportes, Turismo e Lazer (Seturel). É uma gestão que tem se esforçado para levar os pernambucanos para o empreendimento, através de eventos como o Domingo na Arena, mas ainda não entregou os grandes eventos internacionais prometidos desde 2014. Já se cogitou Rolling Stones e U2, mas os maiores eventos musicais já realizados na Arena foram os 25 anos da Obra de Maria e o Maior Show do Mundo.
É verdade, porém, que o Estado reduziu de R$ 2 milhões para R$ 840 mil o custo mensal de manutenção do empreendimento, por meio de novas licitações e do corte de pessoal. Para a população, no entanto, essa despesa ainda é alta para os benefícios que proporciona. É que, além de não ser palco de grandes eventos, a Arena só costuma receber de três a cinco jogos por mês e nunca fica lotada. Neste ano, por exemplo, 21 partidas de futebol foram jogadas em São Lourenço. E nas 17 do Náutico, o mandante do estádio, a média de ocupação foi só de 6% dos 46 mil assentos do estádio.
Não bastasse isso, o entorno da Arena mal tem iluminação e segurança. No lugar dos prédios modernos, só há mato e entulhos. “Achamos que teríamos muitos benefícios com a Arena, mas até hoje não visualizamos isso”, lamentou o contador Danilo Almeida, que mora perto do estádio. “Não mudou nada para a gente que mora aqui. Só aumentou os assaltos, porque aqui por perto fica tudo escuro à noite”, desabafou a cozinheira Simone Silva.
Atual gestora da Arena de Pernambuco, a Seturel foi procurada pela reportagem, mas não comentou o assunto até o fechamento desta edição.
Depoimentos
"Estão aí desde a Copa, só se estragando. Nem sei mais para quê serão usadas”, diz o morador de São Lourenço, que lembra que o Ramal da Copa, ficou pela metade. “As grandes estruturas de ferro que seriam usadas para duplicar a pista estão abandonadas na beira da pista até hoje”. Sebastião Caetano, aposentado
“Achamos que a Arena ia trazer desenvolvimento, mas no fim não mudou nada para a gente que mora aqui. As ruas não foram asfaltadas e não veio casa nem shopping. Só aumentou os assaltos, porque aqui por perto fica tudo escuro à noite. O dinheiro gasto ali deveria ser usado em escolas e postos de saúde”. Simone Silva, cozinheira
E até quem foi desapropriado para ir para um “lugar melhor” tem o que reclamar. “Antes eu vendia uns 200 almoços, hoje são 50. E a indenização que me deram não deu nem pra comprar uma casa. Recebi R$ 50 mil, mas gastei quase R$ 300 mil para reconstruir o restaurante”. João Batista, dono de restaurante que foi desapropriado





