Planalto vai insistir para ampliar revogação de tarifas de Trump e vê brecha para derrubar Magnitsky
Governo credita medida ao avanço das negociações e reunião entre Lula e o presidente americano
Após o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, anunciar a revogação da tarifa de 40% para uma parcela de produtos brasileiros, o Palácio do Planalto vai insistir nas negociações para que sejam retiradas alíquotas de outras exportações e revogadas as sanções da Lei Magnitsky.
Interlocutores do presidente Luiz Inácio Lula da Silva creditaram a medida de Trump à reunião presencial entre os dois presidentes, ocorrida na Malásia, e enxergam no ato executivo uma brecha para avançar nas conversas.
Foram revogadas tarifas de produtos como café, carne bovina e suco de laranja. A intenção agora é avançar sobre essa lista e ampliar as negociações para as sanções financeiras que foram aplicadas a autoridades como o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal.
Leia também
• Setor de pescados fica fora da lista de exceções dos EUA e fala em "frustração"
• Café, carne: EUA retiram tarifa extra de 40% sobre certos produtos agrícolas do Brasil
Representantes da área diplomática do governo acrescentaram, ainda, que um gesto a nível ministerial pode ocorrer como forma de retribuir a revogação das tarifas. Há o entendimento, no entanto, que não é o caso de "agradecer" pela retirada de uma punição considerada injusta.
Logo após o anúncio, a ministra Gleisi Hoffmann (Relações Institucionais) afirmou nas redes sociais que a iniciativa de Trump foi fruto da atuação de Lula e do vice-presidente Geraldo Alckmin e criticou o ex-presidente Jair Bolsonaro, o deputado Eduardo Bolsonaro e o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas.
Entenda o que foi decidido
Trump disse que certos produtos agrícolas importados do Brasil pelos americanos não serão mais alvo da tarifa adicional de 40%, entre eles carne bovina, tomate, café, banana, açaí e outros. A lista tem mais de 60 itens e alcança até mesmo bambu, chás verde, preto e mate, castanha de caju, manga, mandioca e goiaba.
A decisão, que menciona as negociações iniciadas após conversas entre Trump e o presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, é o primeiro avanço significativo do esforço do governo brasileiro para derrubar o tarifaço sobre exportações brasileiras para os EUA, que chegam a 50%. Em São Paulo, Lula comemorou dizendo-se feliz com a decisão do americano e afirmou que as coisas 'vão acontecer'
O maior ganho será para os setores de carne e café, produtos dos quais o Brasil é um dos maiores produtores e exportadores do mundo.
Na decisão publicada pela Casa Branca, o presidente retira a sobretaxa de 40% que havia imposto em agosto a uma série de produtos brasileiros alegando motivos comerciais e políticos. A medida acabou encarecendo produtos básicos como café e carne para os americanos.
Trump relacionou a decisão de suspender a sobretaxa às negociações comerciais abertas entre EUA e Brasil após o encontro do republicano com o presidente Lula na Malásia em outubro.
"Em 6 de outubro de 2025, participei de uma ligação com o presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, durante a qual concordamos em iniciar negociações para abordar as preocupações identificadas na Ordem Executiva 14323. Essas negociações estão em andamento", escreveu Trump.
O texto cita diretamente as conversas com o presidente brasileiro, mas, diferentemente da carta com a qual instituiu o tarifaço que elevou as tarifas sobre produtos brasileiros de 10% (tarifa recíproca anunciada em abril) para 50% em agosto, não menciona o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
Em agosto, a carta de Trump criticou o processo contra Bolsonaro por tentativa de golpe de Estado, pelo qual foi condenado, entre os motivos que usou para justificar a sobretaxa e sanções a autoridades brasileiras. No texto de hoje, ele recua em alguns produtos agropecuários mantendo os argumentos no campo comercial, evitando citações políticas.
Agora, ele afirma que assessores recomendaram a retirada de alguns produtos agrícolas importados por americanos do Brasil, como café e carne, e destaca avanço nas conversas com o governo do Brasil.
