Sáb, 06 de Dezembro

Logo Folha de Pernambuco
FRANÇA

França condena ex-cirurgião pedófilo a 20 anos de prisão por abusar de 300 pacientes

A maioria das vítimas eram menores de idade

Manifestantes seguram cartazes com os nomes das vítimas no tribunal do julgamento do cirurgião Joël Le Scouarnec em VannesManifestantes seguram cartazes com os nomes das vítimas no tribunal do julgamento do cirurgião Joël Le Scouarnec em Vannes - Foto: Damien Meyer / AFP

A Justiça francesa condenou, nesta quarta-feira (28), o ex-cirurgião Joël Le Scouarnec à pena máxima de 20 anos de prisão por estuprar e agredir sexualmente quase 300 pacientes, a maioria quando eram menores de idade.

O julgamento, que começou em fevereiro, chocou o país meses após outro caso "fora do comum": o estupro em série de Gisèle Pelicot, que resultou na condenação de 51 homens.

"Levou-se em consideração que os atos cometidos foram particularmente graves devido ao número de vítimas, à sua pouca idade e ao caráter compulsivo" do acusado, disse a presidente do tribunal de Vannes, Aude Buresi, ao ler o veredicto.

Após o anúncio do veredicto, um dos advogados do ex-cirurgião, Maxime Tessier, informou que seu cliente não vai apresentar recurso e que "nunca teve intenção" de fazê-lo.

A Promotoria havia pedido 20 anos para esse "diabo" de "jaleco branco" e outras medidas menos comuns, como o confinamento em um centro de tratamento para monitoramento adicional após o cumprimento da pena.

No entanto, o tribunal de Vannes, no oeste da França, impôs uma pena mais leve, ao destacar sua "vontade de se redimir" e sua idade. O homem de 74 anos poderá, portanto, obter liberdade condicional após cumprir dois terços da pena de 20 anos.

A justiça também impôs 15 anos de monitoramento sócio-judicial, o que inclui, em especial, se submeter a um tratamento e a proibição permanente de exercer a medicina ou desenvolver qualquer atividade que envolva menores.

O veredicto foi recebido com gritos de "Que vergonha de justiça!" na sala de transmissão reservada às vítimas.

Algumas, que se reuniram em frente ao tribunal, abraçaram-se, chorando. "Que decepção", comentou a repórteres Manon Lemoine, porta-voz de um coletivo de vítimas de Joël Le Scouarnec.

Outra vítima, Amélie Lévêque, afirmou se sentir "humilhada por este veredicto".

Ao contrário, Cécile de Oliveira, que integra a equipe de advogados das partes civis, considerou que o veredicto se "adapta de forma muito fina à situação psiquiátrica de Le Souarnec".

Nova investigação 
Durante o julgamento, Joël Le Scouarnec declarou-se culpado de todos os atos cometidos em hospitais entre 1989 e 2014, tanto estupros quanto agressões sexuais. Na época, 256 desses pacientes tinham menos de 15 anos.

No entanto, durante o julgamento, ele admitiu outros "abusos sexuais" contra sua neta e assumiu a responsabilidade pelo suicídio de duas de suas vítimas.

O ex-cirurgião cumpre 15 anos de prisão desde 2020 por estupros e agressões sexuais de duas sobrinhas, de uma jovem paciente na década de 1990 e de uma vizinha de 6 anos em Jonzac em 2017.

Após a denúncia desta última, os investigadores descobriram "cadernos" na casa do réu nos quais ele registrava suas agressões em detalhes, juntamente com milhares de imagens de pornografia infantil e dezenas de bonecas, entre outros itens.

Em 20 de março, a Promotoria anunciou a abertura de uma nova investigação sobre "vítimas não identificadas ou recém-declaradas" do ex-cirurgião.

"Periculosidade muito grande" 
Le Scouarnec nasceu em Paris, filho de pai marceneiro e mãe zeladora. O mais velho de três filhos, era um aluno excelente, mas bastante solitário, que sonhava em se tornar cirurgião, o que conquistou na década de 1980.

Casou-se e teve três filhos entre 1980 e 1987. No entanto, sob a imagem de uma família sem problemas, o relacionamento do casal tornou-se cada vez mais tenso à medida que as tendências pedófilas do médico aumentavam.

"Este homem é um enigma", disse ao tribunal Jean-Jacques Dumond, um dos psiquiatras que o examinaram e não encontraram a causa para sua pedofilia. Sua "periculosidade é muito grande", acrescentou sua colega, Isabelle Alamone.

A justiça o descobriu em 2004. Seu cartão bancário, que ele usava para acessar sites de pornografia infantil, o denunciou, e um tribunal de Vannes o condenou em 2005 a quatro meses de prisão, com suspensão da pena.

Essa condenação por posse de imagens de pornografia infantil não o impediu de continuar a carreira como cirurgião em vários hospitais até 2017, quando se aposentou.

Frustração 
Os meses de audiências foram marcados pelo horror diante dos atos do ex-médico e pela frustração das vítimas pela falta de ação das autoridades médicas e judiciais.

Um coletivo de vítimas, que denunciou o "silêncio político" durante o julgamento, anunciou uma reunião, em 11 de junho, com o ministro da Saúde, Yannick Neuder.

Este último prometeu, em declarações à rádio France Info, trabalhar para evitar que estes fatos se repitam. "Como pudemos chegar a uma situação como esta?", perguntou-se.

O processo foi ofuscado pelas acusações contra o primeiro-ministro, François Bayrou, por supostamente ter acobertado casos de violência em um colégio católico, o que ele nega.

Veja também

Newsletter