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Rússia

Corpo de jornalista ucraniana que morreu sob custódia russa apresenta sinais de tortura e mutilações

Victoria Roshchyna desapareceu em 2023 em uma região ocupada pela Rússia, e seu corpo só foi retornado à família em fevereiro

Colega da jornalista Victoria Roshchyna segura foto dela durante memorial em Kiev Colega da jornalista Victoria Roshchyna segura foto dela durante memorial em Kiev  - Foto: Anatolii Stepanov / AFP

O corpo de uma jornalista ucraniana que desapareceu em uma região da Ucrânia ocupada pelos russos em 2023, e que morreu no cárcere, apresentou sinais de tortura e mutilações ao ser devolvido ao seu país, apontou uma investigação liderada por um veículo de imprensa francês.

Segundo a reportagem, Victoria Roschchyna só foi identificada através de um exame de DNA, e o estado dos restos mortais impossibilita determinar a causa da morte.

Os primeiros relatos sobre o desaparecimento de Roschchyna, então com 26 anos, surgiram em julho de 2023, quando ela, de acordo com seu pai, planejava chegar até o território russo passando por áreas ocupadas no Leste da Ucrânia — um ano antes, ela havia sido detida pelas forças de Moscou, mas foi libertada após 10 dias.

O último contato com a família ocorreu no dia 3 de agosto de 2023, mas ela não revelou onde estava.

Apenas em maio do ano seguinte as autoridades russas reconheceram que ela havia sido detida, mantida inicialmente em uma prisão nos arredores da usina nuclear de Zaporíjia e depois na cidade russa de Taganrog.

— O tratamento foi absolutamente brutal e mortal para ela. Ela lutou nos primeiros dias, era possível ver. Ela insistia em falar com os investigadores, a equipe e as autoridades prisionais. Queria explicar que não havia justificativa legal para sua detenção. Estava desesperada para contatá-los e descobrir por que havia sido levada para lá — disse a ex-colega de cela de Roshchyna, em depoimento a um documentário sobre a jornalista, lançado em março.

Em outubro de 2024, o pai dela recebeu uma carta informando sobre sua morte, e seu corpo retornou à Ucrânia apenas em fevereiro de 2025.

Foi quando se tornou possível entender um pouco melhor os horrores a que ela foi submetida no cárcere.

Segundo a investigação do portal Histórias Proibidas, publicada na terça-feira, citando fontes próximas às autoridades ucranianas, o corpo da jornalista foi entregue sem os olhos, cérebro e sem parte da laringe, e com o osso hioide quebrado — segundo o portal, a retirada pode ter sido uma tentativa para disfarçar atos de tortura.

— A remoção da laringe durante uma autópsia não é uma prática padrão — explicou um especialista forense ao Histórias Proibidas.

— A laringe pode ser uma forte evidência de estrangulamento. Quando uma pessoa é estrangulada, o osso hioide frequentemente é fraturado. Também é possível encontrar sangramento no tecido ocular e sinais de privação de oxigênio no cérebro.

Um investigador de crimes de guerra que também teve acesso à análise dos restos mortais da jornalista afirma ainda que foram encontrados outros sinais de tortura, incluindo queimaduras, hematomas, uma costela fraturada, ferimentos no pescoço e marcas compatíveis com choques elétricos na sola dos pés. Autoridades ucranianas afirmam que “não é incomum” ver corpos de prisioneiros de guerra com marcas e mutilações.

De acordo com estimativas do governo ucraniano, há cerca de 16 mil cidadãos do país presos em instalações controladas pela Rússia, seja em áreas ocupadas, seja no próprio território russo, sem qualquer tipo de acesso a advogados e submetidos a violências recorrentes, físicas e psicológicas.

— Eles estão espalhados por toda a Rússia. Alguns foram enviados para Udmúrtia, alguns para Krasnodar, alguns para Crimeia, alguns para Samara. Isso foi feito para que não acabássemos de alguma forma em locais de detenção com nosso próprio povo — disse ao Histórias Proibidas Elizaveta Shilik, uma ex-militar ucraniana que ficou mais de um ano e meio presa. — [Nas colônias penais] tentaram nos convencer: "Esqueçam essa troca [de prisioneiros]! A Ucrânia não precisa de vocês. A Ucrânia se esqueceu de vocês”.

Elizaveta foi libertada em uma troca de prisioneiros no dia 13 de setembro do ano passado. Segundo relatos oficiais de Kiev, Victoria Roschchyna deveria ter sido incluída na operação, mas morreu no cárcere seis dias depois, de acordo com o Histórias Proibidas.

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