"Também recebi informações e recomendações adicionais de vários funcionários que, segundo minha orientação, vêm monitorando as circunstâncias relacionadas à emergência declarada na Ordem Executiva 14.323", diz outro trecho, referindo-se à sobretaxa de 40% que impôs a produtos brasileiros em agosto. "Por exemplo, na opinião deles, determinadas importações agrícolas do Brasil não deveriam mais estar sujeitas à taxa adicional (...) porque, entre outras considerações relevantes, houve progresso inicial nas negociações com o Governo do Brasil.
"Após considerar as informações e recomendações que esses funcionários me forneceram e o status das negociações com o Governo do Brasil, entre outras coisas, determinei que é necessário e apropriado modificar o escopo dos produtos sujeitos à taxa adicional ad valorem imposta nos termos da Ordem Executiva 14.323", escreveu Trump.
Produtos agora isentos de tarifa adicional
Além do café e da carne bovina, uma lista de frutas, a exemplo do tomate e da manga, terão um regime especial, com isenção da tarifa adicional em períodos específicos ao longo do ano. Veja alguns dos produtos agropecuários listados na decisão de hoje pela Casa Branca:
- Café
- Carne bovina
- Açaí
- Banana
- Castanha de caju
- Laranja
- Suco de laranja (que já estava na lista de exceções em agosto)
- Frutas frescas que têm isenção em períodos específicos do ano
- Tomates
- Goiaba
- Manga
A lista isenta de tarifa uma série de outros alimentos como cogumelos, alcaparras, broto de bambu, mandioca, inhame e gengibre.
As castanhas de caju e do Brasil, além de chás verde, preto e mate também foram excluídos. Assim como ervas e temperos a exemplo de cúrcuma, cominho e cardamomo.
Há outros vegetais não comestíveis livres da taxação de 40%, como óleos essenciais e carvão.
Segundo o ato de Trump, essa suspensão da sobretaxa de 40% valerá para mercadorias embarcadas a partir de 13 de novembro. Portanto, importações sobretaxadas desde aquele dia terão direito de reembolso dos tributos.
Café e carne com tarifas zeradas
No último dia 14, o republicano já havia retirado a tarifa recíproca de 10% — uma alíquota básica adotada pelos EUA para praticamente todos os países em abril deste ano — de produtos agrícolas importados e não produzidos em território americano, como café, carne bovina, banana e outros artigos. Como o Brasil está entre os maiores produtores destes itens, foi beneficiado indiretamente, mas os setores atingidos se queixaram de que houve pouca mudança sem a retirada dos 40%.
Agora, café, carne e banana brasileiros, por exemplo, terão tarifa de importação reduzida a zero nos EUA.
A suspensão da tarifa recíproca por Trump foi tomada com o objetivo de diminuir os custos para o consumidor americano, em uma tentativa da Casa Branca de reagir à queda de popularidade de seu governo diante da inflação nos supermercados e que se refletiu em eleições locais recentes.
A Lei Magnitsky
A Magnitsky foi criada para atingir pessoas físicas e jurídicas acusadas de infringir direitos humanos ou de atos graves de corrupção. A escolha dos alvos cabe ao presidente dos EUA e a órgãos como o Departamento do Tesouro e o Departamento de Estado. O formato atual da lei foi estabelecido em 2016, na presidência de Barack Obama, e é uma das várias ferramentas de sanções a estrangeiros em vigor nos EUA.
A principal sanção é o bloqueio de bens que estejam nos Estados Unidos, o que inclui contas bancárias, investimentos financeiros e imóveis. Em decreto presidencial de 2017, que regulamentou a Magnitsky, o presidente americano Donald Trump também explicitou que qualquer pessoa ou empresa sob a jurisdição dos EUA não pode fornecer serviços ou recursos aos sancionados, o que impede, por exemplo, usar o sistema bancário americano ou fazer transações em dólar.
A lei veta ainda a entrada de pessoas sancionadas nos EUA, e abre a possibilidade de sanções secundárias a quem mantiver relação com sancionados. Em publicação nas redes sociais na segunda-feira, o Escritório de Assuntos do Hemisfério Ocidental, órgão vinculado ao Departamento de Estado dos EUA, disse que Moraes é “tóxico” a quaisquer pessoas que “busquem acesso ao mercado americano”.

