Mãe é tudo igual? Estrangeiras que moram no Recife notam diferenças
Portal FolhaPE conversou com portuguesa, chinesa e canadense para entender como elas percebem o jeito brasileiro de criar os filhos
Mãe é tudo igual? Hum... Elas dão amor, carinho, bronca, lição de moral em todo lugar do mundo, em qualquer língua. Mas a intensidade e motivação depende da cultura. O Portal FolhaPE conversou com mulheres estrangeiras que moram no Recife e perceberam diferenças na hora de criar seus filhos.
Uma das maiores comunidades internacionais em Pernambuco é a chinesa, segundo a Polícia Federal (PF). A designer de moda Viviane Ting, 54 anos, faz parte dessa estimativa. Ela saiu de Taiwan, hoje conhecida oficialmente como República da China, para o Recife aos sete anos, seguindo os pais. Viviane lembra que o pai morreu logo depois, e a mãe assumiu controle da casa. Para pagar as contas, trabalhou como vendedora no Centro da capital.
“Minha mãe teve uma vida dura: com oito anos, pensando apenas 25 quilos, arrastava um fardo de 30 quilos para a avó fazer arroz na durante a Segunda Guerra. Ela também nunca teve muito amor em casa, porque chineses são mais frios. A maioria das mães é seca, não muito afetuosas, e a minha acabou sendo assim comigo. Por isso, quis ser diferente, dar mais oportunidade, mais liberdade aos meus filhos, eu acompanhei eles mais de perto”, disse.
O lado “rebelde” de Viviane apareceu logo cedo. Ainda no colégio, ela conheceu um brasileiro que seria o pai das primeiras filhas, Amely e Polyane. Sofreu críticas por ter casado com alguém fora da comunidade chinesa e, depois, porque se divorciou dele. Casou-se novamente, com outro brasileiro, com quem teve Rafael.
Para Viviane, a típica mãe chinesa “é a mãe que doa a vida pelos filhos”, que mostra aos filhos valores, como a honra da palavra. “Isso que falta no dia a dia do brasileiro, que passa batido. As crianças crescem achando que é melhor ser sacana, falta um pouco de compaixão, de gratidão, mas não posso reclamar porque nós encontramos muita gente boa quando imigramos”, afirmou.
Lá na China, garante Viviane, a criação dos filhos é baseada naquele ditado: "escreveu, não leu, o pau comeu". “Aqui, o menino apanha, quer ir à delegacia. Eu mesma apanhei muito”, comentou, aos risos. “Eu tenho uma netinha de dez meses que se faz uma coisinha errada, eu dou umas palmadas. Ou então é no olhar. Lá, a criança não tem direito, não tem voz, e se a mãe deu uma trancada de olho, já sabe que fez algo errado. Não tem conversinha. Se fez coisa certa, não fez mais que a obrigação”, explicou.
Viviane “se mete” na criação da neta Beatriz, filha de Polyane, mas lá na China ela não teria muito espaço. A mãe chinesa é quem deve cuidar realmente de tudo, e as avós seguem com uma vida paralela. Os pais nem se intrometem na educação dos filhos, a não ser que um deles seja homem. “A cultura lá é mais machista e individualista. Aqui, as mães gostam de tirar um tempinho mais íntimo para cuidar do filho, mas sempre acreditei que não é questão de quantidade de horas, mas qualidade”, pontuou.
Mamã Vera
Outra comunidade grande em Pernambuco é a portuguesa, segundo a PF. A empresária Vera Neves, 37 anos, veio lá das terras da antiga colônia, em 2005, para abrir um resort em Porto de Galinhas, no Litoral Sul do estado. Com um brasileiro, ela teve o seu único filho, Estêvão, que nasceu no Recife e hoje tem 9 anos.
Segundo Vera, a típica mãe portuguesa é “estressada, cuidadosa e exigente”. Gosta de regras, de ter hora para tudo, dá muita importância à hora da refeição e os filhos precisam comer tudo. Ela acredita que a forma de criar os filhos é similar nos dois países. “Talvez a mãe brasileira seja um pouco mais descontraída, sem tanta regra, mais banho de mangueira. Abraça muito, beija muito, diz ‘te amo’ muito. A casa brasileira tem mais calor humano, mais movimento, mais barulho também”, apontou.
Como ter empregada doméstica é muito caro em Portugal, Vera comentou que as mulheres acabam tendo que fazer tudo sozinha ou com a ajuda dos familiares. “Aqui no Brasil, a comodidade de ter babá ou empregada, por um lado, faz com que certos momentos importantes com os filhos não sejam vividos como deveriam. Mas, por outro lado, possibilita uma relação com os filhos menos estressada e apressada”, ponderou.
Mommy Monica
A professora Monica Figueiredo, 33 anos, é casada com o brasileiro Filipe. Em Toronto, tiveram Lucas, hoje com 7 anos. Quando estava grávida de Arthur, agora com 3 anos, o casal veio ao Brasil. “Meu marido queria que os meninos pudessem brincar na rua, ir à praia, o clima lá ia limitar muito isso, aqui a cultura é mais calorenta. Então viemos e eu gostei”, disse.
Monica define a mãe canadense como trabalhadora, que passa o dia fora de casa: sai de manhã, deixa tudo pronto para o filho ir à escola e, quando volta à noite, faz o jantar enquanto as crianças estão tomando banho e se arrumando. Desde muito cedo, aprende-se a ter autonomia, vestir-se e comer sozinhos. Pasmem, mães brasileiras: as canadenses criam os filhos para o mundo, com muita independência, não existe isso de morar com os pais por muito tempo.
Monica lembra que o primeiro embate no Brasil foi conseguir um parto natural. Depois, a família do marido estranhou o fato de o primeiro filho Lucas, que tinha 1 ano e 3 meses na época, já fazer muita coisa sozinho, não chupar chupeta nem tomar mamadeira. No Canadá, aos seis meses de idade, a criança já começa a tomar leite no copinho de treinamento.
“A cultura [brasileira] em si não estimula a independência. Você encontra crianças velhas sem saber se vestir ou tomar banho sozinha, isso pode limitar. Lá no Canadá, você vê povo com 16, 17 anos morando sozinho, aqui é normal com gente com 30, 31 morando com pais, pois eles querem que os filhos fiquem mais tempo. Tem também a parte 'família' forte, o domingo na casa de vovó para jantar, lá é todo mundo por si. Se reúnem em eventos, mas aqui em aqui é em dia normal. Tanto que no Canadá foi criado Dia da Família para estimular isso”, contou.
No entanto, ela diz que o carinho e afeto das mães brasileiras pelos filhos são mais evidentes. “Não é que a mãe norte-americana não seja carinhosa, mas elas são mais distantes das pessoas, têm medo de abraçar, beijar, conversar, ficam com mais receio, e é de criação mesmo”, disse.

