EUA propõem resolução na ONU sobre fim da guerra na Ucrânia sem mencionar integridade territorial
Documento pede "fim rápido do conflito e paz duradoura entre a Ucrânia e a Rússia", uma formulação lacônica, muito distante de textos anteriores da Assembleia claramente favoráveis à Kiev

Com o desejo de obter um fim rápido para o conflito na Ucrânia, os Estados Unidos propuseram um projeto de resolução na Assembleia Geral da ONU que não menciona o respeito à integridade territorial do país europeu, após um novo ataque do presidente americano, Donald Trump, contra seu homólogo Volodymyr Zelensky.
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Com a chegada de Trump à Presidência, o governo dos Estados Unidos pressiona o presidente ucraniano a sentar à mesa para dialogar sobre o fim do conflito iniciado com a invasão russa há quase três anos.
Seguindo esta linha, o projeto de resolução, ao qual a AFP teve acesso, pede "um fim rápido do conflito e uma paz duradoura entre a Ucrânia e a Rússia", uma formulação lacônica, muito distante de textos anteriores da Assembleia claramente favoráveis à Ucrânia.
De acordo com várias fontes diplomáticas, os Estados Unidos pretendem submeter na segunda-feira o texto ao Conselho de Segurança das Nações Unidas, paralisado sobre a questão ucraniana há três anos devido ao veto russo.
O chefe da diplomacia americana, Marco Rubio, pediu a todos os Estados-membros da ONU que apoiem essa "resolução simples, histórica (...) para traçar um caminho para a paz".
Em uma conversa por telefone com seu par ucraniano, Andrii Sibiga, Rubio "reafirmou na sexta-feira o compromisso do presidente Trump de encerrar o conflito na Ucrânia, inclusive por meio de ações efetivas no Conselho de Segurança da ONU", disse neste sábado a porta-voz do Departamento de Estado, Tammy Bruce.
Esta resolução americana "é uma boa ideia", comentou o embaixador russo na ONU, Vasili Nebenzia, embora tenha observado que falta uma referência "às raízes" do conflito.
O "texto minimalista, que não condena a agressão russa nem menciona explicitamente a integridade territorial da Ucrânia, parece uma traição a Kiev e um golpe baixo contra a União Europeia, mas também um desprezo pelos princípios fundamentais do direito internacional", declarou à AFP Richard Gowan, do International Crisis Group.
"Não está disposto"
Alcançar um acordo sobre os minerais virou o principal ponto de divergência nas relações cada vez mais tensas entre Washington e Kiev. Trump deseja que a Ucrânia conceda às empresas americanas acesso aos seus vastos recursos naturais como compensação pelas dezenas de bilhões de dólares de ajuda concedida durante o mandato de seu antecessor, o democrata Joe Biden.
Mike Waltz, conselheiro de Segurança Nacional de Trump, sugeriu na sexta-feira que Zelensky assinaria em breve o acordo, embora seu conteúdo não tenha sido divulgado publicamente.
No entanto, uma fonte que acompanha as conversações disse que o líder ucraniano "não está disposto" a assinar um acordo que daria aos EUA acesso prioritário para explorar os recursos naturais do país.
— Da forma como o rascunho está agora, o presidente não está disposto a aceitar, ainda estamos tentando fazer mudanças e acrescentar um caráter construtivo — disse a fonte neste sábado à AFP. — Não há obrigações americanas no acordo a respeito de garantias ou investimentos, tudo sobre eles é muito vago, e querem nos tirar US$ 500 bilhões [R$ 2,8 trilhões]. Que tipo de parceria é essa? (...) E não há resposta para por que temos que dar US$ 500 bilhões de dólares.
A Ucrânia, invadida pela Rússia em fevereiro de 2022, propôs emendas ao texto, segundo a mesma fonte. A ex-república soviética quer garantias de segurança dos Estados Unidos em troca de acesso aos seus recursos naturais e minerais.
A Assembleia Geral da ONU vai se reunir na segunda-feira para lembrar o terceiro aniversário da invasão russa à Ucrânia. Também será o primeiro encontro desde o retorno de Trump à Casa Branca e sua mudança radical de política sobre o conflito.
Na sexta-feira, o presidente republicano fez um novo ataque ao presidente ucraniano.
Embora tenha considerado que Zelensky e Vladimir Putin "terão que se encontrar" para conversar e acabar com "a morte de milhões de pessoas", ele disse durante uma entrevista ao canal Fox News que a presença do ucraniano "não é importante" nas negociações com a Rússia.
— Tive conversas muito boas com [o presidente russo, Vladimir] Putin, e não tão boas com a Ucrânia. Eles não têm nenhuma carta na manga, mas atuam como durões — disse Trump, acrescentando depois em uma reunião na Casa Branca: — Não vamos permitir que isto continue.
O presidente americano, que já expressou diversas vezes a sua admiração por Putin, voltou a se recusar a culpar Moscou pela invasão de fevereiro de 2022, ao afirmar que o presidente russo "atacou, mas não deveriam ter permitido que ele atacasse".
Redobrar esforços
Para a reunião da Assembleia Geral da ONU na segunda-feira, a Ucrânia e os europeus prepararam um projeto de resolução que ressalta a necessidade de "redobrar" os esforços diplomáticos para acabar com a guerra "este ano".
A proposta cita as iniciativas de vários Estados-membros que apresentaram a "visão de um acordo de paz global e duradouro".
O texto também reitera as demandas anteriores da Assembleia Geral de uma retirada imediata e incondicional das tropas russas da Ucrânia e do fim dos ataques russos.
As votações anteriores receberam o apoio de quase 140 votos dos 193 Estados-membros.
O breve texto americano — de apenas 65 palavras — ameaça provocar a ira dos europeus, que também foram deixados de fora das negociações Rússia-EUA.
