O último romântico
“Talvez eu seja o último romântico, dos litorais desse Oceano Atlântico...”
A música do Lulu Santos amanheceu tamborilando em minha cabeça. Quem sabe porque eu esteja no Rio de Janeiro, diante de uma paisagem deslumbrante, aproveitando o neto, enquanto o próximo já dá sinais de que vai chorar um pouco mais cedo.
Quem não ficaria romântico?
E é por eles que questiono a conjuntura e me preocupo com o futuro.
Os românticos, como na canção, acreditam que longe é um lugar que não existe (uma recordação da preciosa obra do Richard Bach). Confiam que as pessoas são boas. Justificam os desacertos. Até legitimam a política.
A política que se manifesta no diário de cada um de nós. Instrumento de ação para influenciar a condução de governos, na organização de um partido, na atuação na opinião pública, no aliciamento de eleitores, na gestão de verba orçamentária etc.
A ação política é orientada por agentes (bons ou maus, a depender dos princípios e valores por eles professados) com influência direta sobre o destino da sociedade. Exatamente por isso, se desfaz a utopia grega do viver em comunidade onde todos são iguais.
Em uma conferência proferida em 1919 por Max Weber, pensador social e jurista alemão, sob o título A POLÍTICA COMO VOCAÇÃO, ele nos aponta caminhos e promove densa discussão sobre o papel dos agentes da vida pública e seus reflexos.
A exiguidade de espaço neste artigo nos restringe a abordagem mais intensa do tema. Tomarei como eixo de argumentação a própria provocação de Webber aos seus ouvintes: “o que é a vocação política e qual o sentido que ela pode revestir?”
Segundo o professor, o homem que se entrega à política aspira poder - seja porque o considere como um instrumento a serviço de nobres objetivos, seja porque deseje o poder pelo poder, além de saborear o sentimento de prestígio que a autoridade lhe confere.
Webber é pouco romântico quanto às razões que levam uma pessoa a buscar a política. Ressoa de seu discurso a sentença - o poder pelo poder. A meu juízo, incrivelmente atual. E ainda me incomoda a ânsia do prestígio, uma vaidade endêmica.
Esse homem ou essa mulher, alega o pensador, ou vive para a política ou vive da política.
A primeira ideia, um sonho de difícil concretização que se dissipa quando constatamos que a maioria vive da política. Que usa a política como trampolim para garantir o futuro financeiro e, hoje, para proteger-se da justiça.
Aos seus olhos, os políticos - aqui ele se referiu aos parlamentares - quando ascendem os múltiplos postos de poder, não passam de simples detentores de prebendas e fazem parte da folha de pagamento do chefe de partido ou de governo.
A declaração “qual político não quer dinheiro?”, proferida recentemente pelo chefe do poder executivo, independente de contexto, traz a verdade weberiana para os nossos dias.
No Brasil, essa lógica agora se inverteu, em face de o grupo alcunhado de Centrão, constituído de parlamentares camaleônicos, terem assumido total controle da posse e divisão do butim financeiro gerado pela política.
Na conferência, Max Webber aprofunda a discussão ao introduzir a ética da convicção e a ética da responsabilidade na política. Mas seria abusar da sua inteligência emocional, caro leitor, defender que os nossos políticos sabem o significado dessas éticas.
Como último romântico, espero que os candidatos aos próximos pleitos vivam tão somente para a política e possam ser capazes de dizer “a despeito de tudo!, estou pronto para servir”.
Paz e bem!
*General de Divisão da Reserva
- Os artigos publicados nesta seção não refletem necessariamente a opinião do jornal. Os textos para este espaço devem ser enviados para o e-mail [email protected] e passam por uma curadoria para possível publicação.
