Do Putsch de 1923 ao Putsch de 2023
Recolhido ao presídio militar do Tribunal de Munique no dia 1º de abril de 1924 em decorrência de decisão judicial pelo Putsch de Munique, em uma cervejaria no dia 9 de novembro de 1923, cujo objetivo era tomar o poder do governo da região da Baviera, Adolf Hitler diz no prefácio do livro MEIN KAMPF (Minha Luta) que a “prisão se me ofereceu, pela primeira vez, depois de anos ininterruptos de trabalho, a possibilidade de dedicar-me a uma obra, por muitos solicitada e por mim mesmo julgada conveniente ao movimento nacional socialista”.
Este livro, no seu capítulo XI, que trata de povo e raça, descreve a importância da teoria eugênica que pretende a seleção genética na busca de afirmar-se a superioridade racial ariana.
Em determinado momento, inclusive, Hitler conclui que a “América do Norte, cuja população, decididamente, na sua maior parte se compõe de elementos germânicos, que só muito pouco se misturaram com povos inferiores e de cor, apresenta outra humanidade e cultura do que a América Central e do Sul, onde os imigrantes, quase todos latinos, se fundiram, em grande número, com os habitantes indígenas”.
Hum..., isso mesmo, com alongamento da vogal nasal. Chegamos ao Brasil. Chegamos aos povos indígenas. Chegamos aos Ianomâmis e constatamos a existência no governo passado de uma política de degradação dos povos nativos, com evidentes violações dos direitos humanos, passíveis portanto de responderem judicialmente frente aos tribunais nacionais e internacionais, todos os possíveis acusados do crime de genocídio, um crime contra a humanidade.
Esse acumpliciamento no morticínio dos povos nativos que virou massacre exige respostas enérgicas dos Poderes constituídos.
O então ministro da Justiça e Segurança Pública, Anderson Torres, hoje preso por envolvimento na tentativa de golpe de Estado do dia 8 de janeiro, quando exercia o cargo de secretário da Segurança Pública do Distrito Federal, respondendo a exigências do Supremo Tribunal Federal que exigia força policial para proteger os indígenas de Roraima, alegou não haver apoio logístico das Forças Armadas por falta de recursos.
Indignado, o ministro Luiz Roberto Barroso despachou: “Registro com desalento o fato de que as Forças Armadas brasileiras não têm recursos para apoiar uma operação determinada pelo Poder Judiciário para impedir o massacre de populações indígenas”.
Porém as Forças Armadas são muito mais do que esse entendimento. A imagem do marechal Cândido Rondon é a que permanece.
Foi indicado ao prêmio Nobel da Paz e recebeu o reconhecimento de Albert Einstein, físico teórico alemão que desenvolveu a teoria da relatividade geral, um dos sustentáculos da física e da mecânica quântica, e de Claude Lévi-Strauss, antropólogo, professor e filósofo francês. É tido como o fundador da antropologia estruturalista.
Entendemos que o problema não são as instituições permanentes e necessárias, porém, as pessoas que, em determinado período histórico, respondem por elas e as maculam.
O que é inadmissível para o totalitarismo é a aceitação tripartite dos Poderes, é a noção de peso e contrapeso como preconizava Montesquieu. O totalitário e o totalitarismo não admitem separação dos Poderes, para ambos o Estado é monolítico, nada existe além do Estado. Foi assim que se pronunciou Benito Mussolini no Teatro Scala de Milão em 1925.
Os atos praticados no dia 8 de janeiro de 2023, foram demonstrações desmesuradas de afronta ao Estado de Democrático de Direito e endereçados aos alvos errados, na tentativa de obnubilar a consciência coletiva. Melhor que tivessem feito, os vândalos e golpistas, autocrítica dos graves e criminosos fatos cometidos contra o país e seu povo, e pedissem desculpas.
Ao acompanhar o golpe de Estado que levou Napoleão III ao poder na França, Karl Max observou, como está dito na obra o 18 Brumário de Napoleão Bonaparte, que “a história acontece como tragédia e se repete como uma farsa”.
O Putsch do dia 8 de janeiro de 2023 foi uma farsa.
*Procurador de Justiça do Ministério Público de Pernambuco. Diretor Consultivo e Fiscal da Associação do Ministério Público de Pernambuco. Ex- repórter do Jornal Correio da Manhã (RJ)
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