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EUA demite chefe de base militar na Groenlândia por 'subverter agenda Trump'

Em nota, Forças Armadas americanas mencionam 'perda de confiança' na 'capacidade de liderança' da coronel

O vice-presidente dos EUA, JD Vance, visita a Base Espacial de Pituffik, na Groenlândia, com a comandante Susannah Meyers, destituída dias depoisO vice-presidente dos EUA, JD Vance, visita a Base Espacial de Pituffik, na Groenlândia, com a comandante Susannah Meyers, destituída dias depois - Foto: Jim Watson/Pool/AFP

A chefe da base militar dos Estados Unidos na Groenlândia foi demitida após, segundo relatos, ter enviado um e-mail se distanciando das críticas do vice-presidente americano, JD Vance, à Dinamarca. Em comunicado emitido na quinta-feira, o Comando de Operações Especiais das Forças Armadas dos EUA informaram que a coronel Susannah Meyers foi destituída devido a uma “perda de confiança em sua capacidade de liderança”.

Embora a nota não apresente o motivo específico para a sua remoção do cargo, o texto diz que “ações que minem a cadeia de comando ou que subvertem a agenda do presidente Trump não serão toleradas”. A publicação continha um link para um artigo do site Military.com, uma organização noticiosa independente, que dizia que a coronel Meyers enviou um e-mail à equipe da base se distanciando da visita de Vance, realizada em 28 de março.

Vance visitou a base como parte da iniciativa do presidente Donald Trump de assumir o controle da Groenlândia — uma ilha semiautônoma pertencente à Dinamarca — por razões de segurança nacional. Na ocasião, ele afirmou que a Dinamarca “não fez um bom trabalho” pelos groenlandeses e não investiu o suficiente em segurança. No suposto e-mail, divulgado pelo site militar, Meyers teria dito que os comentários “não refletem” a posição da base.

“Não presumo entender a política atual, mas o que sei é que as preocupações do governo dos Estados Unidos discutidas pelo vice-presidente Vance na sexta-feira (28 de março) não refletem a Base Especial de Pituffik”, teria escrito a coronel, segundo o Military.com, que afirmou que o conteúdo foi confirmado como autêntico pela Força Espacial dos EUA.

A nota da Força Espacial que anunciou a remoção da coronel Meyers informou que o coronel Shawn Lee, anteriormente comandante de esquadrão na estação da Força Espacial Clear, no Alasca, assumiria seu lugar. O texto também dizia: “Espera-se que os comandantes ajam de acordo com os mais altos padrões de conduta, especialmente no que diz respeito à manutenção da imparcialidade no desempenho de suas funções”.

Oposição unida
Durante sua rápida visita, Vance também reiterou o desejo de Trump de anexar a Groenlândia por razões de segurança. As declarações, porém, foram rejeitadas na região, com o ministro das Relações Exteriores da Dinamarca, Lars Løkke Rasmussen, respondendo que “não é assim que se fala com seus aliados mais próximos”. Desde então, tanto a Groenlândia quanto a Dinamarca têm demonstrado uma frente unida, opondo-se à anexação do território.

No início deste mês, a primeira-ministra dinamarquesa, Mette Frederiksen, apareceu ao lado de seu homólogo groenlandês, Jens-Frederik Nielsen, e de seu antecessor, Mute Egede. Falando a jornalistas, Frederiksen se dirigiu diretamente a Trump, dizendo que o americano “não pode anexar outros países”. Ela acrescentou que a Dinamarca tem fortalecido sua presença militar no Ártico e ofereceu uma colaboração estreita com os EUA na defesa local.

Os Estados Unidos mantêm, há muito tempo, interesse estratégico na Groenlândia, considerada um território de grande importância geopolítica. A presença militar americana na ilha data da ocupação dinamarquesa pelos nazistas durante a Segunda Guerra Mundial. Agora, porém, os valores econômicos e estratégicos sobre o território só aumentam, conforme o aquecimento do planeta tem derretido o gelo do Ártico.

O tamanho da Groenlândia, 2,1 milhões de quilômetros quadrados, também oferece a Trump, um ex-empresário do setor da construção civil em Nova York, uma chance para se agarrar ao que ele pode ver como um dos maiores acordos imobiliários da História.

— Precisamos da Groenlândia para nossa segurança nacional e até para a segurança internacional, e estamos trabalhando com todos os envolvidos para tentar obtê-la — disse ao Congresso, no mês passado. — De uma forma ou de outra, nós vamos conseguir.

Estratégia persuasiva
O Conselho de Segurança Nacional da Casa Branca se reuniu várias vezes para transformar as palavras de Trump em ações, e recentemente emitiu instruções a vários braços do governo, de acordo com fontes internas. Os detalhes do plano ainda não estão claros, mas apesar das alusões sobre um possível uso da força, as deliberações jamais consideraram seriamente a opção militar, disse um dos funcionários do governo.

A ideia, ao invés disso, é enfatizar a persuasão ao invés da coerção, incluindo um esforço de relações públicas para tentar convencer a população da Groenlândia, de cerca de 57 mil pessoas, de que eles deveriam pedir para se juntarem aos EUA. Hoje, pesquisas indicam que a grande maioria dos groenlandeses deseja conquistar a independência da Dinamarca — mas não querem se tornar parte dos Estados Unidos.

No mês passado, Trump publicou um vídeo de 90 segundos em suas redes sociais celebrando “o sangue e a bravura” das tropas americanas, que assumiram posições na ilha durante a Segunda Guerra Mundial, para evitar uma possível invasão alemã após a conquista da Dinamarca. Os dinamarqueses esperavam que os EUA deixassem o território após a guerra,mas eles ainda mantêm uma base militar por lá.

Agora, o governo Trump estuda ainda a possibilidade de conceder incentivos financeiros aos moradores da ilha, incluindo a possibilidade de substituir os US$ 600 milhões anuais em subsídios que a Dinamarca dá ao território, correspondente a US$ 10 mil por pessoa a cada ano. A Casa Branca acredita que esses custos podem ser cobertos pela renda obtida com a extração dos recursos naturais da ilha, que incluem minerais de terras raras.

Alguns no governo argumentam que o capital e a força industrial americana podem dar acesso a riquezas ainda não exploradas. Mas analistas afirmam que pode não ser tão simples explorar as regiões mais gélidas do território. E explicar um gasto desse porte aos eleitores americanos, no momento em que Trump delegou ao homem mais rico do mundo, Elon Musk, a tarefa de cortar US$ 1 trilhão de gastos oficiais, certamente não será algo simples.

— Nós admiramos vocês — disse Frederiksen sobre os EUA durante sua visita à Groenlândia. — Vocês nos inspiraram e protegeram o mundo livre. Mas, quando quando vocês exigem tomar conta de uma parte do território do reino [da Dinamarca], e quando estamos sujeitos a pressões e ameaças, o que devemos pensar do país que admiramos há tantos anos? (Com New York Times)

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