A caminho da santidade
Há dez anos, o papa canonizava único santo brasileiro. Personagens da história do Estado são candidatos ao título
Há dez anos, no dia 11 de maio, foi canonizado Frei Galvão. A igreja considerou que o frei paulista, nascido no século 18, era responsável por dois milagres ocorridos nos anos 1990. Intercedeu divinamente sobre a gravidez e o nascimento de uma criança num útero malformado e na cura inexplicável de uma hepatite agressiva que se instalara numa criança de quatro anos. Até hoje, ele é o único santo brasileiro. Mas, se depender da persistência de religiosos como o Frei Jociel Gomes, o papa deverá beatificar e reconhecer a santidade de três pessoas ligadas à história pernambucana.
Dom Hélder Câmara, arcebispo de Olinda e Recife entre 1964 e 1985, é um dos personagens da história religiosa de Pernambuco que têm um processo de canonização aberto. É, também, o que está mais “atrasado” no caminho para se tornar santo. “Quando uma pessoa morre com fama de santidade, o processo para canonizar pode ser aberto após cinco anos”, explicou Frei Jociel. “Na primeira etapa, diocesana, censores teólogos analisam todas as cartas e escritos inéditos da pessoa. No caso de Dom Helder, são tantos documentos que ainda não se saiu dessa fase. A intenção é descobrir se o que ele produziu está de acordo com os preceitos da Igreja e os ensinamentos cristãos.”
Dom Vital foi bispo de Olinda no século 1 e está à frente de Dom Hélder no processo, mas teve um pedido mais trabalhoso. “Tudo foi feito baseado em documentos históricos. Ele já passou por toda fase diocesana e já está na romana, quando é no Vaticano que acontecem as avaliações. Além dos censores teólogos, que são anônimos (porque podem dar um parecer negativo), uma comissão histórica levanta toda a vida do candidato a santo, com entrevistas a testemunhas, por exemplo. No caso de Dom Vital, é tudo por documentos antigos, o que aumenta a dificuldade”, contou o frei que está à frente postulador do pedido de Dom Hélder e vice-postulador dos de dom Vital e frei Damião.
O capuchinho do século 19 já teve os relatório de práticas de virtudes e a biografia documentada feitos. O resumo está sendo redigido por frei Jociel no chamado posicio, um livro gigantesco que é avaliado, em última instância, pelo papa. “Já frei Damião está com o posicio pronto esperando aprovação. É extremamente provável que em fevereiro do ano que vem receberemos a boa notícia de que o papa assinou o decreto de venerável para o frei. A partir daí, mostramos um milagre realizado por Damião após sua morte e ele será tornado beato passada toda a burocracia. Esse possível milagre nós já temos, mas está sob sigilo, porque é a Igreja que diz se é realmente legítimo.”
É considerado um milagre é aquilo que não pode ser explicado pela ciência. No último sábado, os pastorinhos que receberam aparição de Nossa Senhora de Fátima foram canonizados por terem sido associados à cura de um paranaense que, em 2007, caiu de uma janela de mais de 6 metros e teve traumatismo craniano grave. No caso de Damião, o miraculado também é uma pessoa que foi curada de uma doença de maneira que a medicina não tem ferramentas para esclarecer.
Uma vantagem no processo de Damião é que ele já é considerado santo por grande parte da população, especialmente no interior nordestino. “Isso é muito interessante para o processo. Tanto para encontrar milagres quando para fundamentar a primeira parte do processo, em que há a biografia e o relatório das práticas de virtudes. A Igreja só irá certififcar o que o povo que já sabe e acredita”, finalizou.
Dom Vital (1844-1878)
Antônio Gonçalves de Oliveira Júnior nasceu na Cidade de Pedra do Fogo, Paraíba. Nascido no ano de 1844, foi batizado em Goiana, na Mata Norte dePernambuco, em 1846. Ele foi ordenado padre aos 24 anos. Aos 27 foi nomeado pelo imperador Dom Pedro Segundo como bispo da diocese de Olinda e a ele são atribuídos diversos milagres enquanto estava vivo. dom Vital faleceu em Paris, aos 34 anos, após ter sido exilado em decorrência de seus posicionamentos políticos. A documentação histórica referente aos presumidos milagres já está anexada aos processos de beatificação. Para ser santo, precisa ter comprovado um milagre que aconteceu após sua beatificação.
Dom Hélder (1909-1999)
Câmara nasceu no Ceará e foi arcebispo de Olinda e Recife por duas décadas. Foi um dos fundadores da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil. Com forte inclinação política para a luta dos menos favorecidos, chegou a ser perseguido e acusado de “comunismo”. Também por isso, recebeu o apelido de “arcebispo vermelho”. Trabalhou pelo direito à moradia dos mais pobres e foi investigado pela censura da ditadura militar, com quem vivia em pé de guerra. Em 1984 apresentou sua renúncia à arquidiocese e foi substituído por Dom José Cardoso Sobrinho. Tem dois prêmios com seu nome no Brasil: Prêmio Dom Hélder Câmara Imprensa e Comanda de Direitos Humanos Dom Hélder Câmara. Faleceu em abril de 1999.
Frei Damião (1898-1997)
O frade italiano tem sua vida intimamente ligada ao nordeste brasileiro. Mudou-se para o Recife em 1931 e, aos 13 anos, ingressou no seminário Seráfico de Comiglidiano, da Ordem dos Frades Menores Capuchinhos. Em Gravatá, numa capelinha no Riacho do Mel, rezou sua primeira missa. Morreu no Recife, em 1997. Seu corpo está enterrado na capela de Nossa Senhora das Graças, de quem era devoto, no Convento dos Capuchinhos, no Pina, Zona Sul do Recife. Hoje, há diversos memoriais dedicados a ele espalhados pelo Nordeste brasileiro. No Recife, em Caruaru e emSão Joaquim do Monte, em Pernambuco. Em Sousa, na Paraíba. Em São Miguel, no Rio grande do Norte e em Frexeiras, Alagoas.

